Onde está o Fábio?

Permita-me lhe fazer uma simples pergunta: onde está o Fábio? Sim, tenho procurado por ele há semanas, mas ninguém sabe onde está morando. Há muito Fábio no Brasil, ou melhor, no mundo todo. Seu sobrenome é Rodrigues. Ainda não sabe quem ele é? Vou lhe contar um pouco de sua história, para que fique mais claro para você.

Fábio Rodrigues da Silva Pinto nasceu em 1990, em uma grande metrópole brasileira, a qual não nos interessa saber. O pai morreu quando ele tinha dois anos. Não lembrava coisa alguma dele. A mãe trabalhava como empregada doméstica na casa de uma senhora riquíssima. Tinha três irmãos: Marcos, Maria e Joaquina. A segunda engravidou aos quinze anos de idade, mas o pai da criança sumiu e nunca mais dera notícia.

Marcos trabalhava em uma pequena oficina na esquina de casa. Era um garoto trabalhador e obediente à mãe. Joaquina era a mais nova de todos. Sua única responsabilidade era a de ir à escola e mesmo assim, por vezes ela faltava ás aulas. E claro, havia Fábio. Mais novo que Marcos, o mais velho, e mais velho que as irmãs. A mãe dizia que isso era coisa de Deus: primeiro chegara dois homens e depois duas mulheres. Os homens iriam sustentá-las, embora na prática não fosse assim.

Como moradores de periferia, Fábio e Marcos sabiam que o futuro quase certo que os esperava era o de chegar à meia-noite em casa fedendo e bêbado. Sair pelo morro colocando filhos no mundo e não criando nenhum. Era assim com todos e eles não seriam especiais.

Aos dezesseis anos, Fábio disse para a mãe que queria fazer uma faculdade. A mulher rira bastante.

– Não temos dinheiro nem pra comer, moleque! – dizia, embora soubesse que o garoto pedia o correto.

Nessa época Fábio se envolveu com o crime. Passava pela avenida próxima do morro e via aqueles outdoors imensos com propagandas das últimas televisões da moda, dos sapatos mais caros, entre outras. O desejo infame de se tornar “bem-sucedido” o jogou no mundo das drogas e do crime. Fumava até que sentia seus pulmões arderem. Sua mãe percebera suas atitudes estranhas, mas não comentava nada.

Quando Fábio tinha dezenove anos, Marcos, aos vinte e dois, morreu esfaqueado no topo do morro por uma gangue rival. A culpa? Do Fábio que não pagou a dívida! De quem mais seria?

A irmã mais nova rapidamente entrou para a prostituição. A mãe? Não saia de casa o dia todo. Estava debilitada, fraca. Mal conseguia andar pela casa.

Você deve estar pensando que eis o fim da história. Não, ainda não acabou. Quando completou vinte anos, Fábio foi embora de casa. Largou toda a família e foi em busca de uma vida melhor. O drogado largou a doente, o morto, a grávida e a prostituta! Cinco miseráveis infelizes! Sim, é assim que o mundo os vê, acredite.

No centro da capital, conseguiu um emprego de engraxate. Engraxava os sapatos de uns, depois ia engraxar de outros e assim ganhava a vida. Não, ele não se tornou uma das pessoas mais bem-sucedidas do mundo. Engraxava mal. Nem todos queriam seu serviço.

Largou o trabalho e foi trabalhar em uma lanchonete. Vagabundo! Mais comia do que trabalhava. Trabalhou em um supermercado. Vamos chamar a polícia, cachorro! Três primeiras semanas e havia roubado alguns sacos de pão. Sinceramente eu não sei como o chamavam: cachorro, lixo, demônio, vagabundo...

Um encosto para a sociedade? Eu diria mais trabalho para os homens de terno de Brasília.

Retornando a história, Fábio, aos vinte e um anos, passou a pedir esmolas nos semáforos. Ô vida miserável a desses vagabundos! Vão trabalhar! Recebia muito pouco por dia para ficar vivo. Nenhum ser humano merecia aquilo. Nos semáforos da grande cidade conheceu Olho de Bode e Pato Pequeno, dois companheiros de trabalho. Olho de Bode se envolvia com drogas. Usava todo o dinheiro que conseguia pedindo nos sinais, comprando droga com os homens do morro. Morro este que, aliás, Fábio via da avenida mesmo.

O morro era alto e íngreme, assim como perigoso e pobre. Mas mesmo assim Fábio sentia saudades da época em que morava em casa. Como estaria sua mãe? E suas irmãs? A mãe deve ter morrido. A mais velha talvez tenha sido levada por um bêbado galanteador que prometeu cuidar das crias da garota. A mais nova? Só Deus sabe que diabos aconteceram com essa prostituta!

Fábio saiu do mundo perigoso dos semáforos. Aos vinte e três anos, começou a fazer algumas apresentações de humor. Um humor indecente, indecoroso. Mas as apresentações eram em bares, os quais ninguém ligava para o jovem. Ganhava mixaria que servia ao menos para deixá-lo vivo.

Onde ele morava? Em um cortiço apertado que mal cabiam dez pessoas, mas viviam quarenta. Com muito orgulho, Fábio dizia ter duas roupas. Uma raridade, decerto! A maioria do cortiço possuía apenas uma roupa esfarrapada. Uma roupa nova por ano e deveria agradecer de joelhos.

Vinte e cinco anos: Fábio tentou se matar. Sim, isso mesmo que você leu. Arranjou um revólver (o qual a história da obtenção da arma não nos será importante) e tentou atirar contra a própria cabeça, mas desistiu. O homem, que há alguns parágrafos atrás era uma criança nascida com muita alegria, agora usava drogas e tentava se suicidar.

Aos vinte e seis anos...

Bem, estou à procura dele. Depois de tentar se matar mais de cinco vezes, foi trabalhar vigiando os carros nas calçadas, popularmente chamados de flanelinhas. Essas são as informações que tenho de Fábio. Uma breve história, para que você, com toda a bondade que há em seu coração de querer ajudar os necessitados e “mudar o mundo”, mova-se de alguma forma. Sim, porque esse garoto precisou de ajuda, mas não havia ninguém para ajudá-lo.

A mídia o colocou como palhaço nos programas de televisão. Os jornais o chamavam de marginais. Mas não, ele não nasceu assim. A culpa? Eu realmente não sei, pois preciso perguntar isso para ele. E você, pode me ajudar a encontrá-lo? Onde está o Fábio?