Ignorância e conhecimento não aplicado: uma estória

Diz o dito popular que ignorância é uma benção. O conhecimento, com efeito, pode se tornar perigoso. Thoreau disse em Walden que “ um livro pode mudar a vida de um homem”. Sempre para melhor, me pergunto? Narrar-vos-ei, então, uma estória:

Havia um camponês, muito ignorante e humilde, que todos os dias depois do trabalho, conversava com Deus. Este homem era dado a todos os tipos de vicissitude: bebia, fumava copiosamente, e com frequência ia à taverna para cortejar meretrizes. Apesar disso, seu nome ainda constava no livro do reino dos céus: Deus sabia que a ignorância daquele homem vinha de berço e não podia culpá-lo por isso.

Numa tarde qualquer, ao volver do trabalho, o camponês deparou-se com uma velha encostada numa árvore, com toda sorte de coisas em seu saco, exceto comida.

_ Dá-me de comer_ suplicou a velha. _ Estou faminta!

O camponês, como estivera trabalhando numa colheita de inhame, tirou uns da algibeira e deu para a macilenta mulher, que muito contente replicou:

_ Deus te abençoe! Dar-te-ei esse livro, o qual detém o elixir que remedia toda a falta do saber.

O camponês tomou o livro, colocou-o em seu saco e rumou para casa. Todos os dias, enquanto retornava do trabalho em sua carroça, o camponês punha-se a ler os sagrados ensinamentos da recém-adquirida escritura: Aprendeu a sobriedade, a temperança, a humildade e o altruísmo, além de outros atributos tão essenciais à alma do homem. Não obstante, o camponês continuou a beber e a visitar a taverna, sempre com seu cigarrinho na boca.

Certo dia, o camponês, ao voltar para casa da lavoura numa noite sem luar, caiu numa ravina e pereceu. Ao chegar ao reino dos céus, Deus disse:

_ Estava-lhe assegurado um lugar ao meu lado, mas quando foste dado o manuscrito sagrado, aprendeste as virtudes, mas não as praticaste em tua jornada. Volta, então, para o mundo de onde vieste.

Moral da estória: menos perniciosa é a ignorância do que o conhecimento não aplicado.