A tristeza, o pensamento e (Eu?)
"Será eu meu próprio inimigo? Não sei. Porque perguntas o que já sabe? Há mais de um aqui? Parece que sim"
Estou triste hoje, como nunca estive. O que me causa tamanho pesar são meus pensamentos. Nem sei mais se são meus pra falar a verdade. Pensar cansa e de nada vale. Pensar é destruir-se.
Observando, percebo que há dois tipos de pensar: o pensar involuntário, que está criando esta tristeza em mim e acontece sem a minha permissão, e o pensar construtivo, voluntário, que pensamos quando queremos realizar uma determinada atividade, como estou fazendo agora. Transito entre um estado e outro enquanto escrevo. O pensamento involuntário vêm quando quer e não quando eu quero. Não escolho lembrar do que me deixa triste...
Não quero pensar e quanto mais insisto nisso mais atividade mental eu tenho. Percebo que o próprio "não querer" já é um pensamento, uma negação que o pensamento faz para fugir de si mesmo. Quando estou triste, como agora, qualquer resposta que eu der para o sofrimento será uma forma que o próprio pensamento que criou a infelicidade usa para se justificar. Este texto, por exemplo, é um misto de justificação e negação. Uma mentira. Engano a mim mesmo escrevendo, me perdendo entre observação e pensamento. Tudo muda no momento em que eu julgo, portanto uso a arte de escrever para estudar-me.
Quanto mais eu penso mais fico triste. A emoção, a tristeza, surge quando julgo tais pensamentos como coisas que não deveriam ser ou ter sido. O julgamento já é um pensamento. Não há escapatória conceitual. Só aceitação absoluta liberta.
É tudo uma questão de percepção, a ideia de quem penso ser está direcionada para o "eu" ou "eus" históricos que vivi, as eternas máscaras que interpretei ao longo da vida. Minha atenção está totalmente voltada para o estímulo mental, por isso esses pensamentos ainda me ferem, e insistem em cutucar feridas que já foram cicatrizadas, pois estou identificado com eles, com meu passado, com uma história que foi e já não é mais. Não sou o que penso, nem aquele que pensa. E mesmo assim penso. Tudo está acontecendo, é a vida fluindo neste momento.
Ainda não tenho o amor próprio como o maior objetivo da minha vida.
Sinto-me angustiado, ansioso, com medo, cheio de pensamentos negativos. Vejo o risco, sei para onde me guiam, mesmo assim eu vou pelo vale absconso das ideias. Mas... eu quem? Se eu, neste momento de tristeza, sou apenas um reflexo dos meus próprios pensamentos. Uma negação de mim mesmo. Eu deixo de existir como ser para existir como sendo - alguma outra coisa que não sou neste momento.
Se sou já meus pensamentos onde estou em mim se o que penso não sou eu quem pensa?
É...
Pensar não leva a nada. Só faz nascer mais pensamentos.
"Pensar é não compreender" ___Alberto Caeiro
Cada pensamento reflete uma emoção, e que devolve aos pensamentos a mesma "energia" gerada por eles, só que numa intensidade maior, dado que a emoção é uma reação química, mais próxima e mais física, e consequentemente gerando mais pensamentos saudosos. Minha atenção está desfocada, está direcionada aos pensamentos que me contam a narrativa da história vivida por "mim" "eu" ou "eus" e passo a ver a vida pelo crivo dos meus sentimentos e pensamentos.
Pensar é iludir-se.
Por que diabos a mente rediz para si mesmo um fato que já ocorreu e que possui totalmente conhecimento sobre ele? Por que repetir um disco que já não toca mais a música inteira porque está riscado de tanto tocar?
O sofrimento deseja sobreviver, mas, para isso, precisa conseguir que nos identifiquemos inconscientemente com ele, gerando mais sofrimento e nos prendendo na roda existencial do mesmo. Quando o sofrimento toma conta de mim, ele cria uma situação em minha vida que reflete a própria frequência de "energia" da qual ele se alimenta, e isso se dá mais claramente nos conflitos com as pessoas. Pois o problema do homem é o homem. Sofrimento só se alimenta de sofrimento. Crio meu sofrimento e de outros. Alguém precisa nos dizer que estamos loucos?!. Vivendo com um torturador na cabeça?! Conversando - com quem? - em segredo dentro de nossas mentes. Se pensássemos alto, como dizem, expressando os pensamentos em palavras, todos perceberíamos que estamos loucos, como ver uma pessoa na rua balbuciando uma série de coisas sem sentido. É que o pensar compulsivo é cada vez mais natural em nosso tempo. E não é. É uma insanidade. Assim é nossa mente.
A mente é um hospício onde todos os loucos escaparam
E como não se identificar com os pensamentos? Observando. Já o sei. (Mas preciso dizer. É um texto que escrevo como fuga e estudo de mim mesmo). Precisamos reconhecer que pensamentos são apenas formas transitando no espaço da consciência, e assim, podemos ter vislumbres de nós mesmos como intérpretes e espectadores. Isso quebra a identificação com os pensamentos, e a percepção fica voltada para si mesma, num "lugar" além dos pensamentos. Onde só há silêncio e sentido...
"Sentir é pensar sem ideias, e por isso sentir é compreender, visto que o Universo não tem ideias. O sentimento abre as portas da prisão com que o pensamento fecha a alma" ___ Fernando Pessoa
Quanto mais fundo vou nisso mais vejo o rastro do germe que criou toda má interpretação da vida. Ele está em mim e em você também.
Estou triste não porque penso nisso, e sim porque acredito que estou triste. Temos uma forte crença no "eu" que criamos como se estivéssemos por trás de nossos olhos a espreitar o mundo e julgá-lo conforme nossos medos e desejos, como se fôssemos existentes si mesmos, substancialmente independentes de nosso própria vontade. Ilusão gramatical. Vivemos como almas num corpo. Ainda somos crentes demais para duvidar.
"Lembrança que causa saudade, saudade que causa nostalgia, nostalgia que causa impotência, impotência que causa vitimismo, vitimismo que causa a injustiça, injustiça que pede justiça, justiça que pede a guerra, guerra que pede a paz, e a paz pede o silêncio que você não faz"