PRECISO DIZER

Preciso dizer que sabe bem dos alunos quem com eles esteve, nas salas de aula, durante toda a vida profissional.

Preciso dizer da dificuldade que tinham as bibliotecas de organizarem acervos, de tê-los.

Preciso dizer que ensinei em escolas que dispunham de ricas bibliotecas, mas, que nunca eram frequentadas por alunos.

Preciso dizer que, ao iniciar minha profissão na escola pública, se não fosse pelos programas de livros para todos os alunos, os pobres não poderiam comprar cadernos, quanto mais livros!

Preciso dizer que eu tive uma situação privilegiada estudando no Atheneu, mas nunca me senti bem em ver os alunos excluídos ou que não tinham livros. Lembrem-se de que alunos foram obrigados a voltar da porta da escola porque não tinham fardamento ou calçado. Isto jamais aconteceu comigo, mas não achava bonito acontecendo com outros.

Preciso dizer que, somente na minha trajetória de professora, acompanhei as humilhações pelas quais passavam meus alunos e que eu jamais havia imaginado sequer existirem...

Preciso dizer que, começando ainda muito jovem, aos 23 anos de idade, contratada pelo Estado, pude, daí em diante, ver a realidade de tanta gente que me era desconhecida. Entretanto, jamais me coloquei acima dos alunos, como vi colegas criticando o visual dos alunos pobres e dizendo-se felizes quando estavam com os meninos limpos, bonitos e que tinham todo o material escolar, como nas escolas particulares. Mas, eu penso como o Imperador Dom Pedro, quando esteve em escolas sergipanas e, questionando o professor, quis saber porque os alunos tinham um desempenho precário, respondendo-lhe o questionado que não tinha livros para trabalhar. Foi aí que o Imperador lhe devolveu esta maravilha: ENSINE-LHE O SENHOR, O MELHOR LIVRO É O PROFESSOR.

Preciso dizer que estamos na era digital e que, em detrimento de tanto esforço em favor do livro de papel, a sociedade é movida pela máquina e os jovens estão preferindo o mundo virtual, mas, como sempre, tiraram-lhes o acesso ao mundo de papel, agora lutam para que não acessem ao mundo das tecnologias em voga.

Preciso dizer que deprecio as atitudes excludentes e pejorativas dirigidas ao aluno da rede pública, pois eles se encontram assim ou assado em virtude da luta insana do poder em fazer do ensino público uma tragédia como a de Mariana.