ACREDITO NA VERDADE DO OUTRO



 
Acredito sempre na verdade do outro sabendo, simultamente, que  toda verdade, querendo-se ou não, carrega no bojo a sua própria contradição. Eu o sei, porque a vida é assim. E o sei, porque eu também sou assim, não por hipocrisia: por imperativo da humana condição. Lidar com a própria sombra e com a própria luz, às vezes se torna tarefa quase sobre-humana. Há os que se saem bem em tal tarefa, como o homem que foi meu companheiro. Acredito na verdade do outro porque preciso acreditar na minha própria verdade, também contraditória, também precária, também a precisar sempre de reconstruir-se a si mesma, no que ela mesma vive a se desconstruir. É preciso crer, por princípio e em princípio, na verdade do outro, até cabal prova em contrário e, ainda nesse caso, buscar algo em que se consiga crer, no outro e/ou em nós.  Tenho sido demais bode expiatório. Nunca fiz nem farei, de ninguém, bode expiatório dos meus próprios "pecados" e dos meus próprios fracassos. Jamais o fiz. Jamais o farei. Sempre tenho tentado compreender; pena que, com relação a mim, a recíproca até hoje tenha sido quase sempre muito, muito pouca, daí essa dor quase sobre-humana no existir, a dor dos dois pesos e das duas medidas, quase o tempo todo em atuação.