Dor e prazer como truques da natureza
Tenho a impressão de que a dor e o prazer são apenas truques da natureza bem bolados para manter a vida em plena atividade na Terra.
Se não fossem os diversos prazeres que a vida dá ao seu portador (comer boa comida, fazer sexo, realizar um bom trabalho) teríamos tanta vontade de viver? Se não fosse a dor física que vem quando a vida á ameaçada, teríamos tanto medo de morrer com dor? Se não fosse a angústia que vem pelo nosso desconhecimento sobre o que vem após a morte, teríamos tanto medo do desconhecido e de morrer?
Se não fossem esses prazeres, essas dores e essas angústias, não aceitaríamos a morte apenas como algo que é natural?
Será que a vida é uma coisa tão estranha, tão anormal, tão sem sentido que a natureza tem que se valer desses truques tão eficazes para nos encobrir essa estranheza, essa anormalidade e essa falta de sentido da vida?
Porque não fossem esses truques, essa estranheza, essa anormalidade e essa falta de sentido da vida seriam percebidas de imediato e nós quereríamos voltar para a normalidade do nada, do não viver. Não chegaríamos à idade de procriar e, em pouco tempo, a vida acabaria.
Quando acordamos de manhã, pensando no que o dia nos prepara como seres viventes, não desejamos do fundo da alma ficar mais um pouco na cama, aproveitando mais um pouco os momentos deliciosos de inconsciência, calma, paz, que passamos durante as poucas horas de sono que passamos durante a noite que passou?
Se não houvesse nem prazer (para nos puxar para a vida) nem dor (para temer a morte), não desejaríamos acionar nesse momento de
acordar um “click” interno que desligasse a vida de nós?
Porque perceberíamos em toda a plenitude a estranheza, a anormalidade e a falta de sentido que é viver? E voltar para a normalidade, a realidade do nada que era o que havia antes de nascermos e será o que haverá depois de morrermos?
O prazer e a dor são truques da natureza para que não nos sintamos tentados a dar esse “click” libertador.
A natureza quer que a vida exista. Seus truques são tremendamente eficazes. Para quê? Por quê?
Não sei. Ela deve ter seus motivos secretos. Pode ser que não haja motivos secretos. Pode ser que não haja fim algum, como alguns filósofos esperançosos cotejaram.
A vida existe, independente de ter ou não algum sentido. Mas, ao que parece, se não há sentido na vida, é indiferente que lutemos por ela. É indiferente que ela exista ou não.