Amor altruísta: existe?

Ando refletindo muito sobre a existência ou não do altruísmo. Lendo alguns livros de herói passei a pensar isso. Depois trouxe para o mundo real e passei a pensar sobre amor de mãe/pai/criador/a. As pessoas que exercem papeis de mãe/pai. Sobre esse amor tão idealizado em nossa sociedade e a suposta existência de um altruísmo nesse tipo de amor como se fosse inteiramente livre e sem necessidade de retorno. Mas seria isso sequer possível na dinâmica humana?

Ao ler o último livro de Khaled Hosseini “O silêncio das montanhas” esse tema veio com mais força em minhas reflexões que já vinha fazendo. Quero apenas ressaltar que não sou mãe/pai. Nunca criei nem um gatinho então a perspectiva desse texto é inteiramente construída no papel de filha/filho. Não é um julgamento, mas uma reflexão enquanto ser que recebe esse amor e ultimamente anda incomodada com as repercussões do mesmo. Fora que todos somos filhos mesmo os que já são pais então talvez caiba uma leitura pelo olhar de filho pensando na sua relação com seus pais. Para uma breve contextualizada, o livro conta a história de dois irmãos que foram separados na infância. Essa é a história principal do livro. Tem como pano de fundo a guerra no Afeganistão, na década de 1960 (salvo engano).

A grande reflexão que fiz desse livro foi a relação da mãe de Paris com ela. Era uma mãe adotiva que consumia muito de sua atenção e cobrava muito dela. Em um trecho no final do livro Paris fala “Era o tipo de amor que mais cedo ou mais tarde nos obriga a uma escolha: liberte-se à força ou ficar e resistir ao seu rigor, mesmo que nos reduza a algo menor do que nos mesmos”.

Quanto do amor que recebemos não volta como cobrança? Qual o limite entre amor e gratidão? É mandatório que cuidemos dos nossos pais na velhice pois cuidaram de nós na infância. Ok. Mas e o resto? E a cobrança pela sua presença em tudo ou por algum retorno financeiro quando você alcançar estágios de sua carreira que eles/elas nunca alcançaram. Além das chantagens emocionais em que a cada cobrança você sente que precisa provar seu amor. Cada momento em que os pais percebem que não precisamos mais deles seja financeiramente ou em termos de utilidade em casa pois já aprendemos a voar e agora podemos cuidar de nossas vidas por nós mesmos. Queremos nossa casa, nosso espaço. É difícil de entender que o amor não acaba com a utilidade? Até porque se acabar não era amor era utilidade! Sempre pensei, provavelmente de forma muito idealizada, que o amor fosse sinônimo de liberdade, porque o amor respeita quem somos, nossa individualidade. Ele deixa a gente dizer não porque dizer sim arranca um pedaço de nós. Ele dá espaço. Ele deixa você fazer escolhas por você, pelas suas necessidades e nunca pelo outro. Quando escolhemos pelo outro estamos mesmo amando essa pessoa? Ou aprisionando-a a nossas necessidades? Isso também não é egoísmo? Mães/pais fazem isso com os filhos. Até relacionamentos amorosos carregam esse fardo. Vejo pessoas abrindo mão de desejos pessoais para agradar o outro, para que assim a pessoa ache que será amado de volta. Mas o que você está dando ao abrir mão de ser quem você é, é amor ou pena? Ou degradação de si mesmo em troca de algumas migalhas pelo medo mais humano da solidão?

O que é amor? Para além do romântico. Além do Romeu e Julieta e todo movimento que queria humanizar mais as pessoas e acabou tornando-as dependentes de pás que enchem os buracos de nossa existência, buracos esses que não cabe a ninguém preencher porque são nossos. Deveríamos nos orgulhar das nossas falhas porque elas fazem quem somos, e deveríamos procurar a resposta para elas por nós mesmos. É bonito criar uma vida? Acredito que sim, mas a que preço? Porque escolhemos ter filhos? Aliás, realmente escolhemos ou estamos apenas imbuídos de um desejo estrutural que foi construído como o maior dos valores? Escolhemos ter filhos porque temos medo de envelhecer e ninguém cuidar de nós? Ou porque queremos ser eternos e através do nosso DNA, do nosso nome é a nossa maneira de sermos eternos? Ou temos filhos para alimentar nosso ego projetando nos outros aquilo que queríamos ser e não conseguimos? Isso é amor altruísta? Afinal, existe algum amor que o seja?

novembro de 2016

Menina Beijaflor
Enviado por Menina Beijaflor em 27/11/2016
Reeditado em 27/11/2016
Código do texto: T5836426
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