SOFRIMENTO: breve reflexão.

O sofrimento é visto como algo negativo, como uma mácula indelével que só atrai negatividade e que, portanto, deve ser esquecida, não confrontada, apagada da memória. É justamente nessa percepção deturpada que o sofrimento apenas gera mais angústia, mais sofrimento, tanto físico quanto psíquico, pois nenhuma limitação anímica será capaz de ser transposta na introspecção do contato com a fragilidade humana.

O sofrimento deve ser encarado como uma oportunidade de aprendizado, de crescimento, do contrário só trará amargura e rancor. Esvaziar a utilidade do inevitável é uma ignorância sem tamanho. Ninguém passa pela vida sem sofrer, mas pode passar por ela sem amadurecer, sem perceber que a vida é curta e frágil e que somos vulneráveis e transitórios.

Quem não estiver disposto a sofrer, isso é, encarar o sofrimento em toda sua dimensão, com paciência e resiliência, enlutando, aceitando a realidade limitada do homem, percebendo, na inevitabilidade do sofrimento, a inevitabilidade da experiência e, portanto, do amadurecimento que a reflexão tem o potencial de trazer, terá desperdiçado uma oportunidade de evoluir. Ocorre que, ao não evoluir, certamente irá igualmente desperdiçar mais e mais a vida ao dar importância a frivolidades, egoísmos e rancores.

Sofrimento, àquele que não atenta para a purificação que pode obter, não passa de uma mera dor que nada ensina, algo limitado ao corpo que, uma vez convalescido, seguirá carregando uma alma agora ainda mais amargurada. De outro lado, quando a inevitabilidade do sofrimento encontra uma alma disposta à reflexão, gera o verdadeiro sentir a vida, apreciá-la em toda sua magnitude.

Faça tudo para evitar o sofrimento, mas quando ele chegar, e mais cedo ou mais tarde chegará, aceite sua natural presença e tenha paciência na dor que passa, que sempre passa: a dor física, pelo tempo; a anímica, pela compreensão. Afinal, somente o indivíduo que está disposto a sofrer será capaz de experienciar o amor, pois o amor se revela no sacrifício incondicional, o qual só é afeto àquele que aprendeu que o sofrimento nunca é despropositado, mas sempre pode nos fazer crescer. O sofrimento, quando bem interpretado, reestrutura a mente, reorienta os propósitos, reorganiza as prioridades.

Sofrer ensina a se livrar do supérfluo e do superficial, ficando com o sóbrio e o natural. Sofrer ensina a escutar os outros com atenção, compreensão e compaixão. Sofrer ensina a não perder a serenidade. Sofrer ensina que o passado é imutável, mas não a visão sobre ele. Sofrer ensina a admirar a própria vida ao dar novo significado aos obstáculos diários. Sofrer ensina a aceitar os defeitos, não no sentido de não mudá-los ou de ser condescendente, mas de ter paciência consigo na busca pela superação. Sofrer ensina a se reencontrar, a parar de mirar o horizonte, o mais além, para voltar a viver próximo daquilo e daqueles que de fato tem significado em sua vida. Sofrer ensina a aproveitar experiências, sentir o momento, parar para perceber a vida que passa, pois, como dizem os versos de Lenine: “Eu sei, a vida é tão rara. A vida não para não.”.

Sofrer ensina que, embora sonhar seja bom e necessário, é preciso cuidado. O sonho que exige anular o viver presente para sua realização é pesadelo em curso, pois sonhos devem agregar valor, nunca eliminar a vida. Sofrer ensina a diminuir o ritmo para abraçar a realidade em toda sua intensidade. Sofrer ensina a parar para escutar uma música, contemplar a beleza, escrever um poema, visitar um amigo/parente, tomar um banho de mar, ler aquele livro reservado ao tempo que nunca aparece, refletir e saborear as conquistas.

Enfim, sofrer ensina, acima de tudo, que, se do prazer eu tiro um pouco, isso já me basta!

Leandro Barreto Bortowski
Enviado por Leandro Barreto Bortowski em 17/10/2016
Reeditado em 19/08/2019
Código do texto: T5794848
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