Viver é perigoso?
Viver é perigoso?
Viver é perigoso? Simplesmente não sei. Viver é expor-se à realidade caótica do todo, nos expomos às coisas boas e às coisas más, entretanto viver, realizar a vida, é alguma coisa que entendo de forma mais neutra possível, como algo indiferente ao perigo, mas entendo que realizar o viver nos coloca sempre sujeitos a algum perigo. Entre o que creio que saiba, uma delas é que viver é continuamente caminhar para a morte, independente ou não dos riscos e perigos inerentes ao próprio viver. Por outro lado, também não posso afirmar que viver não seja perigoso. Com ou sem o perigo no viver, o “perigo” da morte é muito mais real do que todo e qualquer risco pelo perigo do viver. A morte é nossa eterna companheira, irmã siamesa, parte de nós mesmos, toda e qualquer trilha, toda e qualquer jornada a ela nos leva.
Ao nascer, filhos de uma improbabilidade incomensurável, e sem qualquer chance de mudar este “acordo” natural, estamos formalmente pactuados, todos, com a morte, pois dela ninguém escapou. Filhos de reprodução sexuada, todos do reino animal morrem, e não só eles. Mais ainda, até “deuses” morrem, de homens “deuses”, nem se fala, tiveram também de morrer, simplesmente porque a natureza, a biologia, não se importa com o nome que dermos, não importa se somos apenas humanos, “super” humanos, “deuses” que se fizeram humanos, ou porcos, golfinhos, águias, corujas, caranguejos, tartarugas, zebras ou aranhas, todos morremos, todos vamos morrer. Bilhões e bilhões deles, de nós, de todos, inclusive dinossauros e outros que não mais existem, morreram, muitos se extinguiram pela própria morte. Dos nascidos, todos, ou já morreram, ou estão a caminho dela, ser nenhum quebrou esta regra, este pacto natural, reprodução sexuada e morte.
Todos que ainda não morreram estão fadados a morte biológica. Pode até ser que o desenvolvimento científico e tecnológico venha a permitir, um dia, copiar, “baixar”, “backupear”, nosso cérebro, nossa mente, nosso circuito neural, para algum “equipamento” “bio-eletrônico” ou algum outro tipo de componente ou vida, e assim o ser pensante, aquele quem somos, o eu que nos habitava, poderá assim em um futuro incerto, passar a ser perpetuado em algo ente humana, mas de corpo natural biológico, não vejo saída, todos morremos ou morreremos. Isso não é rum, e nem pode ser sentido como algo que nos desconecte da dignidade humana, e já que estamos vivos, e como estamos fadados a morte, porque não, pelo menos tentar, construir uma jornada de vida pelo bem querer, pelo respeito à vida e ao natural, e assim pelo bem querer e respeito às outras vidas, aos outros viventes, e à própria natureza que tudo engloba, construir nossa experiência do viver como algo digno de exemplo para todos.
Entendo, ou creio entender, que o doloroso não é necessariamente viver, entretanto acordar para o nosso viver, “dar de cara” com o que somos, com o quem nós somos, pelo menos em parte. O choque inicial pode ser um tanto desnorteante, pode nos mostrar como frágeis, mortais, e muitas vezes desumanos, pode tender a nos despir de nossas máscaras, de nossas armaduras, e hipocrisias, e nos mostrar como estamos sendo, como estivemos a ser, em contraposição ao como nos víamos, e ao como acreditávamos que fossemos. A dor maior é descobrir como e o quanto podemos ser diferentes da imagem ficcional que construímos de nós mesmos, e o como podemos ser insensíveis, egoístas, exploradores, individualistas, apesar de podermos ter tido ao longo do tempo uma imagem de nós bem diferente disto, entretanto isto tem um lado bom, pois que enquanto vivendo imersos no sonho ideal do que deveríamos ser, do como nos víamos sendo, do como gostaríamos que os outros nos vissem, não percebemos o como realmente éramos e somos, assim, pouco ou nada podíamos construir, ou desconstruir, em nosso dia a dia para mudar aquilo que desconhecíamos, em nossa natural e anestesiada insensibilidade humana, ou em nossa adormecida constituição humana, ou por outro lado, não conseguíamos reforçar nossa “humana” natureza humana, nosso bem querer.
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