Meus vícios

É engraçado. Há anos eu poderia ter sido qualquer coisa. Talvez não tudo, mas qualquer coisa, com certeza. Um soldado, dando o coração por meu país; um pescador sentindo o cheiro do mar; um escritor famoso, escrevendo e vivendo romances. Havia um misto de sentimentos em fuso dentro de mim, sentimentos que ansiavam pelo mundo lá fora. Eu poderia ter sido qualquer uma destas coisas.

Mas não fui. Nem serei. Eu caí na normalidade, nos vícios sociais. A conexão em rede, o barzinho da sexta, o cigarro depois do café, a cerveja gelada. E o luxo. Aos poucos, me viciei, em maior ou menor grau em todas estas coisas. E as noites que eu passava planejando futuros brilhantes tornaram-se noites insones de festividades e muita bebedeira.

Aos poucos, me tornei uma pessoa comum. Ou quase isso. E é engraçado, dão tapinhas de aprovação em minhas costas e dizem-me que amadureci. Ainda mais que o esperado para um cara da minha idade. Magnifico, não? Todos aqueles homens, segurando suas cervejas de uma marca qualquer, ostentando estômagos volumosos e com um cigarro, ou pelo menos a memória dele, na boca, me falando aquelas palavras. E eu quase caio. Quase me sinto parte daquilo. Quase Faço parte daquilo. Mas ainda não, eu ainda posso ver no fundo dos olhos deles as marcas de uma vida vazia e sem proposito. Não vai ser desta vez.

Então eu chego aqui, cheio de pompa e hipocrisia e escrevo sobre tudo isto que constatei, isto com um cigarro na boca e tendo acabado de marcar outra longa noite insone e cheia de bebedeira. Mais uma vez minha mente revisa tudo que já falei. No final, ela se desdobra na hipocrisia e no gosto que cada um dos vícios deixa na memória. O que fazer?

Eu sorrio.