Minha caneta

Uma caneta é um apelo que não quer calar. É uma chama de insatisfação que incendeia as almas que vibram em simpatia. É arma que não mata, senão a mediocridade da falta de visão e a impassividade dos descontentes.

Minha caneta é a testemunha inconformada, ávida de letras que irão formar as palavras certas no momento oportuno, em que outras penas se calam e permanecem inertes, na horizontal e cheias de tinta imprestável e acovardada.

Quero, com minha caneta, fazer chegar aos confins do mundo a minha opinião, no lugar da ação proibida, do inconformismo que grassa e que obstrui a roda da democracia.

Minha caneta concede ao ignorante a antevisão do possível, a convicção da inexistência do milagre, mas da lógica da transformação das mentes que o tornaram óbvio. Concede ao sábio a visão maior que amplia o mundo que ele via restrito e limitado.

Quantas canetas são preguiçosas e não respondem à altura as injustiças do mundo! As palavras ditas se esvaem no tempo e são esquecidas. As palavras escritas constituem a autenticidade do que foi visto, analisado e devidamente opinado. Todas as penas unidas constituirão o auge da insatisfação e o começo da mudança.

Quando uma caneta se levanta e começa a sujar uma folha de papel, abre-se um mundo a sua frente; não há limites para a configuração deste mundo. Um universo inteiro e maravilhoso encontra-se ali pronto a ser desvendado. Cabe à mente dirigir a mão e alimentá-la de entusiasmo para que as mais belas idéias comecem a fluir e dar forma a este universo. O que resultou desta dança, desta tripla sincronia, está ali exposto e disposto a quem anseia algo mais. É um mundo novo, iluminado pelo brilho do olhar inteligente ou lançado na escuridão do esquecimento.

Escrever é mais do que um ato mental ou físico. É o resultado da ansiedade que oprime o peito cansado das tolices do mundo, da verborragia inútil, som sem ação, discursos repletos de intenções que deveriam estacionar na garganta de quem os profere e assim diminuir o mau cheiro da hipocrisia. Morte aos demagogos e vida longa aos que se calam, testemunhas da insanidade.

Por que é difícil a mudança? Porque a ação se perde na indecisão do inconformismo. Querer não é fazer. A covardia incomoda a uns e a outros acomoda. A inação vexa, mãe do desprezo. O que seria um exército, bela e eficaz conclamação, é resumido a nada, a uns poucos, cujas vozes alcançam o vasto e apodrecido terreno do despudor.

Louvado seja o homem que inventou a caneta. Abençoado o criador da escrita. Divina conjunção. Morre o escritor, sobrevivem as suas idéias. Em forma de palavras. Que podem mudar o mundo.

Fome do saber. Fantasmas invasores das bibliotecas. Vençam as traças que nos querem destruir. Não permitam a decadência de nossas folhas. Não permitam que adoeçamos, pois somos os únicos guardiões das palavras que vão eternizar as idéias dos que se foram. Vida longa nos concedam, pois precisamos alimentar-nos com sua seiva.

Professor Edgard Santos
Enviado por Professor Edgard Santos em 18/05/2016
Reeditado em 19/05/2016
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