Fim

Um bloco de papel, uma caneta, a procura do melhor lugar para dissertar um desabafo, aconchego; esse barulho incessante e irritante que há dias não dá trégua, a busca de uma trégua para minha luta interior e, acima de tudo, uma necessidade represada de transbordar em palavras todo o sentimento confinado em mim. A recusa às metáforas que, metaforicamente se traduz na recusa à superficialidade costumeira de minhas antigas escritas. É assim que aqui vou me expor, exteriorizar a recém-adquirida percepção de mim mesma, do que (des)construí da minha vida até agora.

Perdi um grande amor por tê-lo agora morto dentro de mim. Sua perda não me deixou vazio algum; não... Deixou-me foi minha própria vida escancarada e comigo mesma de cara, o que me tirou o chão! Contraditoriamente, isto não me pareceu negativo, embora a sensação presente seja de total apatia e, muito pelo contrário, sinto que fiz descobertas, que tive uma clara e ampla visão do que quero e do que farei com meu futuro. Vejo um apartamento pequeno, claro e limpo, sem acúmulos materiais e poeiras sentimentais, vejo a mim e a meus filhos, meus gatos e somos felizes. Nesta visão, tenho total controle dos meus dias e dos meus atos, sou dona das minhas escolhas e escolho ser feliz, todos os dias, todos os momentos. Vejo progresso, segurança e sobretudo, paz! Agora tenho a sensação e a certeza de ter repelido tudo aquilo que me fazia mal, ainda que a fonte do mal me bem quisesse (ou pensasse que bem queria).

Hoje li - e rasguei - cartas do passado (aqui poderia começar um novo capítulo), vi que todas as chances foram dadas, o meu amor foi exaustivamente declarado. Essas coisas absorve quem quer e se ele não quis, por displicência ou por acreditar que tudo que emanava de mim seria eterno e inabalável e seu esforço para manter meu amor não era necessário, ele então perdeu o cavalo e, como já dizia algum idiota qualquer, o cavalo nunca volta. E eu sinto muito por isso, sinto por ele, sinto demais, sinto de verdade! Mas, como uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa (acho ridícula essa colocação, mas quis usar sabe lá Deus porque), esse meu sentir não cerceará mais meus caminhos e minhas tomadas de decisões. A vida é curta e única e já demorei demais pra perceber e agora, mais do que nunca, estou convicta do que quero e também do que não quero. E eu não o quero mais.

Talvez não queira nem mesmo mais amar, porque me convenci, numa conclusão utópica, que o amor é o sentimento mais egoísta, que traiçoeiramente se traveste em solidário. Pura balela! Quem ama, ama seu próprio reflexo no outro, ama quem lhe faz bem, quem ama sempre é o umbigo da relação, do universo. Já a paixão não... A paixão é também egoísta, mas há sinceridade nesse egoísmo, não há nela embustes de nobre sentimento. Paixão é fogo, é quase demoníaca, queima e como chama, apaga. E todo mundo sabe que um dia ela vai apagar e quando isso acontece não deixa mágoas, justamente por ser um sentimento sincero, de total doação, sem expectativas de eternidade, com prazo sabido de validade.

E assim que acaba minha velha história de amor, com a visão escancarada de mim mesma, sabendo que gosto mais de mim do que um dia imaginei. E daqui pra frente? Daqui pra frente quero que minhas relações tenham começo e fim, não quero pensar que nada será pra sempre, quero paixão, diversas e intensas paixões. Quero viver me apaixonando, até morrer.

Lost Vivi
Enviado por Lost Vivi em 08/04/2015
Reeditado em 03/01/2022
Código do texto: T5199517
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