EIS-ME AQUI, SENHOR!
A chuva lá fora lava e limpa o agora. Tudo fica mais claro, mais plácido, mais respirável. A chuva faz a transição; leva as folhas caídas, a semente e a flor. Em breve será outra estação. É o tempo marcado em clima, em sensação. O tempo passando devagar e em silêncio. O tempo curando feridas, estancando a dor. Em silêncio. O tempo trazendo o encontro e preparando a despedida. Em silêncio repetindo devagar: sim, não, talvez. E nesse trote suave e silencioso, o tempo vai desenhando o fim e, quem sabe, o recomeço. Carrego o silêncio do tempo em mim como a mãe gesta o filho. Guardo-o serenamente, pois espero o devir, mas o devir que começa aqui. E, com todo o meu respeito, silencio no meu peito todas as palavras mal ditas. Quero-me simulacro de Deus, quero imitá-lo. Quero viver o meu tempo de calar e contemplar o que virá, mas que já está em cada novo dia, em cada folha que rola pelo asfalto, nessa chuva que tudo refresca e renova. Não quero tratar este dia como outro qualquer já vivido. Não. O que me vem agora é novo. Todo novo. É o meu presente! Quero contemplar a beleza disso que tomo nas mãos. E sou tão grata por tudo! Tudo o que virou passado, mas foi veículo e me trouxe para onde estou. E eu que pensei não sobreviver para ver, estou aqui! Por isso, o silêncio. Por isso, silencio. Quero sorver o meu agora como um licor muy delicado. Quero degustá-lo devagar e silenciosamente. É a minha vida que vejo passar diante de meus olhos. É a vida com seus mistérios que vejo se descortinar a minha frente. Ninguém me compreenderá porque só meu é esse estar. Mesmo que outros tenham passado por isso, não sentiram como eu sinto. Estou no outono da minha vida... O tempo em que tudo acaba... Para depois recomeçar. Eis-me aqui, Senhor! Faças de mim o que quiseres, pois me sustentastes até aqui. Eis-me aqui. Haja o que houver, eis-me aqui.
Adelaide de Paula Santos em 27/03/2017, às 22:38.
P.S.: O meu Deus não dorme, nem cochila...