Aborto: duas vidas em um só golpe.

Jeito de moleque

Sorriso alargado

Chamou-me pra sair

Aceitei de bom grado

A química rolou

Um namoro iniciou

Conheci sua família

Até em casamento ele falou

Um mês de namoro

Talvez seja a hora

Ele pediu

Muito insistiu

Com hormônios à flor da pele

Não relutei

A ele me entreguei

Coloque a camisinha, amor

Bobeira, sem ela é mais gostoso

A primeira vez nunca "dá nada"

Acreditei na sorte de não ser

Comigo isso ia acontecer

Duas semanas e nada

Um mês e ela não veio

Às escondidas, o resultado

Já estava lá há um mês e meio

Não há pra onde correr

Meus pais vão me matar

Tão nova e assumir tamanha responsabilidade

Uma solução hei de buscar

Vou falar com ele

Enfrentaremos isso juntos

Dois jovens imaturos

Seremos nós contra o mundo

Não pode ser meu - ele afirma

Sua puta! me traiu!

Quero DNA - vocifera

O abandono bate à janela

Família conservadora

Sociedade julgadora

O namorado que fugiu

O fim do poço está aos meus pés

Quando me veio à mente

Uma ideia hostil

Outra solução irei procurar

Meus pais irão me ajudar

Tolice a minha

Situação desesperadora

Nem teto agora tinha

Sem apoio do namorado

Sem apoio dos pais

Sem apoio social

Sem apoio estatal

São só trezentos reais

Resultado garantido

Dor momentânea

Só haverá alguns gritos

Grito este que não foi baixo

Resultado logo veio

O aborto não foi só do bebê

Duas vidas

Em um só golpe

Hoje o choro

Deve-se a duas mortes

Omissão estatal

Aborto paternal

Até quando será assim

Infelizmente

Para o pobre não tem fim.