DE REPENTE, O PASSADO VIRA PRESENTE E O PRESENTE PASSADO...NÃO MAIS QUE DE REPENTE.

Ontem foi festa e, como vivi intensamente o ontem, não escrevi nada no ontem que era hoje só que ontem. Ou seja, se você não planeja, torna-se refém dos acontecimentos. Eu poderia ter escrito logo pela manhã se tivesse pensado que, talvez, a noite se estendesse e ultrapassasse o período regulamentar de publicação. Mas, eu estava muito conectada no momento para calcular um futuro distante e curiosamente tão próximo. Mas, a escrita tem esse dom de segurar o tempo, ser anacrônica e esticar-se sobre o passado e torná-lo presente. E, não mais que de repente o presente vira passado e o passado, presente. E, justamente hoje, já vivendo intensamente o meu presente, me vi voltar ao passado. Reencontrei uma amiga de longa data e, em pouco tempo, estávamos a prosear como outrora. Uma conversa agradável, fluindo fácil, sem silêncios ou os atropelos do tempo que ficou no meio, do tempo em que nos tornamos duas desconhecidas, vivendo vidas separadas. Éramos boas amigas de novo. Tecendo comentários inteligentes, curiosos e divertidos sobre os eventos da vida. Somos agora duas jovens senhoras bem conservadas. E o tempo entrou na pauta. Do nada, ela começa a resenhar um livro que estava lendo, um livro que falava sobre a necessidade de viver o hoje e dedicar-se ao seu Eu interior voltado para o presente. Abandonar a ansiedade pelo futuro e o saudosismo do passado. Era praticamente uma metáfora do que estávamos fazendo. E, como na vida não há coincidência, tomei o fato de um texto se enviesar no meu bate-papo como mais uma pecinha a se encaixar nesse processo contínuo de autoconhecimento que vivo. Realmente, há coisas que devem ficar no passado, mas também há passado que vira presente e presente que se torna passado. Dou-me o direito de rever, reler, reinterpretar e renovar as verdades que creditei como absolutas. Não são. A verdade é um dado transitório atravessado por uma seta que se chama contexto, como naqueles desenhos de corações flechados que fazíamos quando éramos crianças. Dói. Dói muito crescer, admitir que as coisas não foram como deveriam ser na época. E dói hoje também, pois sabemos que certamente foi melhor que não tenham sido, pois “o como deveriam ser” do passado não seria como seria o de hoje. Passou. Vamos focar no presente e seguir adiante sem cair na cilada da projeção de futuro. Uma ressalva: tudo o que estou escrevendo foi falado por nós. É bom revisitar uma alma e tornar a sentir por ela admiração. Recordei-me, então, nossas conversas intermináveis, nosso senso de humor inteligente, nossa parceria tão perfeita sem ser combinada. Mas, essa fórmula do livro, a de viver o presente e deixar de lado o passado, sem ansiar pelo futuro, talvez ainda seja um objetivo difícil. Tanto o passado como o futuro são para mim lugares de aconchego e sonho, respectivamente. Tudo bem, eu sei que é fuga. Eu sou Romantismo, 2ª geração, eu sei. Mas, gosto de me aconchegar no passado e ficar mordiscando uma coisinha aqui e ali, um pedacinho de cada delícia ou uma dorzinha gostosa de sentir como a dor da unha encravada que a manicure cutuca e a gente não quer que pare. Ou ficar sonhando de olhos abertos, imaginando um futuro todo da cor e forma desejada, aquele lugar onde tudo é possível, onde eu seria exatamente o que gostaria de ter sido. Tudo bem que o sonho pode virar frustração, mas naqueles instantes em que estivemos lá, tocamos o real nem que seja pela imaginação. Gosto disso. Ao redor daquela mesa, entranhadas no presente, como não dizer que também estávamos no passado? Era um déjà vu planejado. Nós sabíamos, pelo menos eu sabia, que estávamos revivendo o vivido, com data e hora no calendário; inclusive, se pudéssemos precisá-lo como o Google faz, encontraríamos a cena gravada lá no Youtube da existência. A vida precisa de pausas. Mesmo que sejam pausas imaginadas, pois não há como deter o tempo, pois lá no céu as nuvens seguem o movimento de translação e rotação. O sol se põe e nasce para depois morrer e renascer, como uma equação de resultado infinito. Aquela dizima periódica que se repete, se repete, se repete, sucessivamente.

Adelaide de Paula Santos em 11/03/2017, às 23:44. Sábado.

P.S.: Aquele que deveria nascer ontem, mas só foi parido hoje. Ouvindo o CD Desfado de Ana Moura, aliás, não tem coisa que mais me tire do presente que música. Esse CD mesmo me levou para os castelos de Sintra/Portugal. Passou um mundo de emoções dentro do meu coração...

Adelaide Paula
Enviado por Adelaide Paula em 11/03/2017
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