Verdade: sintômas: segurança

A felicidade, o bem-estar, os prazeres, as virtudes não são argumentos para se tornar irrefutável a crença na "verdade" de uma doutrina, na verdade absoluta; não é porque torna feliz que é verdadeiro. O mesmo vale para o oposto, a infelcidade: sofrer, carregar cruzes, o mal-estar, também não serve de contra-argumentos para termos certeza numa verdade que não a da ordem de nossos afetos e paixões. Ou seja, na vida.

Nos deixamos levar pelo bom, pelo belo, pelo entusiasmo dos sentimentos, a ponto de nos habituarmos a tudo que seja mole, suave, brando, manso, que nos cause prazer e segurança - emprestamos à verdade nosso sentido de insegurança e a colocamos de cabeça pra baixo quando nela confiamos.

Por que não desconfiança?

Quem disse que a verdade, o fato, o imutável, o que é, a certeza e não a inverdade, a ilusão, a aparência, a dúvida, o erro é mais fundamental à vida?

Quem nos coloca a questão aqui? Esse "quem" talvez seja um pressupor demais...

A verdade é um fato eterno, vivido a cada instante, ou esta se nos apresentou caindo do céu milagrosamente?

Pode a vida avaliar-se fora do seu contexto vivido? ;podemos, na condição de fetos na barriga da mãe, saber se existe uma verdade, um fato eterno além dos sentidos que comprovamos, e que esta fundamente a vida? como se a ordenasse num caminho, num plano - divino?

Mas, nada há de eterno a não ser nada ser eterno. A vida, como a vida das estrelas, está o tempo todo mudando para novas formas. Talvez, por isso nos iludimos com uma alma, um "eu", um sujeito, um fato eterno, uma verdade que descobriremos, que não mude como a vida, que não flua como os dias. Que nos assegure uma segurança na passagem. Porém, não estamos separados da vida, nós fluímos juntos dela, sempre outrando sem perceber, seduzidos pela crença na linguagem e na memória, que nos escuresse a fluidez da alma... A "verdade" é escura...

Tudo flui, nada é.

Tudo é, naquilo que flui...