Vertigem.
A sociedade insiste, desde os primórdios, a chamar essa gastrite que sinto, essa fadiga e esse sentimento plural de apatia com a falta dele, esse enrubescimento e esse vomito delirante, como quem não quer, mas como alguém que não consegue ficar sem, tirando toda a dor, o medo, o temor, a saudade, os choros incuráveis e infinitos – tudo isso eles simplificam numa única palavra: amor. Esse desespero imenso e incansável, essa morte, mas em vida, como uma morte-vida, um morto-vivo, alguém que está vivo, mas não vive mais.. Talvez! Quem sabe quando essa encruzilhada se desfazer – que ironia idiossincrática -, quando esse dia finalmente chegar, voltemos a aprender o que é isso que eles chamam tão inocentemente de amor. Oh, e que morte mais doída. A falta de potência não é basicamente maleável pelo Eu que comanda. A raiz dela é maior. Alguém em mim entristece com algumas coisas e se alegra com outras. O Eu – outra palavra tão inocente -, ”pelo menos alguém em mim” consegue, no mínimo, vislumbrar essas vibrações afetivas, como tiros de tanques de guerra que, mesmo após o tiro desenfreado do destino e do acaso, a bala chicoteia e continua firmemente a rondar pelo oco espaço, até enroscar-se em algo. A bala, portanto, continua, mesmo depois do tiro e do som estridente inicial. Isto – e talvez de modo também arcaico e superficial, denomino alma. O espírito é essa continuação duma parte do espaço entre dois pontos fixos; o tiro, ou seja, o choro que nasce, e o enroscamento da bala num ponto crucial e fixo, ou seja, a morte. Entre este meio tempo encontra-se o tão prestigiado espírito, indo de lugar algum para lugar nenhum, partindo de um explosão – nada mais científico – para um, talvez, pedaço de terra ou areia? O espírito aqui é aquele algo que continua em frente, buscando cada vez mais espaço, cada metro por mais metros, cada centímetro e milímetro por mais centímetros e milímetros, até algo que inequivocamente o pare. Finda a sua jornada oca de dois pontos fixos e únicos. O estranho é que, mesmo assim sendo, esses espíritos, essas balas contínuas de vida, esses precursores do espaço, eles todos se identificam de tantas formas e jeitos infinitos, que é quase impossível denominá-los como alguém, pois tão logo encontram-se em vida, acabam se sujeitando à únicas certezas possíveis, ou seja, a busca pelo fim. E, de tão rápido saltam para o mundo em direção ao nada, encontram-se sujeitados aos temores e ressentimentos da tão temerosa autodestruição. Eles não a aceitam. Eles não a querem. E, por viverem pouco e não conseguirem desenfrear os moldes contínuos, empurram-se uns aos outros para frente, para trás, para os lados e para baixo, até encontrarem onde não precisarem mais continuar. A tristeza, ou seja, a vida, para eles não vale nada. Esquecem-se que é a partir dele, da tristeza, ou seja, da vida, que têm a chance de serem também felizes – não que seja ela o fim em si, ou a vida em si, por ela. O amor! uma palavra que não diz quase nada da imensa carga de sensações, afetos e pensamentos que este pulsar representa, talvez seja ele o impulso do tiro à contínua flutuação – por mais que doa, por mais que entristeça e acarreta desgostos e desesperos -, o amor serve para aqueles que sabem que todas essas sensações são intrinsecamente necessárias, e, portando, ao invés dos ressentidos e mortos-vivos, buscam eles a continuação da loucura existencial em nome dela (da vida). É estar louco querer continuar em vida, sendo ela cheia de males e atrocidades das mais variáveis, mas aceitá-la como é demonstra nobreza e, para estes, e somentes a eles, que existe o amor.