Natureza, assassinato e redenção
Normalmente eu tenho a felicidade de poder desfrutar de um almoço diário na casa da minha avó. E diariamente convivo com aquela que está próxima de ir embora para sempre. E curiosas coisas acontecem. Passo a relatar a última marcante.
Quando estava namorando Cinthia, uma daquelas pessoas boníssima que por algum motivo que não se mostrou a coisa não deu certo, um fato marcante foi quando estávamos passeando pelo Campo de São Bento e eu propositadamente pisei em uma formiga.
Aquilo foi motivo para um papo mais sério e incisivo de sua parte dizendo que era errado matar assim os animais. Eu logicamente logo perguntei se o que conta é você matar ou matar propositadamente. Pois ao andar, normalmente, acabamos por pisar e destroçar milhões desses insetinhos minúsculos. Ou ao comprar detetizantes caseiros dizimamos milhares desses seres, mas justifica-se que é pela proteção de seu patrimônio. Seja lá como for, se eu quiser pisar em uma formiga porque senti vontade isso é o cúmulo do ímpeto assassino e está errado. O que nos diz muito de nossa moral. Pois o que vale é a intenção.
Corta a cena e focaliza nos dias atuais. Estava sentado na mesa comendo meu almoço, que geralmente é delicioso, cheio de verduras, legumes e carnes, quando avisto uma espécie de minhoca amarela perto da alface. Como era o único na mesa, havendo minha avó e minha mãe já almoçado, eu não ia indispor ninguém com o que minha avó certamente faria nesse caso, bater boca com a empregada em prol de uma próxima lavagem mais atenta da famigerada alface.
Lembrei-me do caso que ocorreu com Cinthia e por um momento de piedade divina eu me comovi com aquele bichinho amarelo rumando aleatoriamente na toalha da mesa, perdido e fora de seu habitat natural. Foi então que pensei em pegá-lo e colocá-lo em um vaso de plantas que havia ali perto. Ele era grande e comportava uma planta de porte médio, imaginei que ali naquela terra a minhoquinha iria achar lugar para sobreviver bem.
Eu a coloquei na terra, ela que estava ligeiramente protegida encolhida, balançou ligeiramente a extremidade que estava para o ar e começou a, na minha humilde imaginação de ser humano, se sentir em “casa”. Qual foi minha surpresa que em menos de 3 segundos, ou 4 o que importa de fato é que foi bem rápido, uma aranhazinha pequena saiu como que correndo de onde estava e atacou a minhoca. Mas foi com um ímpeto tal que pensei fosse uma aranhazinha de ruanda, que não presenciava uma minhoquinha amarela suculenta havia anos. E assim, estarrecido, eu presenciava a aranhazinha preparar a minhoca que demorou uns dois minutos se contorcendo enquanto o veneno da aranha não fazia efeito.
Assim a natureza, e o acaso, providenciaram que meu ato de bondade não tivesse sido com a minhoca, mas sim com a aranha de Ruanda. Mas a minhoca continuava morta. Foi uma boa ação, mas o sentimento foi de derrota.