Fugindo do tic tac
O tempo costuma ser um vilão estranho: ao mesmo que está alheio a nós está marcado em nós. Em nossa pele. Em nossas escolhas
Em Peter Pan, o capitão Gancho foge do crocodilo que tem um tic tac dentro de si, como se ele tivesse fugindo do tempo. O tempo é um inimigo para ele.
Em Alice, o chapeleiro diz a ela que se ela conhecesse o tempo o trataria com mais respeito e ela se desculpa dizendo que não sabe o que dizer. O chapeleiro aposta que ela nunca chegou a conversar com o tempo. Ela concorda e diz que precisa bater o tempo quando estuda música. Daí ele entende porque Alice trata o tempo daquela forma, afinal o tempo não suporta ser batido e se ela e o tempo estivessem em paz, ela conseguiria fazer o que quisesse com o relógio.
O que nós fazemos com o nosso tempo? O que é o tempo? Estaria eu batendo o tempo quando espero uma resposta de uma pessoa? Estaria eu batendo o tempo quando espero que alguém me ame como eu acho que devo ser amada? Estaria eu batendo o tempo quando projeto minha vida no próprio tempo que não me pertence, mas que caminha comigo a cada abrir e fechar de olhos? Quem sou eu no tempo? O tempo está contando mesmo minha vida desde que chorei a primeira vez e se acabará no meu último suspiro? Por que brigamos tanto com alguém que não alcançamos?
O tempo passado parece o melhor consolo tantas vezes quando nos arrependemos do que fizemos, do que dissemos, quando lembramos do aconchego daquele colo em que você cabia e hoje não cabe mais. Qual a solução se é impossível bater no tempo que passou, senão sabemos o tempo que vem, se estamos sempre fugindo ou nos consolando num tempo que não existe mais e no tempo que ainda não chegou.
O que é o tempo presente? É não esperar? Não rememorar? Como eu faço as pazes com meu crocodilo e aceito quem eu sou agora? Como eu aprendo a respeitar o tempo e controlar meu relógio? Na meditação aprendemos que devemos deixar as coisas fluírem, se vier deixa vir, se for embora deixa ir. Talvez essa seja a resposta. Mas o que eu faço com essa dor que embriaga meus olhos quando você não vem, com esse silêncio que me engole e o tempo parece não passar?
fevereiro 2017