TIRAR A VIDA DE ALGUÉM É IMPAGÁVEL
A vida é um bem que não deveria ser interrompido.
A soltura do goleiro Bruno, autor intelectual da morte de sua amante Eliza Samudio, provocou-me para ponderar sobre a vida como direito cultural.
A vida é o bem maior e mais precioso que possuímos. Deveria ser considerado o bem social de maior relevância em torno do qual todas as ações deveriam girar. Na natureza é a vida que mobiliza todas as ações, mesmo daquelas que não tem vida. Acredito que a vida é o Princípio Maior – o que se chama de Deus – que orienta todas as manifestações universais. Nesse sentido, creio que a vida é o centro do universo como evento que nunca se extermina e está em todas as partes, de formas tão variadas que a nossa percepção humana (ainda) não é capaz de detectar suas variações. Ela se autodetermina e se autoconfigura. Transforma-se, em vez de se adaptar, para tudo envolver e produzir formas diferenciadas de se autoexpressar. A vida nunca morre.
A vida, como direito, é inalienável, incondicional (ela condiciona tudo) e indestrutível como princípio que se liga, mobiliza e se realiza entre matérias. Ninguém pode destruir a vida como tal, nem mesmo tirá-la de si mesmo. A morte e a interrupção da vida em curso significa o rompimento do movimento do que se convenciona de vida, dentro de uma estrutura, que no nosso caso é o corpo. A vida de todos os humanos é a mesma em termos de princípio.
A cultura criou um conceito e significado acerca do que o homem pensa ser vida. Esse pensamento se confunde com a consciência e a capacidade mental de perceber movimentos que necessitam de definições sobre nossa capacidade de racionalizar eventos. Por sua vez, esses signos vão criar o que chamamos de verdade sobre tudo que percebemos como realidade. Valoriza-se sobremaneira a vida humana em relação a si mesma, sem a considerar com as demais formas vitais. É de tal forma significada que fora do paradigma da evolução não são contempladas reflexões sobre a interligação das vidas. A vida humana pode estar ligada com as outras expressões vitais, como, por exemplo, a vida animal, vegetal e outras.
Mas, essa vida da forma como a considero em minhas ponderações acima, tem conotação biológica e sistêmica. É claro que diante da perspectiva cultural minhas reflexões constituem-se devaneios. Sem problemas com quem pensa assim sobre o que escrevi.
É ligado à expressão da vida definida pela cultura que pretendo expor meu pensamento relacionando-o com o fato anunciado inicialmente.
Quem tem direito de tirar a vida de alguém? A resposta sensata é ninguém. Nem mesmo o próprio sujeito tem direito sobre a própria vida e seus fenômenos naturais ou biológicos. Porém, o sujeito tem o poder de não somente se suicidar como ‘tirar’ a vida de outros, como também planejar e demandar a morte para outros, como parece ser o caso sobre o qual pretendo expor meu pensar.
Toda sociedade somente se mantem por leis e por normas que se constituem, em síntese, a ética e a moral. As leis, na medida em que as formas de pensar (de alguns) evoluem, tornam-se contraditórias em relação aos modos subjetivos singulares. Significa que o entendimento sobre soltar alguém que matou outro se transforma em defesa dialética paradoxal. Há quem encontra argumento a favor e outros que pensam não ser justo em relação à vítima e seus familiares que carregam o sentimento da perda.
Percebo que na medida em que a sociedade humana evolui em direção à compreensão de suas potencialidades de fazer o bem, igualmente, avança na capacidade de que somos capazes dos atos mais bárbaros e antissociais. E penso que isso é característico de todos os sujeitos humanos. Basta que a motivação seja adequada. Portanto, eu, como os demais, sou capaz de me situar entre a psicopatia e o comportamento direcionado ao modelo social ideal. A educação, para mim, faz a diferença entre um e outro comportamento. Este pensamento, claro, encontra a mesma perspectiva dialética paradoxal já citada, ou seja, dos argumentos contrários ou a favor, podem surgir antíteses e novas sínteses.
O que fazer com quem mata deliberadamente outra pessoa? Socialmente em diferentes contextos encontramos muitas e diferentes posições argumentativas, tanto em relação às percepções pessoais como as político-jurídicas. Sem considerar as posições pessoais indizíveis. Para mim, considerando que a vida não tem preço e que uma sociedade só se realiza plenamente através de dois processos consequentes e exemplares, que são a educação e o exemplo, o caso, e os similares, deveriam ser enquadrados e resolvidos com base em duas perspectivas:
a) EDUCAÇÃO – ela deveria ser planejada e orientada de tal forma para que o sujeito adquirisse plena consciência e comportamento em relação ao que pode e deve fazer. Deveria aprender que cada ato inadequado tem uma consequência social punitiva e que estas, as punições, fossem de fato coerentes com uma sociedade que se deseja ética e moral;
b) EXEMPLO – quando a educação não alcança seus objetivos, ou mesmo que os alcance, os sujeitos que não se enquadrarem nos comportamentos sociais, deveriam ser punidos exemplarmente. O que seria exemplar para este caso em análise? Como ninguém tem o direito de tirar a vida de ninguém, mesmo de quem tirou a vida de outro(s), o sujeito deveria perder o direito de viver a sua de forma social. De que forma? Prisão perpétua. Creio que com isso os crimes de atentado contra a vida não desapareciam, porém, como exemplo, faria muitos pensar antes de interromper a vida alheia.
Enquanto se confundirem socialmente as noções entre poder e dever, continuaremos lamentando os paradoxos comportamentais sociais.