Escritos sobre o Cortar das Asas
Aonde os pássaros vão para morrer?
Eles simplesmente despencam do topo de uma árvore? Escondem-se em seus ninhos?
Será que sabem ou sentem? Será que sofrem ou choram?
Eles, ainda que se apoiem em suas naturezas, ainda que não haja espaço para incertezas, têm que lidar com o fim de sua maior expressão de liberdade e vida: o voo.
Todavia, por nós, humanos, como a morte é enfrentada?
Nós, que não podemos escorar nossos medos em instintos. Nós, que definimos que a morte é, definitiva e subitamente, a ausência da vida, o cortar das asas, a descontinuidade, o ponto final. Nós, que questionamos Deus como se estivéssemos recebendo o castigo de um pai zangado. Nós, que temos tanto medo de sentir medo...nós tememos a tudo.
Podemos invejar a destreza dos bichos diante suas dificuldades, mas jamais tomá-los por inconscientes, pois já nascem eles, mesmo que cruamente, cientes de suas limitações, capacidades e destinos. Talvez seja isso o que os torna tão corajosos. O homem, ao contrário, normalmente não tem tempo de descobrir o limite de sua capacidade, muito menos a brevidade de seu destino.
A morte é, sem dúvida, um evento único na vida de um ser humano, tal qual seu nascimento. Um longo monólogo que pode ou não ser aplaudido ao final.
Aliás, e os homens, o que sentem antes de partir?
Deve haver aquele que se isola, mas o convido a lembrar que os humanos não sobrevivem sozinhos. Quanto mais distante dos vivos, mais próximo dos mortos se está.
Ou pode haver também aqueles, não se sabe se por coragem ou desespero, ao reconhecer sua linha de chegada, agarram-se a cada segundo, justificam decisões repentinas e fazem aparentes bobagens, como quem não se importa com o clímax daquela festa fúnebre.
Alguns vivem e morrem esquecidos, e são estranhamente adulados durante o velório. "Ah como vai fazer falta!" E lamentam, aos prantos, nunca mais poder abraçá-los.
Outros são tão odiados vivos, quanto amados mortos. Vá se ler em suas lápides e está lá: amado pai, amada esposa, amado irmão... Não, ninguém quer odiar um defunto. Apenas dizem, pelas costas, "fulano vai ter uma morte triste, de tão cabra ruim que é a peste!"
Se a morte é uma sentença? Só aos olhos de quem fica.
Pois quem parte, não paga com a morte...presenteia talvez, ou quem sabe, mate alguém de saudade.
Kendra Hintze
08.09.2016
* Pensamentos motivados pela pergunta de um amigo, o questionamento inicial do texto.