Entre Quatro Paredes
ENTRE QUATRO PAREDES
FRANCILANGELA CLARINDO
PREFÁCIO
Por Márcia Maria Luconi
Muitas pessoas passam por
obstáculos, muitas destas pessoas
nestes obstáculos estacionam,
sentindo tanta pena de si mesmo, que
se esquecem dos que as amam e
sofrem por elas, tornam-se egoístas e
depressivas, o Pai proporciona-lhes
saídas abrindo pequenas frestas
fazendo a luz passar por estas frestas,
mas elas sem fé e sem amor pela vida
simplesmente viram às costas para a
Outras pessoas tentam
enfrentar os obstáculos, agarram-se
ao facho de luz, mas desistem quando
percebem que não é tão fácil,
desistem porque acham que devido
ao obstáculo que enfrentam, elas
deveriam ser privilegiadas por Deus.
Mas existe um número
pequeno de pessoas que ao se
depararem com o obstáculo, não
sentem pena de si mesmo, sentem
sim uma fé imensa e um amor
verdadeiro pelos que estão a sua volta,
e ao perceberem o pequeno facho de
luz agarram-se a ele bravamente,
muitas vezes ao vencerem uma etapa
aparece outra bem mais difícil, mas a
cada etapa vencida elas se fortificam
em sua fé e em seu amor. Sabem que
nada é o acaso, que nos
acontecimentos mais corriqueiros da
vida existe o propósito Maior do
Criador, então além de passarem
bravamente pelas duras provas de fé e
amor elas também passam através de
sua luta a mensagem Divina, o Pai
nunca nos abandona, somos nós que O
abandonamos, mas Ele em sua
Misericórdia Divina e Infinita Bondade
está sempre esperando que nos
agarremos ao pequeno facho de luz,
para que Ele possa operar a nosso
favor.
Francilangela faz parte deste
pequeno grupo, ela hoje já é vitoriosa,
venceu os obstáculos, venceu a si
mesma, conseguiu visualizar o lado
positivo de tudo o que lhe aconteceu, e
neste livro ela deixa a sua mensagem,
ela leva a todos que enfrentam
obstáculos, sejam grandes ou
pequenos, a certeza da vitória,
lembrando que nem sempre que
perdemos é sinal de derrota, pelo
contrário é sinal que devemos rever as
nossas atitudes e nosso eu interior e
então partirmos para a nossa grande
vitória.
lido, compreendido e sua mensagem
deve ficar dentro de nós, para jamais
esquecermos que enquanto há VIDA,
devemos como guerreiros de luz lutar
por ela, tendo a fé como couraça e o
amor como espada.
Um livro que vale a pena ser
Boa leitura,
Luconi
Marcia Maria Luconi, revisora e escritora.
FRANCILANGELA CLARINDO
ENTRE QUATRO PAREDES
APRESENTAÇÃO
POR QUE ESTE LIVRO?
No dia 22 de Maio de 1995 caí dentro
de um ônibus. Tudo que veio depois foi
consequência. E o antes deixou de existir.
Minha vida passou a ser a de antes do
acidente e a de depois. Ele foi um marco.
A principal finalidade deste livro, a
que pensei há mais de quinze anos, quando
não movia minhas pernas e nem sabia se
as poderia mover novamente é dizer para
você que não anda, que está preso entre as
quatro paredes do seu quarto, que está
preso a uma cadeira de rodas, que sofreu
um acidente onde esta possibilidade existe:
A vida vale a pena.
Andando ou não, estando ou não
preso a cadeiras de rodas, muletas ou
bengalas, vale a pena viver. A vida é muito
mais que isto. Tenha fé, forças e
esperanças.
Eu sei que muito aconteceu,
acontece e ainda vai acontecer. Eu sei que
é difícil. O dia-a- dia é um terror! Mas vale a
pena! Sua vida é importante para Deus e
para todos que o amam. Mas ela tem que
ser importante para você! Pense nisto!
Dizer também para os que não estão
presos entre quatro paredes, que não têm
nenhum problema físico que amem suas
vidas e prezem por elas. Não se prenda por
bobagem. Você é livre e curta esta
liberdade com responsabilidade. Há muitos
que gostariam de fazer o mesmo e não
podem. Se você pode, não se prive. Livre-
se das prisões mentais, Esqueça a
depressão, a inveja, a tristeza, a dor. Elas
não existem de fato. Você é livre. Saia,
comemore, viva intensamente sua vida da
melhor forma possível.
ENTRE QUATRO PAREDES
CAPÍTULO 1
ENTRE QUATRO PAREDES
Um dia, há muito tempo atrás,
eu estava em meu quarto, entre as
quatro paredes do meu quarto,
pensando na possibilidade de sair e
não podia. Estava presa por uma lesão
medular.
Naquele momento pensei nas
diversas prisões que impomos a nós
mesmos. Prisões mentais que não
existem realmente, mas que são
criadas em nossa mente e só nos
atrapalham a viver de forma feliz. Foi aí
que nasceu a ideia deste livro.
Sozinha entre as paredes do
meu quarto, pensando, sem poder me
mover, cheguei à seguinte conclusão:
Por que, Senhor, quando andamos
temos tantos problemas se temos a
capacidade de sairmos do lugar?
Parece tão simples. Se alguém
que não gostamos aparece, podemos
sair. Se uma cadeira não está
confortável, levantamos e procuramos
outra.
Enfim, se tem algo que nos
desagrada, podemos ir ao encontro do
agradável.
Mas não é assim que funciona.
Será meu Deus, que temos que
passar sempre por problemas para
aprender?
O bom seria se pelo menos
aprendêssemos.
CAPÍTULO 2
NASCI
No dia 23 de Agosto de 1972
nasci.
Meus pais casaram no dia 13 de
Fevereiro de 1970.
Mais tarde eu teria um filhos na
mesma data.
Minha mãe ficou grávida e perdeu o
bebê por causa de uma bola que
passou entre suas pernas.
Ela tomou um susto e abortou.
Depois fui eu. Segunda gravidez.
Primeira filha.
CAPÍTULO 3
E CRESCIA
Fui uma criança bastante amada
por meus pais, familiares e amigos.
Tão amada que hoje tenho
dificuldades em um ambiente hostil.
Fico meio que sem jeito.
Sinceramente, não gosto.
Saio de fininho.
Particularmente, amo a criança
que um dia fui.
Era esperta, não esperava nada,
lutava, buscava, ía em busca dos meus
objetivos e tinha minhas certezas.
CAPÍTULO 4
O ACIDENTE
No dia 22 de abril de 1995
peguei o ônibus Papicu Centro
Expresso sentido Papicu Centro. O
ônibus passou em alta velocidade
numa oscilação na pista e eu caí.
Caí e estraguei minha vida. Caí
e fraturei a coluna. Caí e fiquei
impossibilitada de realizar movimentos.
Caí e muitos dos meus sonhos não
mais se realizariam. Caí.
Naquele momento eu não sabia
o que ocorrera, mas senti uma onda
das minhas costas à ponta dos meus
pés e depois, nada. Não sentia minhas
pernas, não conseguia me mover.
Gritei! Um grito leve, baixo,
rouco.
Ninguém ouviu. Não sou dada a
gritos graves, altos, escandalosos.
Gritei novamente. Alguém lá da
frente ouviu e comentou: - Tem alguém
gritando lá atrás.
Então o motorista parou o
ônibus, desceu e foi ao meu encontro lá
atrás.
As pessoas pegaram-me,
colocaram-me lá na frente. Segurando-
me, duas pessoas foram junto comigo
até o Hospital Cura D’ars. Lá chegando
não havia atendimento traumatológico.
Então uma assistente social ficou
comigo até que eu conseguisse ir para
o IJF. Isto porque a ambulância não
vinha me pegar de um hospital para
outro.
Como eu trabalhava na
ETTUSA, falei com meu chefe e pedi
que conseguisse uma ambulância.
Tudo certo!
A ambulância chegou,
colocaram-me um imobilizador de
coluna e fomos eu e um dos
passageiros do ônibus ao IJF.
Lá chegando o médico pediu uns
exames e constatou fratura na coluna
lombar.
Fiquei vinte dias internada.
Cinco meses sem andar de jeito
nenhum.
Dois meses andando com a
fisioterapeuta.
Até um ano do acidente andando
com duas muletas.
Até dois anos do acidente
andando com uma bengala canadense.
Os outros doze anos foram
cheios de quedas, dores lombares,
torções, comprometimento dos joelhos,
complicações e sequelas advindas
daquele momento fatídico.
Até hoje luto em virtude daquela
queda. Tudo porque tive uma lesão
medular.
Mesmo assim só tenho a
agradecer a Deus por estar junto
comigo.
CAPÍTULO 5
NO HOSPITAL
Não sei o que aconteceu com o
senhor que ficou comigo no hospital.
Ele estava indo trabalhar naquele
ônibus, no entanto, não foi para ficar
comigo. E ficou até que minha mãe
chegasse.
Ele foi muito legal. Rogo a Deus
que o tenha abençoado muito. Um
estranho ajuda tanto uma estranha. E
como ajudou-me. Passou pelos
exames, médico e espera.
Quando minha mãe chegou, já
estava com o diagnóstico e sendo
umas quatro horas da tarde.
O acidente ocorreu por volta de
11 horas da manhã.
Ele disse que ia falar com o
patrão para explicar as cinco horas de
atraso. Um bênção aquele senhor.
A primeira benção porque o
Senhor Jesus esteve comigo o tempo
todo, colocou pessoas maravilhosas em
meu caminho.
Deus não só lhe dá a cruz que
podes carregar. E ainda lhe ajuda a
carregar a sua, nunca nos deixa
sozinhos.
Como Deus é maravilhoso.
Não posso dizer que o acidente
foi uma coisa boa, que não sofri, que
não senti dores e também medo, muito
medo, o que até hoje sinto do futuro. Se
pessoas normais comprometem a
coluna ao ficarem mais velhas, imagine
Mas tento não pensar nisto.
Volta e meia penso, mas tento
esquecer, mudar o foco.
Se me detenho neste
pensamento choro e fico amedrontada.
Daí evitar para não sofrer por
antecipação.
Mas o que eu queria dizer é que,
mesmo sendo tudo difícil, Deus agiu
milagrosamente do momento da queda
até hoje, agora, neste momento que
escrevo.
Como me sinto agraciada. Como
me sinto protegida. Como me sinto
agradecida.
Você vai ver com o decorrer dos
relatos como Deus esteve presente e
enviou o melhor para mim, aliviando
minha dor, secando minhas lágrimas,
amenizando minha tristeza. Não posso
dizer que tudo foi alegria num momento
tão complicado, mas que poderia ser
muito pior se meu amado Deus não
estivesse comigo. Tudo pude passar
porque o Senhor me fortalecia.
Deus literalmente carregou-me
nos braços e conversou comigo neste
período. A Ele toda honra, glória e
poder! Amém!
Depois que mamãe chegou, o
senhor que estava comigo do ônibus
despediu-se. Eu o agradeci e ele partiu.
Nunca mais soube dele.
Fui internada na sala de
observação aguardando um leito na
enfermaria. Sentia muito frio ali. Não via
a hora de sair. Mas fui bem tratada. Era
tudo limpo e organizado.
Foram vinte dias no hospital.
Seriam dezenove se não tivesse faltado
ambulância no dia que o médico me
deu alta. Conto já como foi isto. Mas
antes quero falar de outras coisas.
Deixo para o fim o momento da alta e
tudo que aconteceu então. Cada coisa
a seu tempo.
Passado o susto do que
acontecera e já com o diagnóstico, era
esperar os procedimentos médicos.
Havia a fratura e eles fariam
uma cirurgia. Esperei nove dias por ela
(ou foram onze, não lembro bem
agora). Esperei então por ela sem me
mexer, imobilizada por mim mesma,
pois o médico avisou para não mover
por causa do risco da lesão medular.
Era incrível. Não mexia. Minha
mente enviava os comandos. Mas
minhas pernas, meus pés não se
moviam. Eu me esforçava tanto,
chegava a ficar exausta, morta de
cansada de tentar mentalmente mover
minhas pernas, meus pés, meus
dedinhos. Mas nada! Eles
permaneciam lá, sem movimento.
Ficava também cansada da posição:
sempre de peito para cima.
A cirurgia veio 9 dias depois da
internação. Agora lembrei bem disto.
Não foram onze dias e sim nove. Nove
dias aguardando. Neste período meu
marido tentou de todas as formas
conseguir um colchão d’água para mim.
Não queria que eu ficasse com ferida
às costas. As famosas escaras.
Ele conseguiu: Trocaram o
colchão. Não lembro se antes ou
depois da cirurgia
Já faz muito tempo tudo isto.
Algumas coisa não lembro direito das
datas ou o que ocorreu primeiro. Dê um
desconto nisto, porque realmente vou
lembrando e escrevendo. São registros
da memória e não tem como saber
algumas datas específicas.
Sempre que precisavam tirar-me
da cama usavam uma técnica. Cada
um dos maqueiros segurava nas pontas
do lençol, esticava bem e me erguia,
transportando-me assim para a maca.
Fazia isto para realizar exames fora do
leito e no dia da troca do colchão.
Senti muito frio e calor no
hospital. Quando estava na sala de
observação, muito frio. Na enfermaria,
muito calor. Com o colchão d’água,
voltei a sentir frio.
Foi tudo muito bem na cirurgia.
Não lembro de quanto foi sua duração.
Lembro-me de ter ficado aérea com a
anestesia geral.
Já acordada, mas sem estar
bem consciente, minha tia Desuíte foi
visitar-me. Justamente neste dia e
encontrou-me pálida, os pés brancos,
magra, em cima da cama e meio sem
sentidos. Chorou!
Eu a vi chorando só não
entendia bem o motivo. Estava tão
longe...
Emagreci bastante neste
período. Não queria comer o que me
davam. E o que eu queria, não me
deixavam. Eu estava doente dos ossos,
mas mesmo assim era um caos para
comer certas coisas.
Um dia, minha tia Liduína foi
visitar-me e eu pedi um sanduíche.
Estava com tanta vontade. Pensa que
ela deixou? -Não, Lanja (meu apelido de
infância)! Só pode comer a comida do
hospital. Não vou permitir que você
coma e depois piore. E blá, blá, blá, blá,
blá. Fez um discurso. E eu fiquei muito
triste porque queria o sanduíche. Chato
De qualquer forma, por causa da
anestesia, eu acho, depois da cirurgia,
fiquei com uma tosse e a garganta meio
irritada.
Tinha medo de tossir porque
doía tudo, então falei com a
nutricionista para trocar minha
alimentação por pastosa. Tudo bem!
Ela trocou.
Imagine o sufoco quando eu
melhorei e quis voltar para alimentação
normal. Não pude. Era fim de semana,
a nutricionista não estava. E aí eu tive
que passar mais dias com aquela
alimentação que eu não suportava
mais. Foi o fim!
Mas quando a nutricionista
chegou, deu certo. Afinal de contas,
não tinha restrição alimentar descrita
pelo médico. Ainda bem que isto se
resolveu.
Aconteceu também algo bem
constrangedor. Logo após a cirurgia
fiquei bem sensível ao toque. Não
suportava o vento do ventilador. Não
suportava roupas no meu corpo e muito
menos o lençol.
Tive então que ficar nua em
cima da cama. Era o jeito.
À noite veio o rapaz limpar o
quarto. Eu já estava dormindo, acho. O
fato é que ele me viu sem lençol e foi
cobrir-me.
Imagine o escândalo que eu fiz.
Comecei a gritar: -Tira, tira, tira. O
rapaz ficou tão assustado. E eu,
recatada como sou, pedindo para ficar
nua, sem lençol, em cima de uma
cama. Altamente constrangedor. Mas
naquele momento nada disto
importava. Minha única intenção era
não sentir dor.
Minha mãe então resolveu lá a
questão e eu fiquei sem lençol e sem
ventilador porque os dois doíam muito e
minha pele não suportava.
Ainda bem que isto não durou
muito e depois passei a suportá-los.
Pelo menos a estes dois porque ainda
durante muito tempo fiquei sensível ao
toque, mesmo quando voltei para casa.
Houve uma vez, no horário da
visita que religiosos estavam
conversando em cada leito com os
pacientes.
Uma senhora aproximou-se de
mim. E eu comecei a gritar. Eu não
sabia o motivo, mas meu pé doeu. Era
uma dor grande, na parte nervosa, dor
complicada, difícil de explicar. Muito
sensível e eu não suportava. Gritava!
Foi um alvoroço! Ficaram a se
perguntar o que teria acontecido para
provocar meu grito. Procura daqui,
procura dali, encontraram um terço bem
embaixo do meu pé na cama.
Deduziram que o terço o tocou e
aí eu gritei, Pois é, um terço
escorregando pelo meu pé causou uma
dor terrível ao passo que eu não podia
mexer.
Era algo tão contraditório: Uma
alta sensibilidade ao toque do terço, do
vento do ventilador, do lençol. Mas eu
não sentia as agulhinhas que o médico
espetava e nem o martelinho fazia
meus reflexos alterarem-se.
Eu nem mexia nada no meu
corpo abaixo da barriga.
Enfim, era deste jeito que as
coisas estavam e aconteciam naquele
hospital.
Alguém levou o álbum do Ítalo
Anderson. Eu o mostrava a todos que
me visitavam ou conhecia no hostital.
Meu lindo e amado filho que eu não
estava vendo. A saudade era enorme.
Ele ainda mamava e eu tive que sumir
da vida dele de repente. Imagina como
ele deve ter ficado. Como ele deve ter
me procurado para mamar, ouvir
histórias, balançar para dormir à noite.
Meu filhinho, quanta saudade eu sentia
dele. Talvez tenha sido a parte mais
dolorosa daquele período não ver meu
filho por vários dias, não poder
amamentar, não poder tocá-lo, não
poder contar histórias para ele dormir,
não poder balançá-lo na rede e nem
ficar deitada abraçadinha com ele.
Estava só como um aninho e cinco
meses. Eu havia acabado de ser mãe,
praticamente e ele, de nascer. Foi
muito ruim.
A hora da visita era deprimente
para quem não tinha ninguém.
Passávamos o dia todo em função dela.
Tudo acontecia antes ou depois da
visita. Mas na hora que ela acontecia
era sagrada. Nem alimento, nem
remédio, nem banho. Só a visita. E
para quem não tinha, era só ver os
outros abraçando familiares,
conversando com amigos.
Houve dias em que esperei
alguém e ninguém aparecia. Todos se
preparavam. Banho e roupinha
limpinha. Certo que sozinha, sozinha,
nunca fiquei. A maioria do tempo minha
mãe estava a acompanhar-me ou a
Márcia, uma grande amiga neste
momento.
Eu amava a Márcia porque ela
fazia massagem no meu pé. Era tão
bom. Parecia que ativava os nervos e
eu me sentia muito bem. Vivia pedindo
para ela fazer e ela fazia com todo
prazer.
A Márcia foi muito importante
porque ficou comigo no hospital
revezando com minha mãe. Rogo a
Deus que cuide sempre dela como ela
cuidou tão bem de mim. Que sua vida
seja repleta de bençãos, que seus
projetos se realizem de que seja bem
feliz junto com toda sua família.
Não lembro se antes ou depois
da cirurgia, mas ainda no hospital,
comecei a fazer fisioterapia ( e nunca
mais deixei até hoje e sempre
precisarei fazer). A fisioterapia é um
milagre. Não imediatamente, mas aos
poucos fui retomando meus
movimentos. Isto levou dois anos de
tratamento fisioterápico constante. Mas
voltei a andar sem auxílio, por um
tempo. Vez ou outra, vira e mexe,
preciso voltar às muletas, bengalas e
cama em virtude de torções, quedas
gessos e dor.
Mas vamos continuar a falar
sobre o período da internação. A
Márcia fez muitas amizades pelo
hospital e sempre vinha com
novidades. Havia o noticiário e os
extras, quando um ou outro chegava na
emergência. Minha enfermaria ficava
bem próximo. Com não estava
andando, ela era meus olhos pelo
hospital.
Minha higiene corporal era feita
através do banho no leito. Algodão
molhado em soro ou água passado em
minhas partes íntimas. Tudo feito com
muito cuidado para não me mover,
principalmente antes da cirurgia,
quando o risco de lesão era maior.
A alimentação era normal, mas
como eu ficava deitada, usava um
canudinho para os líquidos. Engasgar
era o que podia acontecer de pior, por
isto, tomava cuidado. Às vezes sentia
muito cansaço da posição.
Os dias foram passando. Havia
a rotina diária de medicamento,
fisioterapia, visita, banho no leito e
alimentação.
Na minha enfermaria chegou
duas moças em virtude de um mesmo
acidente. Saíram com um rapaz numa
moto sem capacete os três. O rapaz
morreu na hora, mas não disseram
para elas enquanto estavam lá. Uma
das moças sofreu ferimentos na perna
e a outra nunca mais voltou a andar.
Quando eu saí do hospital, um
dia na escola do meu filho, encontrei a
irmã dela e, como ficava perto, fui
visitá-la. Vi as duas. A dos ferimentos
na perna ficou com uma sequelazinha.
A outra permanecia na cama com a
mesma rotina diária do hospital. Muito
difícil.
Agradeço a Deus por ter voltado
a andar. Sei que a possibilidade de ficar
sem andar ronda minha mente sempre,
em virtude do estilo de vida que levo.
Fico sem tratamento e as coisas
pioram. Mas sei que é horrível, a ideia
me assusta bastante.
Mas o fato é que estou andando
e isto é muito bom. Graças a Deus, aos
médicos e ao milagre da fisioterapia.
Coisa abençoada porque eu vi o que
fez comigo. É incrível. Eu não
conseguia mover o meu dedinho do pé
e, após inúmeras sessões, consegui.
Certamente não andaria hoje se não
fosse a fisioterapia. Milagre de Deus
aqui na terra são estes fisioterapeutas.
Vamos falar agora do escândalo.
Só lembro de ter feito escândalo uma
vez quando era criança porque duas
amigas segredavam e não queriam me
contar.
Mas no hospital foi a segunda
vez. Horrível. Vou contar.
Já estava com 19 dias internada.
O médico veio pela manhã e me
liberou. Amém! Estava de alta. Não
andava ainda, não mexia ainda, mas a
parte dele, a cirurgia já havia sido
realizada e o resto era esperar para ver
o que aconteceria.
Eles não sabiam se eu voltaria
ou não a andar. Era uma incógnita e
eles não afirmavam nem que sim nem
que não.
Então de alta na mão o
problema era conseguir uma
ambulância para mim. Não
conseguiram. Tinha que ficar mais um
dia para esperar uma ambulância, pois
tinha ído pro interior e não havia outra
disponível. E eu, louca para ir pra casa,
de alta, ansiosa para ver meu bebê,
não via a hora de sair dali porque já
estava cansada. Normalmente eu
ficava calme e, pacientemente, ouvia
tudo com atenção e era obediente. Mas
neste dia fiquei desolada. Ninguém me
segurava. Chorei, gritei! Queria ir
embora. Não queria mais ficar ali.
Tadinha da minha mãe. Ela
começou a chorar diante do quadro que
via. Eu a maltratei. Eu Estava revoltada!
Queria porque queria ir embora. Não
aceitava as desculpas.
A assistente social veio
conversar comigo, explicar tudo de
novo e dizer que minha mãe estava
sofrendo com minha atitude e que ela
não poderia fazer nada.
Isto me fez recuar. O sofrimento
de minha mãe fez com que eu me
acalmasse e aguentasse mais um dia,
suportasse mais uma noite. E assim fiz!
No dia seguinte vieram avisar de
que estava ok. Eu iria embora. A
ambulância estava a meu dispor.
Graças a Deus! Iria para casa, para
meu filho. Fiquei tão feliz, tão feliz, tão
feliz!
Hoje ainda me envergonho do
meu comportamento. Fiquei fora de
mim. Por isto entendo as pessoas que
estão doentes e têm comportamento
hostil. É difícil! Não é nada fácil a rotina
de um hospital, ficar nas mãos dos
outros sem ter opinião porque ninguém
escuta o paciente.
CAPÍTULO 6
EM CASA
(COISA BOA!)
Quando estava na ambulância e
ela começou a mover-se vi o quanto
estava traumatizada. Ali, deitada,
ouvindo o barulho do trânsito, dos
carros, mas sem vê-los. Fiquei
atormentada e com medo de que outro
acidente acontecesse.
Meu coração disparava e o
medo não cedia. Fiquei assim durante
muito tempo. Ainda tenho medo de
andar lá atrás, no ônibus. E nem acho
que seja lugar de se ficar. É perigoso!
Enfim cheguei. Tive uma visão
parcial de tudo porque deitada nã dá
para ver muita coisa. Fui para meu
quarto. Quanta saudade!
Meu filho não estava e eu pedi
logo para que o trouxessem. Queria vê-
lo. Imediatamente!
Algum tempo depois ele chegou.
Ah! Lembro como se fosse hoje. Nos
braços do meu pai ele ficou na porta do
quarto.
As pessoas que estava comigo
perguntaram:
- Quem é Ítalo?
Ele demorou um pouco para
responder, olhou para um lado, para o
outro lado, para mim e disse:
- Mamãe!
Meu coração bateu tão forte. Eu
fiquei tão feliz! Ele continuou nos
braços do meu pai, eu não podia
abraçá-lo, eu não podia beijá-lo, ele
não podia me tocar e chegar sequer
perto de mim porque a dor ainda era
intensa, ninguém podia nem sentar na
minha cama porque eu sentia dores
fortes com a alteração do colchão.
Mas só o fato dele estar ali
confortava meu coração e eu não
permiti que ele ficasse longe de mim.
Durante todos os dias que se
seguiram, mesmo deitada e sem ele
poder se aproximar era em casa que
ele ficava para eu poder ouvir sua voz,
senti-lo perto. Eu até que deixava ele ir
passar o dia ou o final de semana na
mãe. Mas na segunda-feira logo cedo
se ele ainda não estivesse em casa
mandava irem buscá-lo. Reclamava se
não o fizessem logo.
E foi tão maravilhoso tê-lo ali.
Deus me livre se ele tivesse ficado
longe de mim, eu não aguentaria.
Bastava todo o resto. Ficar longe do
meu filhinho mais tempo ainda era o
fim. Não, não e não.
Uma vez a prima do meu marido
até perguntou por que eu não o deixava
na mãe direto. Seria mais fácil para
cuidar de mim. Era pesado cuidar dos
dois ao mesmo tempo e ainda a casa.
Mas eu não aceitei.
Houve um momento em que ele
tocou o dedinho em mim e eu tive que
gritar para ele sair de perto de mim. Eu
não aguentava a dor. Mas também meu
coração ficou moído de ter que mandar
meu princepezinho sair de perto.
Depois conversei com ele e expliquei
que a mamãe estava doente e não era
possível encostar. Ele, tão pequeno,
entendia tudo tão direitinho. Tadinho do
meu filho, deve ter sofrido tanto. Ele
amadureceu tão rápido.
Sim, nem contei. No dia que
cheguei do hospital tentaram colocá-lo
em meus braços para que mamasse.
Ficaram segurando ele e eu ofereci
meu seio. ele tocou, fez uma careta! E
depois disso nunca mais mamou.
Depois eu olhei o leite. Era uma
solução amarelada. Certamente estava
com um gosto péssimo dos remédios
que tomei.
Mas o Ítalo Anderson cresceu
muito nesses dias. Era tão maduro. Tão
novinho mas perguntava sobre tudo e
aplicava depois. Uma vez estávamos
sós. Eu reclamava de dor e ele foi até a
geladeira, imagino que deve ter
colocado algum banco para subir até o
congelador, pegou gelo e trouxe para
mim dizendo: Quer gelo, mamãe, quer?
Isto porque ele via tudo. A rotina
era semelhante à do hospital. Banho no
leito, sessões de fisioterapia, gelo para
alívio das dores nas costas, enfim,
assistia tudo e aprendia. Tão lindo!
Quero contar algo sobre o banho
no leito lá em casa. Lembram qu eu
falei que era com soro ou água e
algodão, não? Pois é. Mas a minha
mãe maravilhosa e também minha tia
Desuíte eram as únicas que davam um
banho o mais próximo possível do
normal. Com água no corpo. Como era
bom. Pegavam um grande plástico que
envolvesse toda a cama e, vejam só,
jogavam água em mim. Como era
gostoso sentir a água tocando meu
corpo, limpando depois de tanto
algodãozinho aqui e ali.
Achava maravilhoso quando
este banho acontecia. Pena que não
eram muitos.
Lembrei de um fato agora que
preciso contar. Ainda no hospital recebi
uma visita que deixou-me muito feliz. A
mãe de um amigo. Ela trabalhava lá. O
filho dela, que era meu amigo, pediu
encarecidamente que ela fosse me ver.
Ela disse que ele foi insistente. A visita
foi tão agradável e achei tão lindo meu
amigo mandar a mãe dele ir me ver. Ele
estava longe da cidade, trabalhando.
Achei fofo!
E esta visita também na época
me fez pensar como Deus era
maravilhoso. Algo aconteceu naquele
dia que foi proporcionado pela mãe do
meu amigo, não lembro direito o que
foi, mas deu mais amostras de como
Deus cuidava de mim lá naquele leito.
Obrigada, amado Deus, por nunca me
deixar só. Amo-te!
Mas voltando para o Ítalo
Anderson. Ele amadureceu muito. Acho
que o fato de ter deixado de mamar de
uma vez, não ter visto a mãe por vinte
dias, não poder se aproximar dela e ver
todo o tratamento que era feito o fez
crescer. E rápido!
Ele passou a ser meu
companheiro e fazia muito por mim.
Até chamar os vizinhos, caso
precisasse, e uma vez precisou porque
tive uma crise, ele fazia. E era tão
cuidadoso, tão amigo, tão especial.
Agradeço tanto a Deus pelo
maravilhoso filho que tenho e peço que
sua vida seja maravilhosa e abençoada
porque ele foi um filho totalmente
companheiro e amigo nas horas
difíceis, sem nem muito compreender,
tão pequeno que era.
Estes momentos são vivos até
hoje. Temos uma ligação tão forte. Eu
cuidei dele. Ele cuidou de mim. Hoje eu
sou responsável por ele, mas há um
carinho e um cuidado por mim
excessivo. Meu filho é muito especial
para mim. Eu o amo muito.
Quando eu estava internada e
depois o tempo todo que fiquei deitada
não me dava conta direito do que
acontecia. Simplesmente ía fazendo o
que era necessário.
Mas à medida que melhorava e
ía vendo as pessoas fui percebendo o
quanto muita coisa aconteceu enquanto
eu ali estava e quanto sofrimento era
para minha família.
Uma vez, passando pela cabine
onde eu trabalhava, meus colegas
foram me contar que o meu marido
estava passando por lá quando
disseram para ele se ele já sabia do
acidente que ocorrera comigo. A
empresa soube logo porque eu tive que
ligar para buscar uma ambulância. Ele
não sabia e ficou desnorteado.
Meus colegas disseram que ele
saiu atordoado dali e muito preocupado
em busca de mim. Ele só sabia que eu
não havia ido ao nosso encontro. Fiquei
de me encontrar com ele na casa da tia
dele e nada de aparecer. Percebi que
foi difícil também para ele.
Os vizinhos da minha mãe
também contaram como era para que
minha família se revezasse para cuidar
de mim e como a perspectiva de andar
ou não os assustava. Foi difícil para
eles.
Uma amiga minha contou-me
depois que quase não aguentou a visita
que me fez. Ela chegou em casa
angustiada de me ver naquela situação.
Foi difícil para ela.
Enfim, foi difícil para muitas
outras pessoas o momento em que eu
estava ali e vencê-lo é também uma
vitória tão deles quanto minha. Daí não
sei entregar é uma atitude sua que
você deve também a todas as outras
pessoas que a amam.
Simplesmente deixar acontecer,
não lutar, é uma atitude egoísta e fácil.
Eu sei, e como sei que é difícil fazer o
tratamento, é doloroso, cansativo e
lento. Mas é necessário. Voltar a andar
ou não depende muito também do
paciente. Até se for possível pode não
acontecer se ele não se esforçar. Sem
movimento não há como melhorar.
Se você ficar em cima da cama
sem nada fazer, nunca vai andar,
mesmo sem comprometimento
medular. Vai ficar mais difícil se tudo
ficar atrofiado. Faça o que for
necessário e quando for liberado andar,
ande. Sem medo. Ande!
Eu fiquei tão feliz no dia que a
fisioterapeuta me colocou em pé. Já
fazia cinco meses desde o acidente. E
era só deitada, deitada, deitada.
Então ela segurou-me. Avisou-
me logo que eu ficaria tonta, mas era
normal. E que só faria o que eu
suportasse. Então fomos tentar.
Sempre do meu lado, ela foi me
levantando e dizendo o que eu teria
que fazer. Quando eu fiquei em pé,
claro, fiquei tonta com ela havia
advertido.
Aguardamos um pouco. Depois
ela levou-me para os compartimentos
do apartamento que há muito eu não
via. Como foi bom. Vi o banheiro, a
cozinha, o outro quarto e ainda um
pouquinho lá de fora, pois ela foi até
fora de casa. Vi a rua, depois de tanto
tempo. Foi maravilhoso! Foi rápido,
mas foi muito bom. Não podia exagerar.
Era a primeira vez que eu me
levantava. Mas, sempre nas sessões,
ela fazia um exercício para eu ir me
levantando e assim, gradativamente, e
com ela, fui ficando mais tempo em pé
e treinando minha marcha. Pronto! Já vi
que voltaria a andar. Foi maravilhoso
saber disto e ter esta certeza.
Passado um tempo já andava
sem a fisioterapeuta, com a ajuda de
duas muletas. Fiquei tão contente que
até estudar eu queria. Então fiz minha
matrícula na faculdade, já estava com
dois semestres que não fazia, e fui para
a aula com muletas e tudo.
Sinceramente, confesso, foi uma
loucura. Sei que sou muito teimosa e
não escuto ninguém. Nem lembro o que
minha família falou em eu ir para a
aula, de ônibus, daquele jeito. Mas eu
O sonho durou somente um dia.
Minha gente, foi tão difícil, sofri tanto. A
começar no ônibus, mesmo com duas
muletas, uma de cada lado do braço e
de ser amparada por elas, fui em pé do
José Walter até o Benfica, onde ficava
a faculdade. Ninguém me deu o lugar.
Acho que Deus cegou aquele povo
para que eu aprendesse logo a lição.
O fato é este: Fui em pé durante
todo o caminho. Imaginem como fiquei
morta de cansada de tanto segurar meu
corpo. E não estava acostumada a isto.
Chegando lá, outro sofrimento.
Era um dia em que as aulas íam até o
fim da tarde. Quatro aulas pela manhã
e mais duas à tarde. Meu Deus! Quem
não saía de casa há um tempão passar
o dia fora e sozinha. Mas já estava lá e
enfrentei.
Na volta, o ônibus lotado, pelo
menos vim sentada, mas totalmente
exausta. Resolvi me render. Não era
possível aquilo todos os dias e fiquei
mais dois semestres sem estudar. Era
o jeito. Minha falta de juízo teve que
aceitar.
CAPÍTULO 7
UM ANO DEPOIS
No dia 22 de Maio de 1996,
exatamente um ano do acidente e
também aniversário da minha prima
resolvei ir para a casa da minha avó,
local da festa, sem as muletas. Era meu
primeiro dia sem elas. Decidi e pronto!
Não queria mais usá-las. Parece que
estou vendo eu descendo a rua
devagar, passo a passo, andando
sozinha. Tinhas pessoas ao meu lado.
Mas foi muito bom! As pessoas
olhavam e me cumprimentavam. Elas
sabiam de tudo, me conheciam desde
criança e acompanhavam minha
história.
A festa durou pouco porque com
a passar dos dias vi que ainda não era
possível andar se apoio nenhum e aderi
a uma bengala canadense que me
acompanhou por mais um ano.
Depois fiquei sem apoio
totalmente. Mas, em virtude de tantas
quedas que levo, sempre volto a elas.
Um dia destes tive que comprar um
bengala bastão e também outra
canadense. Dependendo do tipo de
coisa que acontecer, volto a elas.
CAPÍTULO 8
SEXO
Claro que podemos viver sem
sexo. Achei uma das maiores provas de
amor do meu marido quando ele teve
que superar este obstáculo.
Esperar pacientemente por anos
para poder ter novamente contato físico
comigo. Uma relação não pode basear-
se simplesmente nos elementos físicos,
se assim fosse, a minha teria acabado.
Por mais que eu não queira
entregar os pontos, tenho consciência de
que não sou mais a mesma, de que as
coisas não são mais do mesmo jeito. E,
mesmo assim, ele ficou comigo.
Um dia minha vizinha comentou
que ele deveria gostar muito de mim
por ainda ficar comigo porque eu
“andava assim”.
Fiquei pensativa: “Andar assim”.
Não me vejo andando, mas deve ser
muito diferente, as pessoas notam.
Eu não sei o que é, não ligo, não
presto atenção e também não dá para
me ver fora de mim, mas sei, pelas
inúmeras vezes que me param para
perguntar se tenho algo no pé ou algo
assim, de que ando diferente. Prefiro
nem pensar muito nisto.
O fato é que nosso
relacionamento teve que transcender o
físico, o material. Eu não tenho muito
mais a oferecer pelos padrões sociais.
E terei menos ainda à medida que o
tempo for passando.
Às vezes fico imaginando
mulheres lindas que se acham feias,
fazendo de tudo para atraírem
parceiros, enlouquecendo para
perderem um ou dois quilos. E eu? O
que sou diante delas?
O padrão de beleza é um ponto
altamente constrangedor para quem
não o tem. E lutar por ele, além das
possibilidades, o faz mais terrível ainda.
Eu digo a um amigo meu,
quando conversamos e chegamos
neste estágio mais avançado de
conversa, onde não consigo mais
segurar meus pensamentos, que, se
fosse no tempo de Hitler, eu seria um
dos descartados. Há vários pontos
negativos em mim para isto. É só olhar
e ver.
Daí achar extremamente
perigoso esses discursos eloquentes
sobre beleza e tal, sobre padrões
excessivos. Muitos nunca o vão
alcançar e nem por isto podem ser
excluídos. Há vida fora deste eixo e
temos que respeitá-las.
Mas a sociedade maltrata muito.
Piadas e comentários chegam a
massacrar ou até destruir vidas. Quem
se deixar levar, com certeza, não vai
mais querer viver. O suicídio é certo. Se
não o físico, o social.
Cuidado ao comentar em qum
mesa com muitas pessoas sobre os
quilos que tem que perder se você já
está maravilhosa, os cremes que tem
que comprar se sua pele já é linda, os
bens que tens que ter se já tudo
compraste, do carro que tem que trocar
se o seu já é show.
Enfim, como se sentirá se do
seu lado estiver alguém bem gorda,
com espinhas, pobre, sem carro ou
com um aos frangalhos? Com certeza
não se sentirá nada bem.
É uma questão de respeito, de
não querer agredir, de não magoar.
Nada com não poder crescer e
tal, claro que devemos ter e querer
sempre o melhor, mas há limites,
lugares e pessoas certas a quem
conversar sobre nossos desejos.
CAPÍTULO 9
AMBULÂNCIAS
Jesus! Como é difícil ser
transportada quando não se anda. Tens
muito dinheiro e queres realmente fazer
algo por alguém? Crie um meio de ir e
vir para pessoas com dificuldades
motoras. Pense na complicação.
Pessoas que precisam ir ao
médico, fazer tratamento fisioterápico,
sair um pouco para não pirar. Mas não
dá! Alugar é muito caro. As que existem
são só para quem está passando mal.
Não existe, pelo menos desconheço,
ambulância de livre acesso, gratuitas,
para quem não anda, ou chega perto
disto, fazerem seus tratamentos.
Eu sofri muito neste quesito.
Meu marido chegou ao extremo para
conseguir algum tipo de transporte para
mim, que, depois de um certo tempo,
foi cancelado. Este é um ponto sério,
uma lacuna social muito grande, que
ninguém dá conta e nem reclama
porque ninguém liga. São excluídos
socialmente e melhor que fiquem em
casa. Imagine como sai caro
disponibilizar uma ambulância todos os
dias. As iniciativas que vemos neste
sentido são fracas e não dão conta da
demanda. Acho tão injusto. E senti na
pele o descaso.
CAPÍTULO 10
INTERNET
A internet é um paraíso para as
pessoas com dificuldades motoras.
Imagina quem não consegue ir à
esquina sem cair, viajar através do
teclado por lugares vários. É um sonho!
Eu amo internet porque ela me
dá asas para fazer o que fica difícil para
mim de outra forma. Do jeito que gosto
de mem envolver com as coisas e
participar, ela vem bem a calhar. Afinal
de contas, minha limitação é física, mas
minha mente continua a mil. Sinto falta
de muitas coisas e a internet supre um
pouco esta carência.
CAPÍTULO 11
CUIDADOS PESSOAIS
Só quem ama cuida. Não há
como uma pessoa cuidar bem de outra
sem ter nenhum sentimento por ela.
Colocamos muitas pessoas para cuidar
de mim. Todas iam embora. Quem
cuidou realmente foi a família.
Lembro-me de uma que chegou
justamente quando eu estava
menstruada. Ela teve que me dar
banho no leito e nunca mais voltou.
Não tem como. É uma carga pesada e
difícil cuidar.
Houve uma, esta eu amava, que
tudo deixava para ficar comigo no
quarto conversando e penteando meu
cabelo.
Eu lá queria saber de comida,
roupa, ou seja, o que fosse. Estava
ótimo ela ali, perto de mim.
Mas engravidou e teve que ir
embora. Aliás, já estava grávida antes
de vir, mas só disse depois. Tinha
fugido de casa. Até hoje sinto
saudades.
Quando não se anda, ficamos
com uma visão diferente das coisas.
Aquela chatice de chamar o tempo todo
por alguém é para não ficarmos
sozinhos ou simplesmente sermos
cuidados, mas vistos.
Às vezes as pessoas dão banho,
alimento e tudo o mais, mas não
conversam, não têm você como uma
pessoa que precisa de atenção. Então
inventamos qualquer coisa para ter
alguém por perto. Eu me sentia assim,
imagine pessoas mais velhas ou que
estão há muito tempo sem andar.
Compreenda!
CAPÍTULO 12
DEPRESSÃO
Não é difícil quem não anda
entrar em depressão. A falta de se ter
alguém realmente prestando atenção
ao que somos e dizemos sem
simplesmente no querer alimentar,
cuidar e limpar, o trabalho que damos e
o cansaço apresentado por quem
cuidad de nós contribui para isto.
Daí encontrar algo para fazer
que se goste ser muito importante.
Ocupados, não prestaremos muita
atenção em detalhes mínimos e
seremos mais felizes sendo úteis aos
outros e a nós mesmos.
CAPÍTULO 13
MINHA GRAVIDEZ
Quando sofri o acidente tinha um
filho de um ano e cinco meses. A ideia
de ter outro assustava bastante. O
medo de ter dores piores do que as que
já tinha era constante.
Mas, tive uma que não chegou
ao fim, com três meses perdi. Estava
cadavérica. Passava muito mal.
Em 2006 para honra e glória do
Senhor Jesus tive meu segundo filho.
Uma benção. Fiz tudo direitinho que a
doutora mandou. Teve suas
dificuldades, mas nada que não
pudesse ser superado.
Nesta época, a Sílvia Helena,
prima do meu marido, que cuidou de
mim quando eu não estava andando e
era minha amiga desde o tempo de
Ensino Médio, daí não gostar de ver
meu sofrimento, escreveu-me uma
carta tão linda para me dar forças
naquele momento difícil e tão bom de
minha vida. Eu a encontrei dentro da
minha bíblia. Ela deixou lá para que eu
a visse e lesse depois. Transcrevo
agora para vocês.
“Francilangela, sei que tem
sido difícil vivenciar com alegria
esse momento tão sublime,
magnífico, mágico e maravilhoso,
essa experiência, a qual não temos
palavras para expressar e definir o
milagre de conceber um filho.
Mas deve lembrar e meditar
nas promessas do Senhor. Creia que
não será preciso passar nove meses
de angústia, tristeza. Somos
pequenos demais diante desse Deus.
Somos fracos, falhos, mas saiba o
quanto você é amada, importante e
essencial para Ele. Saiba que Jesus
te ama., quer te ver feliz.
Não aceite com naturalidade
que você tem que passar esse
momento tão especial de sua
gravidez sofrendo.
Acredite no poder de Deus
para restaurar e transformar em
momentos de prazer e alegria. A
Palavra do Senhor está cheia de
promessas de vitória. Tome posse
em oração e em espírito dessa
vitória para continuar uma gravidez
feliz.
Clame ao Senhor e Ele te
ouvirá. Ele está bem pertinho de
você e do seu bebê, creia, amém?
Jesus é um Deus de milagres.
Ele é o mesmo Deus do passado, do
presente e do nosso futuro. Veja a
Glória do Senho nessa sua gravidez.
Amém?
Jesus te ama e eu também!”
Sílvia Helena Soares Cidrão
Achei esta carta linda e vez por
outra, quando triste estava, lia e
continuo lendo até hoje, mesmo depois
de o Felipe Gabriel lindo ter nascido.
Ela diz muito do amor de Deus por nós
e continua sendo alento para mim na
hora da angústia e dor.
CAPÍTULO 14
MEUS PASSEIOS
Sempre tive muita vontade de
viver. O acidente e a incapacidade de
andar não me tiraram isto. Quando
melhorei, mesmo ainda sem andar,
passei a fazer a fisioterapia em outro
local, fora de casa. Meu marido
conseguiu a muito custo uma
ambulância que me levava e trazia.
Então eu pedia ao motorista
para, na sexta-feira, me levar a outro
lugar e me buscar na segunda, quando
fosse novamente à sessão.
E assim eu fazia meus passeios.
Ía para casa de minha mãe e também
para a casa das tias de meu marido.
Há sempre uma possibilidade de
se conseguir o que desejamos. Lute por
seus objetivos que você vai longe.
Apesar de ficar somente deitada,
estes passeios me faziam muito bem.
Via gente diferente, dava um descanso
a quem sempre cuidava de mim e não
pesava porque era somente um final de
semana, para quebrar o gelo e a rotina.
Conversava muito e o tempo passava
mais rápido.
As pessoas criam muitos rótulos,
mas quem vive é você, daí aceitar ou
não o que determinam a você é sua
responsabilidade.
Seja o que for que queiras fazer,
decida hoje e verás como, se
trabalhares duro para conseguir, o terá
feito no tempo necessário. Só depende
de você. Mas, para isto, tenha clareza.
Você não vai querer sair por aí falando
mandarim sem nunca ter estudado ou
visto algo falado ou escrito. Também
não pode querer fazer a faculdade se
não quer prestar exames vestibulares
ou ENEM. E também se a Marinha é o
sonho de sua vida não tem como
chegar lá sem alistar-se ou prestar
concurso para oficial ou aprendizes.
Enfim, tudo é possível ao que crê, mas
sua parte deve ser feita e não adianta
resmungar depois que tudo passa,
oportunidades, vida, juventude,
equilíbrio, força, juízo, raciocínio,
fortaleza, beleza. Tudo passa nesta
vida, só não passa o que é de Deus, de
Jesus Cristo e do Espírito Santo. Pai,
Filho e Espírito Santo, forças da
trindade eterna.
CAPÍTULO 15
AS VISITAS DOMICILIARES
Lembra como eu falei de que no
hospital as visitas eram super bem-
vindas? Pois é, em casa era do mesmo
jeito. Não esperadas, num horário X
como lá, mas era muito bom recebê-
Assim amava ter pessoas ao
meu redor e conversar, conversar,
conversar e conversar. Conversar bem
muito era o que eu mais gostava de
fazer.
Interrompendo um pouco o
assunto, quando não tinha visita ou
alguém para conversar eu lia ou
assistia televisão. Sessão da tarde
passou a ser meu objeto aguardado,
preciosos. Mas, depois de um ano,
praticamente assistindo todos os dias,
no ano seguinte, quase não havia o que
ver. Tudo repetido. Era o fim!
Voltando ao assunto das visitas
domiciliares, eram agradáveis e uma
surpresa para mim.
Recebi a visita de uma
representante da escola que eu estava
pretendendo ir me lotar. Achei muito
legal a diretora ficar sabendo do
acidente e mandar alguém me ver. Eu
não a conhecia e nem ela a mim, mas
mesmo assim ela o fez. Gostei da
atitude. Depois, quando retornei à
escola, já não era ela a diretora. Mas
um dia a encontrei e agradeci o que
tinha feito antes.
Outra visita que eu gostei muito
foi a de dois amigos que haviam
trabalhado comigo, um na SUCAM,
outro na ETTUSA. Ah! Foi muito bom!
Neste dia eu estava tão deprê e eles
iluminaram minha tarde. Levaram
frutas, umas uvas tão lindas, grandes,
macias e suculentas. Amei! Eles são
cunhados um do outro.
Interessante que, com esta
família eu me deparei com vários
membros em diferentes momentos de
minha vida.
Com 16 anos trabalhava na LBA
no CAMBEBA, uma UAC, ou seja,
Unidade de Apoio Comunitário. Ela
funcionava na Associação do Parque
Iracema, próximo ao Centro
Administrativo. Uma amiga convidou-
me a ir no ônibus que ia para lá todos
os dias e a mãe do meu amigo e sogra
do outro amigo ia comigo diariamente.
Foi a primeira que conheci.
Com 18 anos foi a vez do filho
dela, cunhado do meu outro amigo, que
trabalhou comigo na SUCAM. Depois
FUNASA.
Certo tempo depois trabalhei
com o pai dele e sogro do outro
naquela escola que a diretora mandou
alguém me ver e que depois voltei para
Atualmente trabalho com a filha
do casal, cunhada e irmã dos meus
amigos. E posso considerá-la uma
super amiga, gosto muito dela. Uma
das pessoas que mais prezo
ultimamente.
Acho tão legal esta história.
Sempre que os vejo, relembro. Acho
que devo encher o saco deles com isto.
Mas eu sou assim mesmo. Falo pelos
cotovelos em certos momentos e sou
super caladas em outros. Vai entender.
Outra visita que achei fofa foi a
da secretária do meu chefe da
ETTUSA. Os funcionários se juntaram e
montaram uma cesta e ela trouxe para
mim. Tantos produtos de excelente
qualidade e dispostos de forma tão
organizada. Achei legal a iniciativa e a
pessoa que organizou muito
competente.
A Nilza, vizinha de minha mãe,
levou-me biscoitos e passou uma
excelente tarde conversando comigo.
Foi ótimo!
A Francisca, minha comadre, foi
visitar-me, mas depois me confessou
que voltou para casa arrasada. Mas
enquanto ela estava lá em casa,
conversando comigo, nada notei.
Além destas, amigos, vizinhos,
companheiros do trabalho, conhecidos
e desconhecidos, parentes e tantos
outros me visitavam. Eu gostava de
todos, até de quem não conhecia.
Tinha gente que ouvia falar do meu
caso e queria conhecer-me.
Enfim, visite sempre que
possível alguém doente. Ela vai sentir-
se bem. Não ligue se disser algo
impróprio, ou estiver de baixo astral. É
assim mesmo. Mas suas palavras sem
pretensão serão de grande valia. Nada
de ficar se metendo se come ou não, o
que é melhor ou pior, ou o que deve ser
feito. Essa conversa é chata e já
estamos cheios de tanta gente dizer o
que fazer.
Converse sobre o que não tem
nada a ver. Se a doente tocar no
assunto ou lhe perguntar algo, aí sim.
Mas se não, leve a conversar por outro
ponto que não seja a doença, o que
levou a ela, o tratamento, ou as
sequelas. É muito ruim ficar repetindo
as mesmas coisas infinitas vezes.
Eu detestava quando mandavam
comer quando eu não queria e ainda
diziam: - Você não vai melhorar se não
fizer assim. Tem que se alimentar.
Aff! Hoje sou uma baleia de
gorda com 95 Kg e aí todos me enchem
com a assertiva: - Você tem que
emagrecer.
Que coisa! Ora comer, ora não
comer. Deixem que eu faço o que
quero e pronto. Eu sei das
consequências. Afinal, quem sente sou
eu. Isto não ajuda nada, só piora as
coisas.
Sabe, às vezes fico tão revoltada
que como só por birra? É porque
cansada tanto discurso.
Eita que hoje eu estou numa
total deprê e ainda lembrando estes
fatos. Há três dias fui ao médico que
disse que a tendência era de que eu
não andasse mais.
Depois de anos de tratamento,
voltar a não andar é o fim. Mas Deus é
maior e EU SEI QUE TENHO QUE
FAZER MINHA PARTE NO
TRATAMENTO.
ENTRE QUATRO PAREDES
CAPÍTULO 16
GENTE DO BEM
Amo muito minha família. Amo a
família do meu marido, que hoje é
minha também. Sou muito agradecida
por tudo que fizeram por mim e
continuam fazendo até hoje. São tão
especiais e super cuidam de mim.
Eu sofro com o que me
aconteceu. Mas, junto comigo, eles
sofreram e continuam sofrendo em
menor ou maior grau.
Minha irmã até perdeu o
emprego dela porque chegou atrasada
um dia por causa de mim. Ela não
podia me deixar sozinha, pois eu ainda
estava muito dependente na época, e
demorou a chegar outra pessoa para
ficar comigo. A chefe dela não
entendeu e a despediu. Como posso
pagar por isto? Nunca, jamais, em
tempo algum, nem a ela e nem a todos
os outros que, de uma forma ou de
outra, do seu jeito, ajudaram-me.
Há tantas pessoas que penso de
forma tão afetuosa por ter feito algo que
foi muito importante. Não tem nem
como avaliar, nem lembrar tudo de uma
vez. Já tentei terminar este livro livro
várias vezes e aí lembro de algo e
acrescento. Mas vai ter um momento
em que tenho que encerrar. Sei que
deixarei de contar muitos fatos, mas
não consigo dar conta de tudo.
CAPÍTULO 17
SOLIDÃO
Sinto-me muito só. Gosto de
ficar sozinha, às vezes, para pensar,
analisar o que devo fazer. Nem todos
me entendem. Não gosto de ter alguns
tipos de conversa.
Quando para e penso no futuro,
fico amedrontada. Se penso no
passado, imagino como poderia ter
sido. Pensamentos confusos. No geral,
nem penso no que aconteceu.
Simplesmente sigo vivendo e pronto!
Acho melhor assim, mas volta e meia o
acidente retorna porque meu corpo é
cheio de sequelas e aí tenho que falar
de novo e de novo sobre isto.
Praticamente todos os dias de minha
vida. E não há muito o que eu possa
fazer sobre isto. Também não vou ficar
recalcada e chata por ter que lembrar e
contar zilhões de vezes a mesma
história. Talvez agora peça para que
leiam este livro. Mesmo assim acho que
ainda terei que falar. Outras perguntas
surgirão.
Já vi muita gente começar a
chorar quando eu começo a falar. É
comovente! Não entendo bem por que
choram, mas choram. Eu, muitas
vezes, rio a valer, de mim mesma, do
que fiz, do que faço.
CAPÍTULO 18
PESSOAS ESPECIAIS
QUE SE FORAM
Quando criança ficava
imaginando como seria perder alguém.
Tenho esta mania de me colocar tanto
na pele do outro, real ou imaginário,
que, às vezes, passo pela situação.
Acho que chamo.
Foi assim com o acidente. Eu
andei bem próximo dele acontecer,
pensando depois que uma aluna me
comentou que traía o marido inválido
porque era jovem e não queria ficar
sozinha, em como seria ficar desta
forma, como o relacionamento reagiria.
Pensado, dito e feito!
E pensando também depois vivi
a morte. Primeiro minha tia, Toinha.
Depois tia Carminha, D. Conceição,
meu avô, minha avó e Camilo.
A tia Toinha viveu com muitos
problemas, por seu coração frágil. Teve
um bebê, mas ele não sobreviveu.
Faleceu muito cedo.
Tia Carminha levava-me para
missa, aos domingos. Plantou isto em
mim. Era tão bom! Oração, música,
Eucaristia e cheirinho de pipoca no ar.
D.Conceição era tia do meu
marido. Cuidou de mim quando não
andava nos finais de semana que eu ia
por lá. Gostava muito dela porque fazia
a maior festa com as coisas. Ela amava
muito criança e ainda ía ver comigo as
apresentações do meu filho.
Meu avô era todo meticuloso,
formal. Ele tinha uma gaveta onde
guardava suas preciosidades. Era sua
marca registrada. Andava sempre com
a chave ao cós.
Minha avó era tão sábia. A gente
nem queria ouvir. Pessoas novas nem
ligam e depois vão ver como estavam
certos os mais velhos.
E o Camilo, vítima do caos social
que estamos vivendo. Foi embora
super cedo. Lembro muito dele porque
um dia fomos ao cinema ver um filme
que ele nunca mais esqueceu. Só vivia
falando. E ele era criança ainda, mas
virou adulto e continuava falando no
filme. Assistiu mais uma centena de
vezes na TV e DVD. além disto era
muito cordial comigo, nunca me
destratou.
CAPÍTULO 19
Hoje ainda faço fisioterapia e
hidroterapia. Vou ao médico
mensalmente e tenho um medo danado
de voltar para a cama definitivamente.
Engordei muito e não tenho equilíbrio.
Mas sou muito agradecida a
Deus por todos à minha volta. Sou
cercada por muito carinho dos meus
amigos, um cuidado excessivo de
minha família e abençoada por Deus
em meus exageros.
Continuo lutando para ter meu
espaço e minha vida correr bem.
Hoje realmente tenho quatro
paredes interiores que me limitam, mas
quem disse que não há uma porta para
passar ou uma janela por abrir?
CAPÍTULO 20
DEPOIMENTOS
Sabia que chegou a hora de
publicar e ninguém entregou os
depoimentos que solicitei? Realmente
as pessoas não gostam de escrever.
Então fica aí um capítulo
destinado aos depoimentos, sem
depoimentos. Vai fazer o quê.
Mas não poderia deixar assim,
então solicitei de novo os textos e três
me responderam. Ricardo, um amigo
de infância. Neuda, minha irmã. E,
Dalvinha, também minha irmã.
Gosto de ler os depoimentos, a
visão das pessoas que conviveram
comigo. Elas consideram aspectos
diferentes. Entendem mais ou menos o
que aconteceu, algumas vezes mais
que eu, outras menos. Vamos então a
eles:
Depoimento de
Lindalva Siqueira,
IRMÃ
Tudo corria às mil maravilhas, mas
algo que mudaria o destino daquele
casal feliz mudou a história de suas
vidas. Em uma normal tarde de
segunda-feira o dia da folga dela não
conseguindo ficar em casa resolveu
sair e no caminho do seu destino
dentro do ônibus uma brusca corrida
fez o motorista passar por um buraco
e a alta velocidade o ônibus deu um
pulo e ela estava sentada na cadeira
de trás vindo a cair e naquele
momento ela sentiu todo o seu corpo
formigar e as pernas ficaram pesadas,
as pesssoas para ajudar a querem
levantar mas aquilo que parecia bom a
prejudica mais e a levam ao hospital e
ai vem o diagnóstico, ela fraturou a
coluna e quebrou 1 vértebra , e
começa o seu sofrimento: hospital,
dores, incertezas, dúvidas,
sofrimento e angústias, mas ela
permanecia forte apesar de tantos
acontecimentos dolorosos, era isso
que mais eu admirava nela, sua fé e
força que só poderiam vir de Deus,
murmurações nunca existiu, ali sim foi
um exemplo para mim de superação e
tudo que ela passou eu tinha que estar
perto e tirar boas lições de suas
atitudes pois existem gestos que são
melhores que palavras, e estas
atitudes me fez admirá-la ainda mais.
Deus, um ser soberano
estava no controle de tudo, glória a
Deus conseguiu organizar e com o
tempo tudo se ajeitou , ela conseguiu
voltar às suas atividades normais, foi
muito abençoada, ganhou uma bolsa e
foi estudar fora, na Espanha.
DEPOIMENTO DE RICARDO ABREU,
AMIGO
Fortaleza (CE), 20 de março de 2012.
Eu, José RICARDO Ribeiro de Abreu, 40
anos de Fortaleza – CE, casado com
Francisca Maria Silva Carvalho Abreu
43anos de Araioses - Maranhão, conheci
Francilangela Clarindo nas brincadeiras de
infância, minha esposa a conheceu na
juventude quando eu ainda nem
namorávamos, pois ela tinha muitos
irmãos, ela não participava muito das
brincadeiras, acho que era dedicada aos
estudos e também não gostava de brincar
com os homens, conheço ela também
porque o pai dela, o Sr. Francildo, era o
fotógrafo da área, ele tirava a foto de todos
da área e da minha família também, retratos
3x4, no começo da juventude ela passou a
ajudar a mãe dela, a Sra Fransquinha nas
vendas de Cosméticos, também pintava as
unhas de várias clientes. Começou a
batalhar cedo. Estudava muito. Passou em
concursos, acho que o momento mais
difícil dela foi quando estava trabalhando na
ETUSA, eu estava voltando do trabalho na
Dinel (Distribuidora de Bebidas da Brahma
na época), soube que ela havia sofrido um
acidente quando estava indo pra casa, pedi
pra minha esposa ir vê-la, pois não pude
visitá-la, e soube que ela estava no ônibus e
o motorista ao passar em uma lombada, ela
estava atrás e foi jogada até o teto, ao cair
quebrou uma das vértebras, muita tristeza,
ficou acamada por meses, e até foi
designada por médicos a voltar andar e ter
filhos, mas a fé dela era mais forte, uma
pessoa de família, religiosa, voltou a andar,
teve mais um filho, é professora, fez até
viagem para a Europa, lançou um livro, é
dedicada à educação de crianças e jovens.
Admiro-a muito. Espero que todos possam
usufruir da literatura de uma pessoa tão
dedicada.
DEPOIMENTO DE
FRANCINEUDA MENDES,
IRMÃ
Minha irmã sofreu um acidente feio dentro
de um ônibus e fraturou a coluna. Ficou
sem andar por um ano em cima de uma
cama fazendo tudo, tomando banho,
fazendo as necessidades. Com a força de
vontade dela, começou a fazer fisioterapia
e aí começou andar de muleta. Passou por
uma cirurgia. Graças a Deus hoje está
andando.
FRANCILANGELA CLARINDO
SUMÁRIO
Prefácio
Apresentação - Por que este
livro?
Capítulo 1 - Entre quatro
paredes
Capítulo 2 - Nasci
Capítulo 3 - E crescia
Capítulo 4 - O acidente
Capítulo 5 - No hospital
Capítulo 6 - Em casa (Coisa
boa!)
Capítulo 7 - Um ano depois
Capítulo 8 - Sexo
Capítulo 9 - Ambulâncias
Capítulo 10 - Internet
Capítulo 11 - Cuidados Pesoais
Capítulo 12 - Depressão
Capítulo 13 - Minha gravidez
Capítulo 14 - Meus passeios
Capítulo 15 - As visitas
domiciliares
Capítulo 16 - Gente do bem
Capítulo 17 - Solidão
Capítulo 18 - Pessoas especiais
que se foram
Capítulo 19 - Hoje
Capítulo 20 – Depoimentos
FRANCILANGELA CLARINDO
FIM