ENTERRANDO VOCÊ
Suas implicações escorrem sob meus dedos como areia. Nada que você tenha feito chegou a me surpreender, nem mesmo a frieza ariana que sai dos seus olhos. Nenhuma de suas amizades significou algo pra mim, não amoleço diante de gentilezas sociais, sou ligadíssimo nos detalhes, inclusive na umidade de bocas recém-beijadas, meu bem.
Suas viagens sem mim jamais serão animadas, jamais terão o brilho que só eu posso causar em vidas mansas, Ninguém vai escrever tanto sobre você nesta vida, nenhum homem será capaz de literalmente dar o sangue e economizar orgasmos por um sorriso seu. Por muito tempo, achei que eu estivesse vivendo pelas beiradas, no mais profundo medo humano, rastejando feito inseto em banheiro público, depois me dei conta que eu estava muito alto. Alto demais pra enxergar pessoas como você. Alto demais pra viver relacionamentos com quem não sabe voar. Hoje vejo, com meus próprios olhos, que você sempre esteve no chão, abaixo dos meus pés, abaixo de sentimentos tão belos que achei que pudesse oferecer.
O senhor nunca teve decência pra receber amor de gente, nunca soube desfrutar do cinema particular, da trilha sonora e das personagens que só eu sei criar. Te coloquei em um mundo cujo qual você não era fluente no idioma, viu tudo sem significação, desajeitou pontos certos, fez suicídios desnecessários enquanto eu matava sentimentos inimigos.
Os jardins continuam me cercando, ainda tenho a flor que você me deu, mas sua presença não se faz mais presente, te enterrei com esmero, chorei muitos calendários e, depois, ressuscitei sua alminha fugaz pra infringir as leis do mundo dos outros, te dei passagens, hospedagem e educação de qualidade. Agora, depois de viver no mais raro estado humano, visto vermelho e saio para dançar com os homens que ainda me permitem sonhar.