30 mil anos-luz
Silêncio... Sopra um vento, como sensação originária de momento, que me força um novo olhar. Que é para longe.. É para além do fim do horizonte, que agora já esconde, enquanto me comprime a fronte, nesse provocar...
Mas, vem... vem da noite... Vem intensa e rápida em minha direção... É uma nova compreensão de atmosfera... É diferente e misteriosa... Aproxima-se grandiosa e me encobre, enquanto apenas noto seu sobrevoar... Nesse momento há domínio pleno sobre minhas perspectivas...
Lentamente ela se abaixa, como se quisesse tocar a terra... Vasta e em detalhes de infinito, suavemente se estabiliza... De soslaio, ouso-me a examiná-la e vou ao encontro da leitura de todas as coisas que, sempre fui capaz de enxergar, como os traços, os cúmulos, os nimbos, as cores... Era contemplação...
Mas, inesperadamente, em absoluto princípio de firmamento, ela sutilmente se abriu e me olhou... e olhou-me... Olhou-me bem dentro das infinidades do meu observar... Foi como luz que escapou por uma pequena fresta naquele instantâneo triunfante de céu.... Foi o olhar mais surpreendente e enigmático que já havia percebido... Era como se, nele houvesse um chamar... Um decifrar...
Eis que, o olhar perdido que vagava como alma, se encanta com um transmudar que lhe devaneia a ideia calma e ali, ante a inércia apática e vegetal, cujos sentidos ou sua falta nunca importam, atrevi-me a tornar viva a ampliação das possibilidades de todas as curiosidades aflitas das espreitadas nos movimentos mais secretos e fui...
E com a força de um astro, que passa, e de arrasto, te puxa, suga e empurra, soltei-me naquele ar e, lá dentro, fui vento...
Mas, nele havia um sinal... Tal qual, segredo que jamais se revela; Como um recôndito da vida; Como se houvesse de manter-se incógnita...
Superado o desvão, era a vastidão... Era um canto afastado de mundo, inexplicavelmente distante e profundo... Lá por onde quem se esforça e se atreve, sofre.. onde quase ninguém passa... Lá onde não se imaginam os raciocínios das coisas; onde nunca o alcance se chega... Onde dá vontade de parar e descansar... Onde não há como não se entregar... é como se perpetuasse à paz... Lá onde se causam inveja às cores; Lá por onde o tempo se estende em eras... Onde há refúgio do vazio implacável, onde se dominavam as cores e as dores; onde não se cabe admitir; onde se escondem as expectativas; onde se fixam as calmas e nascem as lágrimas...
É um espaço tão longe que, não se cravam as certezas de localização; onde se estendem os braços dessa galáxia; Lá no berçário de todas as estrelas... E onde há um receio delas... das estrelas que vivem na mente, que escorrem e lhe pesam os ombros, onde se agarram, rasgam, alucinam, angustiam e lhe sangram...
Ainda longe da compreensão ouso-me a questionar e anuncio-me, com audácia, em sereno “não”... Eis que, se desdobram as tempestades; se avermelham as têmporas de trovão; como raios que lhe saltam os poros; relâmpagos que se contorcem e lambem os lábios em fogo, e um desespero lhe que consome e cega, deixa-se em vento que rodopia e se vai marcando o silêncio de nova interrogação... Penso: Como um segredo tão profundo foste caber naquele olhar?
Mas, havia um acalento no pequeno sorriso da lua... Havia um conforto na felicidade de se enluarar... Havia garra! Havia querer... Havia mais que um sentir... Havia uma eterna esperança na força maternal de seu amor lunar...
Um mundo simplesmente complexo... Onde quase tudo é tão longe e tão perto... Ainda nem sei como pude adentrar... Acho que em mim já havia um roteiro daquele céu. Como se ditasse um rumo pra vida... por poder desfrutar daquela vista, a olho nu, sem lentes ou véu... Adentrando por constelações; cruzando as estrelas e nebulosas, em aventuras extremamente duvidosas, das infinitas galáxias de tentações...
Mas, no meu sofrear já havia desistência... Não conseguiria ir e voltar, com tantos furos. Lamentava a mim mesmo, não ter fôlego, para resistir até as curas. Pois, não fui o provido de ares para suportar as maiores alturas...
Embora já vagasse perdidamente, tentando ainda acreditar nas mentiras que contava ao meu desastre... Eis, que num suspirar existencial de um sentimento que nunca se espera, deu-me sua carta celestial traçada para durar por uma era... E da forma mais inesperada e sublime, me concede um “relevar” que enobrece, enaltece e acalma... Então, minha poesia quase morta, viveu, e outra vez, me purificou a alma...
E num abraço, capaz de reunir todos os mundos, contos, cantos, encantos de constelação, consigo sentir no centro da galáxia mais próxima, o mais perfeito pulsar de coração... Então, aconteço num sopro suave de vento que me embala, como ósculo deixado na ponta do último degrau de um abismo sem fundo, pensando no interminável e eterno mergulho, olhando a face daquele mundo, enquanto uma vontade se mata... Então, sorrio e volto... Ali deu vontade de nascer de novo...
Hoje, e tão somente hoje, na felicidade desses 30 anos-luz, consigo entender que, ainda me dou às complexidades das atmosferas, mas nunca houve tanta essência, beleza e energia nas profundidades daquele olhar...
E se alguém, que souber decifrar sinais, desejar desvendar esse mistério tão perfeito, complexo e profundo, vai ter que viver o que vivi, para encontrar a imensidão do paraíso que o espera... Mas, antes, vai ter que romper as barreiras daquele céu mais lindo, raro e absurdo e ficar mirando o maravilhoso fim do seu mundo, de dentro dos olhos dela.