Nas profundezas do EU...
Abro a porta do banheiro, um vento quente esbofeteia-me a face, minhas roupas são arrancadas do meu corpo, aquele vento quente puxa-me com força, minhas mãos firmes agarradas nos marcos da porta, minhas pernas flexionadas tentando ajudar-me a não ser de certa forma sugado para dentro ou para fora do que não consigo enxergar, abro os olhos e não vejo o meu corpo, não sinto o cheiro de nada, aos poucos começo a ouvir vozes de todos os tipos, mas só vejo formas etéreas .
Vendedores,mercadores,feirantes sem formas, nas bancas e tabuleiros, corpos de pessoas de diferentes formas, animais , insetos .
Aos poucos começo a entender o que eles diziam :
____Aproveite madame, oriental de vinte e cinco anos, budista, viveu dentro dos costumes religiosos, cento e seis quilos de pura força .
____Mas está faltando um braço !
____Ora madame , eu faço um desconto.
A cada passo que dou ouso atentamente aqueles vendedores e compradores negociando :
____Olha a promoção, corpo de criança de oito anos leva junto nené de um ano e três meses.
____ Borboleta fresquinha, leva duas larvas junto .
____ Mulher velha de setenta e cinco anos com mais só três meses de vida para quem quer dar só uma passeadinha .
____Homem promíscuo quase de graça leva um pombo mergulhador.
E as ofertas continuavam, cada vez mais fervorosas e a angustia que eu sentia, misturava-se a uma raiva em ebulição.
Paro na frente de uma barraca onde a placa como levada pelo vento não parava de se mexer, me aproximei... Está escrito em hebraico :
____ “Conserta-se”.
Entrei e senti um odor característico de flores do campo, o barulho de uma cascata, canto dos pássaros, olhei para o chão, a relva verdinha não escondia as formigas carregando pequenos grãos, o sol ameno e um leve vento refrescante, a minha frente uma cortina branca no que a ergo vejo uma enorme mesa cheia de “peças” , pedaços humanos , e vejo uma criança perguntando para aquela energia:
____O meu papai tem conserto?
____Olha menina , ele atirou no próprio ouvido, posso colocar outro, mas não garanto que ele não vai ficar surdo ou louco .
____Mas arruma ele igual, eu estou com saudades .
____Então espera ali do lado sim .
____E para a senhora madame ?
____Eu abortei !
____Como à senhora fez ?
____Com uma agulha de tricô.
____Dói muito ?
____Profundamente .
____Bom, sinto muito, para esse tipo de caso vai ter que esperar umas cinco vidas, a fila é grande.
____Mas dói muito !
____Sinto muito minha senhora .
Olho para aquela banca , pilhas e pilhas de pessoas mutiladas, agonizando, e fico pensando onde estou afinal .
Sinto alguém chegando ao meu lado :
____ E para o senhor ?
____ Não ... Eu não quero nada
Nisso o outro que estava “consertando” me diz com uma vós áspera :
____O que tu procuras não está aqui meu amigo, por favor, se retire .
Ando de costa e sem querer tropeço num corpo que estava no chão, caindo dentro dele , olho para as mãos e sinto frio, já não enxergo mais nada, apenas uma rua deserta, carros estacionados, casas com portas e janelas fechadas, as árvores podadas, o lixo nas lixeiras da rua a serem recolhidos, as lâmpadas dos postes começam a se acender lentamente, ao longe um velho de bengala vem em minha direção e com uma aparência repreenderá me diz :
____Vá vestir uma roupa rapaz , o que pensa que está fazendo?
Olho rapidamente para o meu corpo estou nu, me viro rapidamente e saio correndo quando paro com a minha respiração ofegante com as minhas mãos nos joelhos sinto uma dor excruciante na minha perna esquerda que leva-me ao chão e sinto algo pegar no meu pé esquerdo e me arrastar , e uma dor tão forte quanto a primeira na minha cabeça como se o meu cérebro estivesse sendo arrancado, quando me dou por conta estou de volta naquela barraca :
____ Vamos saía daí, este corpo não é teu !
____ Eu senti uma dor muito forte, e estive numa rua...
____ Tudo bem ! ____ Tudo bem !
____ Que dor foi essa ?
____ Nada, eu só arranquei a consciência dele, ou tua .