==um mundo de promessas quebradas.

Todo passo nos aproxima do desconhecido.

Cada momento é um prenúncio ao fim, misterioso e lúcido.

Louco e breve.

Infinito.

As horas esvaem-se, descem por essa ampulheta que não podemos virar. O último grão de areia, pequeno e quase insignificante, cai. Cada grão parece inútil, despencando despercebidamente, até juntar-se aos outros grãos. Mas cada um deles, enquanto caía, tinha uma história. E, ao se agruparem, deu-se a vida.

Deu-se a vida.

E acabou.

Nunca se sabe quando será a última vez. Não nos concederam a previsão do último olhar, a vidência do último sorriso, tampouco a consciência de um último abraço.

Qual palavra selará a vida, tal como uma carta concluída?

Fim.

Nunca se sabe quando.

Eu ouvi pela última vez.

O som dos nossos passos apressados batia pelo chão molhado e ressoava em meus ouvidos, girando pela atmosfera. O mundo era mais azul quando ele estava nele. A vida sorria mais, porque a risada dele era como música. Uma gargalhada feita em escala musical, em semitons e sustenidos.

Eu vi pela última vez.

As covinhas infantis, o olhar ingênuo, os dedos enlaçados. Prometeu-me uma estrela, sem saber que iria dançar entre elas. Quando olho para o céu estrelado esta noite, penso que, talvez, ele não encontrou o caminho de volta.

E minha estrela?

Eu terei de buscar? Quando?

Não se sabe.

Ele me abraçou e me perguntou: “Como você está?”.

“Bem e você?”

"Vou ficar", ele disse.

E ficou.

E foi.

E voou.

Agora, quando olho para o mundo, sinto um vazio. É como se faltasse uma peça, como se algo não estivesse totalmente certo. A verdade é que morremos um pouco, cada dia, cada hora e minuto em que algo nos falta.

E sempre nos falta.

Hoje, me falta sorrisos, daqueles que não estão mais aqui.

Faltam-me abraços que não dei, mas como eu poderia prever o que viria?

Falta-me tanto.

E faltando-me, a vida segue, sempre tirando um pouco mais, sempre levando outro pedaço daquilo que me forma, do que me torna alguém. Sempre falta um fragmento do coração, ou um suave brilho que se apaga do sorriso.

As horas vão.

Os dias somem.

As horas passam.

As pessoas se despedem.

Falta-me um tanto.

Transborda-me outro tanto.

E nessa estrada gasta, mal pintada, margeada de flores, entre uma curva e outra nós nos encontramos. Pegamos caminhos errados, mudamos a rota na esperança de chegar a algum lugar melhor, sem sabermos que nunca saímos um do outro.

Nosso lugar compartilhado é um coração cheio de medos tolos, desejos vívidos e sentimentos inexplicáveis.

Um coração que bate por dois.

Agora caminhamos de mãos dadas, cabelos ao vento e uma vontade inebriante de viver aquilo que ainda não vivemos. Quase não recordamos do passado, apenas olhamos adiante.

Ainda não quero ver o início do túnel, que espera no final da estrada.

Se eu pudesse te dar todo o meu amor, você se tornaria eterno?

Não me importa se o tempo passa ferozmente, desde que eu passe com você.

Não ligo se nunca saberei quando será a última vez, desde que a linha do destino ainda nos ligue até o final.

E por mais que a vida seja dura, que dure o tempo necessário.

Que permanece em você aquele azul que nunca se apaga.

Você seria eterno

Você jamais diria adeus

Você ficaria aqui

Ana Luisa Ricardo
Enviado por Ana Luisa Ricardo em 03/01/2016
Reeditado em 03/01/2016
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