Ensimesmem

- Voltou cedo hoje. - Observou a mãe após abrir o portão de casa e perceber que o filho voltara da escola. Era apenas 11:55, cedo para seu filho que saia da escola ás 11:45 e tinha que voltar a pé.

“Andar quase 1 km em dez minutos devia cansar qualquer um”, pensou a mãe quando percebeu um filete de suor que escorria pela testa de seu filho. Outrossim, percebera a “pizza” que havia tomado forma em seu uniforme escolar cinza.

- Não voltou com seus amigos? - Perguntou a mãe depois de perceber que sua observação anterior havia sido completamente ignorada e escasseada de informações.

- Não. - Respondeu o filho, sucintamente.

- Porque? Brigou com eles? - Insistia a mãe, enquanto o filho entrava no quarto e trocava de roupa.

Em seu âmago, uma sensação de preocupação revirava-se e enleava com o sentimento de angústia, que era adicionado pela sensação de impotência em relação ao comportamento social do filho. Mais um silêncio desencadearia um autoconhecimento; talvez mais dois; ou três. Mas o filho respondeu:

- Não mãe, nada a ver! Só quis voltar sozinho.

A resposta desencadeara algo diferente do esperado e benéfico. Não a resposta em si, mas tom utilizado pelo filho foi o fator decisivo. Um tom de desprezo e impaciência pela impertinência da mãe. A resposta foi simples, curta e bastante reveladora, contudo mascarada pelo tom. O tom reverberou e ofuscou aquelas palavras que, se percebidas, estudadas e investigadas, talvez desencadeasse algo incomodo, mas benigno. Talvez conectasse mais fortemente a mãe e o filho. Talvez acabasse com a sensação de “angustiação” da mãe.

Contudo nada disso ocorreria, já que a mãe, indignada e impaciente com a impaciência do filho, desistira de sua “inconveniência”. Era a forma que parecia mais fácil à mãe para resolver aquele problema: ignorando-o. Dessa forma ela não estaria sendo impertinente mais para o filho e aquietaria a “angustiação”. Benéfico (momentaneamente) para ambos os lados.

Destarte, a mãe saiu do quarto do filho. Impulsiva e displicente, ser humana, a mãe ignorou todas as consequências de ignorar. E o filho ignorou todas as consequências (que lhe afetaria mais diretamente) de fechar-se. Afinal, a mãe provia para seu filho com perfeição. Cuidava dele como qualquer outra mãe sã do mundo faria. E isso é, no mínimo, louvável.

Depois da retirada da mãe, o filho fechou-se no quarto, trancando-se em seu próprio mundo.