Imortais

"Porque sentir é como o céu,

Vê-se mas não há nele o que se ver"

- Pessoa.

Eterno é o céu sobre nossas cabeças: trazendo-nos os dias e as noites, com seu azul que, por muitas vezes, é intocável e indizível ao homem, pois ele sabe, que abaixo dele nada fica, nada persiste ao tempo, nada fica e nada retorna. Eterno é o céu, não o homem.

Às tardes, aquelas onde as nuvens estão rosadas, bonitas, brilhantes, me pego imaginando o que de fato seriam estas nuvens entre o céu e os homens. Talvez as nuvens sejam nada mais que um vã momento de uma pequena existência, tão perecível quanto o homem, elas não ficam por muito, elas, às vezes, nem são algo de fato, pois nuvens ganham o formato que os olhos humanos lhes dão, estão a todo momento mudando, e logo partem. Enquanto houver céu haverá nuvens, enquanto haver terra haverá homens. Houve um tempo onde eu desejava voar: Por este céu, por estas nuvens. Voar livremente até o infinito. Contar minha história aos céus — eles nunca conheceram nada abaixo de si, contudo, presenciaram de todas as coisas da vida humana, e de certo modo, foi eu quem ainda pouco vivi.

Há em mim uma eterna criança que nunca sentiu de todas as coisas. Há em mim um inocente que não cresce, imune ao tempo e às dores dos homens. E ainda que eu olhe este céu e, inevitavelmente, me sinta pequeno a ele, ainda que, por certas vezes, ele pareça possuir uma beleza da qual meus olhos amargurados nunca viram igual, eu sei, o inocente em mim é maior que este céu.

Ele viajava além, sem tirar os pés do chão. Ele era incorruptível a todos os enganos que nos enche os olhos demais. Em tardes como estas, estas das quais me referi, o céu e as nuvens eram seu lar, assim como qualquer outro lugar onde coubesse seu corpo pequeno e frágil. O menino e as nuvens. O menino e o céu. Mas não existiam nuvens, não existia céu. Eram todos personagens de uma indomável imaginação.

Ao olhar este azul acima de minha cabeça, recai sobre mim as memórias de toda uma vida, tudo que eu podia ter sido e não fui, as lágrimas incontidas e, por muitas vezes, evidentes em meu rosto. Lembro-me também dos bons momentos, estes sem dúvidas existiram. O homem que hoje sou guarda consigo um desconforto, sempre perdido, confuso, solitário, olhar este céu faz com que eu confronte a pertinente certeza de que nesta vida somente ele fica: Eu envelheço, ele se mantém. Eu sofro, ele está sempre azul. Eu, como todos os homens, vou matando-me aos poucos até um dia partir, ele, afasta suas nuvens nubladas permanecendo intocável.

Porém, assim como o céu que está sempre azul em dias chuvosos, o inocente que há em mim persiste a tudo que me tornei, ainda que eu não o sinta, não o veja, não lhe permita ser indomável outra vez, eu sei, ele vive em mim. Para o homem que sou, eterno é o céu sobre nossas cabeças. Mas a criança que fui, é, e sempre será, imortal.

(obrigado por ler este texto)

Um Rapaz Meio Estranho
Enviado por Um Rapaz Meio Estranho em 26/06/2017
Reeditado em 30/11/2017
Código do texto: T6038226
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