Hortênsias

Você nunca amou tantos as flores... Mas será que gostaria das ensanguentadas?

Faz um ano já que eu venho tossindo-as.

O primeiro ataque dessas tosses foi quando você disse que só tinhamos quimica. Há poucos eu tinha descoberto meus sentimentos por você.

Então o primeiro estágio: começaram por pétalas, pequenas pétalas de pequenas flores, apenas de vez em quando.

O segundo ataque, foi quando eu fui me entregando a você pouco a pouco. Eu fiquei silenciosamente devastada. Pétalas maiores começaram a sair, com mais frequência.

Então eu procurei um médico, e ele disse que eu ia morrer. Não com essas palavras, mas foi isso que significou. Me diagnosticou com a doença do amor. Haviam três formas de acabar com ela: ser amada de volta; no entanto você me disse que o amor não era reciproco.

Procedimento cirúrgico: mas eu tive medo.

Ou, morrer por amor; quando eu entrasse no estágio, e começasse a tossir buquês inteiros, a hora de ir chegaria, sufocando-me. O que, admita, não é a forma mais bela de se amar.

Eu cogitei a ideia de fazer a cirurgia, porém eu desisti quando o médico me disse que se eu fizesse, o sentimento acabaria. Eu não teria mais lembrança nenhuma de você ou de como eu te amei. Do que adiantaria tudo o que foi feito?

Tudo para não esquecer que um dia eu te amei.

Eu cheguei no segundo estágio da doença quando já me sentia totalmente sufocada com meus sentimentos, as cordas vocais coçando para que eu pusesse as palavras pra fora, então foi o que eu fiz. Eu te mande umai mensagem, pois não tinha coragem suficiente para dizer pessoalmente.

Eu chorei, você chorou. Disse que mesmo que quisesse tudo tinha acontecido rápido demais e que já tínhamos chegado num ponto em que tudo já tinha sido feito. Eu senti uma tristeza que valia por nós dois.

Acho que foi por isso que no inicio demos certo, você dizia que eu era inocente, sensível, amorosa. Que me importava com tudo e todos e que gostava de sentir a felicidade nas outras pessoas.

Mas, é isso. Eu me confessei, e você me disse tudo o que tinha para ser dito.

Se antes eu tossia apenas algumas pétalas, agora parece que não sou mais capaz de respirar direito sem que meus pulmões desembestem de cultivar flores inteiras de vários tipos.

As pontadas violentas nos meus pulmões eram comuns, assim como as tosses. Uma ardência que ia sendo puxada até os ombros e a base da minha coluna. A planta vinha arranhando minha garganta, então eu logo em seguida me deparava com uma flor ensanguentada.

Apesar de estarem manchadas com a culpa que carrego em minha vida, as flores são lindas.

Tão formosas e cheias de vida, que nem acredito que saíram de alguém tão destruida como eu. Não acha maravilhoso que com toda essa devastação aqui dentro, elas tenham saído de mim?

Depois de tantas flores tossidas, cheguei a perceber que vem sempre uma espécie diferente de flor de acordo com o que estou pensando.

Quando estou pensando na sua personalidade, desabrocham hortênsias, aquelas bem azuis iguais a cor dos seus olhos.

Quando estou pensando nos nossos momentos de felicidade desabrocham primulas.

Quando penso em meu amor por você; saem cravos brancos.

Quando me lembro de quando eu entrava no elevador e apertava o 12 andar; as tulipas amarelas vêm... Tulipas amarelas sempre tiveram significado.

Porém, toda vez que tusso essas flores, uma outra vem como acompanhamento. Um cravo amarelo desabrocha.

Algumas hortênsias, um cravo amarelo.

Algumas primulas, um cravo amarelo.

Outras tulipas, um cravo amarelo.

Sabe por que esse cravo amarelo sempre está ai? Pra me lembrar do porquê de todas as flores estarem ai. O cravo amarelo me lembra que se eu estou assim agora, é porque te amei, e vi no que deu.

E por mais que as flores sejam lindas, eu as odeio. Odeio porque são o simbolo de nós dois e de nossos abraços... Odeio porque me machucam demais, mesmo que o tempo passe, eu ainda irei me lembrar de todas as datas. Odeio porque sinto como se eu tivesse sido embalada por uma camada de espinhos pontiagudos que me sufocam vagarosamente. Eu as odeio porque além de serem minha maior dor corporal, também representam que eu te amei e que nunca me esquecerei de você.

Até minha casa virou um pequeno inferno. Os cômodos estavam lotados de flores, porque além de belíssimas, eram frutos do meu amor, então eu não teria coragem de jogar fora. Elas até davam um ar colorido e alegre a casa, mas na minha cabeça era exatamente o contrário; eu vivia lado a lado com a minha lembrança.. A minha maior lembrança, cheia de momentos que nunca foram apagados. Eu sabia que você estava mal. Eu sempre soube. Mas eu não estava magoada com você, muito menos com raiva. Eu nem sequer poderia culpar nenhum de nós dois. Eu te amei com toda minha alma. E mesmo assim minhas noites eram compostas por lembranças suas.

Ao que parece, o jardim que existe dentro de mim vai desabrochar todo de uma vez, então não haverá mais um jardim dentro de mim, e sim eu dentro de um jardim. E esse amor que senti por você vai se transformar num enorme buquê, e desabrochará por todos os lados, se eternizando em cada flor. E enfim eu irei florescer por inteiro. E ai será que você vai gostar de flores?

Emanoela Andressa
Enviado por Emanoela Andressa em 27/07/2017
Reeditado em 29/07/2017
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