Encontro no tempo

Na multidão, muitos metros antes nossos olhares se cruzaram. De lá, o menino que eu era, e de cá o homem que sou. Eu caminhei e ele continuou parado; avancei cada vez mais, notando que nessa aproximação, vários anos se passavam. Eu tinha ali, as respostas e direções de todos os caminhos, sabia cada passo que ele devia dar; ele continuou parado quando me aproximei sem dizer nada; meus olhos do presente contemplavam a inocência e o brilho ainda aceso do olhar daquele que apenas começava. E eu via naquele brilho do passado a mesma busca que agora trago como bagagem. Sem dizer nada o abracei apertado e demorado. Ele olhava para o futuro; um vazio na sua frente; logo, não me via, mas sabia que eu estava ali; não se movia, apenas sentia, porque sabia que estava de alguma forma sendo abraçado. Sempre fui eu mesmo, eu sempre estive aqui.

O caos ao redor gera um silêncio tão grande que quase tudo se torna invisível e uníssono quando a alma consegue se ver de frente. Tudo que há, existe, mas ao mesmo tempo não está ali. Soltei e olhei bem fundo em seus olhos ainda sem óculos, quase transparente na imagem que se formava. Levei àquele encontro tantas respostas amontoadas nesses anos e o que eu não previ, aconteceu. Para ele minhas respostas e esclarecimentos não são mais do que imaginação; são letras de um alfabeto criado por si mesmo, sendo uma pessoa que não sabe ler nem escrever. Eu era cego demais para ver; creio que eu ainda não exergo muito bem nos dias de hoje, mas almejo ainda me encontrar mais uma vez com quem sou; poder devolver o abraço quando eu o sentir, já sabendo ler nesse presente que há pouco tempo era futuro, e que sem tempo para pensar, já será meu passado.

Douglas Mello
Enviado por Douglas Mello em 29/06/2016
Reeditado em 29/06/2016
Código do texto: T5682381
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