Sou tudo aquilo que se foi

Eu sou como um datilógrafo na modernidade

Um alfaiate frente à indústria

Um sapateiro, um engraxate

Democracia nessa atual sociedade

Sou como um livro em uma página de e-books

Como uma vassoura ao lado de um aspirador

Sou como panela de barro entre o inox

Sou como vela ofuscando a luz

Sou como fogo de lenha frente ao fogão

Sou uma ferramente entre os maquinários

Sou bossa nova na balada

Sou diferente entre vários

Sou moldura aguardando uma fotografia rápida

Não sou obsoleto,

não sou antiquado,

não sou aquilo que digo que talvez possa ser

sou excêntrico até onde a modernidade não implique em me copiar

Eu gosto da calma

gosto daquilo que se lapida, sem alarde

eu gosto da conversa mansa

e da atitude promovida pela urgência da vontade

gosto do pouco que ainda se tem

mas não foi esquecido

está nos poemas

e no rodapé daquela casa de sonhos

naquela manhã morna de apelo ao sossego

no pó da lua do primeiro homem nela a pisar

sou poesia

poetriz

rabiscando com toco de giz

num quadro feito

para canetas molhadas