A Escuridão da Humanidade (O Primeiro Amanhecer)
Havia um tumulto, anoiteceu o primeiro dia...
Estava escuro ninguém podia ver o sol, ele caiu! Disseram os pragmáticos assustados...
Será que jamais veremos o dia novamente? O que faremos?...
Alguns gritavam que seria o Armageddon, outros disseram que viriam tempos difíceis...
Alguns choravam incessantemente, pois pensaram que logo em seguida viria o sono eterno...
Viriam as criaturas da noite devorar a todos?, Seria o apagar do mundo?...
Alguns procuravam soluções, talvez fazer uma fogueira grande o suficiente para durar a eternidade, outros criavam grupos de busca para encontrar o sol, afinal ele parecia cair próximo ao horizonte, não parecia muito longe; outros diziam que assim como ele surgiu não tinha obrigação de lá continuar, como veio se foi, deveríamos estar gratos, outros culpavam seus dogmas, outros derramavam seu próprio sangue a fim de pagar pela luz do sol novamente...
Houve guerras, muitos pensavam que o vizinho havia apagado o sol, outros pensavam que os gananciosos haviam tomado-o para si, estavam tão ocupados com suas teorias, com suas certezas, com suas desconfianças...
A noite seguiu...
Com os primeiros raios de sol revelou-se um novo dia, com ele a realidade, havia muitos corpos, os que se desesperaram morreram pisoteados, outros despencaram de penhascos por não saber onde ir em meio a confusão, outros foram carbonizados pelas fogueiras que fizeram, alimentaram as chamas tão desesperadamente que não puderam controlar o fogo que criaram, os grupos de busca se perderam e antes que pudessem encontrar o sol sucumbiram, outros aproveitaram o tempo que pensavam restar fazendo coisas absurdas e se matando antes que lhes tirassem as vidas, outros lutaram até a ultima força contra os que julgavam estar errados, igualmente como seus adversários, sacrifícios foram feitos aos milhares, mas não resultava no retorno do sol, no fim, dia amanheceu e a luz mostrou que os homens eram cegos não por falta da claridade, mas por falta de visão, não a que os olhos podem proporcionar, mas uma que nunca viriam a desenvolver...
Sempre tão desconfiados seus sentidos apesar de voltados para fora serviam apenas como testemunhas de suas próprias existências, bem como seus desejos e sonhos...
Talvez a noite tivesse vindo para ensiná-los a caminhar de mãos dadas quando surgissem as trevas, mas a escuridão mostrou-se mais forte, o medo, a ganância e a cólera no escuro pareciam maiores, invencíveis diante dos outros que infelizmente só são notados e compartilhados à luz do dia, quando todos estão vendo, aquele dia amanheceu, mas ainda estava escuro na humanidade, tem sido assim desde então...
Não percebemos a cegueira, pensamos que a luz rebatida por nossas retinas ilumina a escuridão...
"o que os olhos não vêem não sente o coração"
O que não enxergamos erroneamente pensamos não existir, ou ainda que os olhos enxerguem mudamos a direção do olhar, para evitar, apagar...
Mas não apaga, não redime, não resolve...
Há uma escuridão na alma humana que não pode ser clareada com qualquer que seja a luz, infelizmente...
Andamos por aí com olhos vendados nos dias de hoje, observamos nossos reflexos e seguimos em frente deixando tudo morrer, tudo secar, nossa existência é tudo que importa, e quando um lampejo mostra o que há na escuridão preferimos não ver, ouvir, sentir...
Aceitamos e logo apagamos as luzes naquele local e pronto...
Só não aceitamos que estamos cegos...
Que não conseguimos mais enxergar o rosto de quem vem, vai ou fica; quem precisa de ajuda, quem precisa amor, quem precisa aliviar a dor...
Morremos antes de nascer, matamos antes de ajudar, ajudamos quando não há mais o que fazer...
Pescamos peixes mortos e alimentamos esta sociedade hipócrita, egoísta e frágil...
Caminhando incessantemente tentando encontrar a saída, incapazes de ver que estamos presos em um circulo infinito...
Pensando ter a resposta para clarear as noites, mas incapazes de influenciar o sol...
Observando o mundo todo e ainda indiferente às necessidades de quem esta ao lado...
Sabendo o que vai acontecer antecipadamente, mas permitindo que aconteça exatamente como se de nada soubéssemos...
Com visão para enxergar a tela da tecnologia portátil, cego para o dia que acabou de acabar...
Hoje somos mais numerosos e mais solitários; menos solidários mais dependentes...
Eu ainda espero ver o dia de sol da humanidade, quando vão se levantar e olhar nos olhos um dos outros, perceber que a vida não acontece sozinha, que tudo está intimamente ligado...
O que você ou eu não pode fazer, juntos se pode...
Eu sei que no escuro também estou, mas este é um momento de lampejo, não quero esperar apagar a luz...
Minha lucidez talvez se vá com o amanha, mas espero me lembrar que antes de fechar os olhos enxerguei os humanos e tive vergonha do que vi, sem filtros do instagram, sem sensacionalismo barato de jornalismo-investigativo-entretenimentício...
Estamos longe, mas não sei se um dia já estivemos perto...
Mas espero caminhar na direção correta e quando não puder ver a luz, que não seja ela unicamente a guiar meus passos...