treze

A voz era grave. Não soava como pássaros quando cantava, mas cantava baixinho por timidez, ou pra baixar o tom talvez. Minhas piadas ou graças não eram de fato engraçadas, mas eu gostava como fazia parecer que eram, ou que talvez o riso frouxo, permitisse que fossem. Os olhos encolhiam ao sorrir na medida que o sorriso aumentava. Daqueles sorrisos retos, de menina que sofreu com ferro nos dentes e que se orgulha de agora poder mostra-los. A mão que por mais proporcional que fosse aos 1,73m, ia delicada ao rosto pra esconder o sorriso exacerbado, o que não era necessário sabendo ser contagiante. Os olhos lacrimejados ao cruzar o meu, dando a sensação de profundidade de um mar, como se a alma fosse tão profunda quanto. O jeito como virava o pescoço a um elogio, como uma criança inocente quando ganha um doce, tímida sem saber que "obrigada" seria o suficiente. A língua que tão macia delicadamente contornava meus lábios, como um batom que se permitirá borrar. O beijo que podia ser lento como gesto de desculpa. O beijo eufórico transbordando desejo. O beijo salgado da lágrima que escorre. A respiração ofegante e o corpo trêmulo pra falar de amor. O peito pequeno que se permitia deliciar com poucas lambidas. A nuca frágil que causava cócegas. As costelas sensíveis que permitiam o completo arrepio.

A lembrança de algo que nunca soube se existiu.

Patrícia Campanholo Pereira
Enviado por Patrícia Campanholo Pereira em 19/02/2016
Reeditado em 29/03/2016
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