A MARAVILHA DO MUNDO CHAMADA SILÊNCIO

Estive em um trem metropolitano hoje e no vagão cheio uma mulher tentava acalmar sua criança de colo que irrompia-se em pranto incontinente. A criança fazia reverberar gritos estarrecedores. Aos berros, ela solicitava à mãe o cuidado necessário para que pudesse findar seu martírio e o dos demais passageiros, que mesmo querendo ser solidários, achatavam-se entre os braços tapando os ouvidos e lamentando por demais estarem a compor o cenário caótico. Ninguém aguentava mais os berros do bebê. Havia até os que sucumbiam à impaciência e proferiam blasfêmias e palavras desagradáveis, culpando a Deus pela situação e à mãe pela falta de habilidade com sua prole.

Pus-me a entoar um mantra e com ele esperei pelo tempo certo para que a chorona acalmasse e a calmaria se viabilizasse. Eu aclamava para que o silêncio viesse, mas eu também estava em puro estado de nervos. Eu não conseguia me concentrar e até duvidei que eu fosse resolver o caso com a simples repetição mental de ondas de som que não ultrapassavam meus circuitos internos e que somente eu podia ter consciência do que eu pronunciava incessantemente. Tentei me deixar absorver pelos meus pensamentos, seria outra forma de resolver o problema, embora fosse a mais egoísta, pois somente para mim estaria resolvida a questão.

E o caos chegou a um ponto que achei que não dava mais. Passei a duvidar do processo que eu mentalizava. Depois eu me refiz e questionei-me se não era eu que estava vacilando e não sendo persistente com a fé no processo ou em fazer o procedimento correto, que era eu me convencer de ter estabelecido conexão com a consciência cósmica, para a qual eu enviava minha solicitação mental, e aguardar a providência.

Quando eu me dei por mim, a partir de determinado momento, o aborrecimento havia se desfeito. O silêncio tomou conta do vagão. E geral até, nem mesmo os passageiros crescidos conversavam. Então, olhei para o assento que ocupavam a mãe e seu filho e vi que ela o havia deixado. Sim, era outra forma de resolver o impasse. Meu mantra foi ouvido e meu desejo realizado. E eu passei a experimentar um prazer enorme, uma paz que desejei ferrenhamente que fosse eterna. A deliciosa sensação que todos nós perdemos por não considerarmos nobre o procedimento de fazer silêncio ou por abrirmos mão de exigir que silêncio fosse feito e mantido.

Só fui voltar à estaca zero quando cheguei em casa, louco para digitar este texto. Hoje é dia de jogo entre Atlético e Cruzeiro em Belo Horizonte. E às quatro da tarde já havia vagabundos soltando foguetes intermitentemente pelas ruas do bairro, nos conjuntos habitacionais que o Governo do Estado alojou despejados de uma favela e nas favelas mais ao longe. Além de poluir o ar com a pólvora, o barulho dos rojões perturbavam qualquer um que estivesse exposto a eles. Espontaneamente ou não. Desde o mais alienado consumidor de futebol até o mais cético nas competições ou o sujeito mais pacífico, que não quer nada com esse esporte, mas que também não o critica. E Belo Horizonte é assim o ano inteiro e o ano inteiro esses dois últimos têm que engolir sapo.

E isso retrata a verdadeira cara da cidade. Em nada ela tem a cara que a mídia vende para aqueles frangalhos que pensam vir para cá fazer turismo ou até morar em uma localidade com propaganda de ser moderna. No fundo, o caos dos dias de jogos, independente de ser dia de final de campeonato como é hoje, faz com que a gente veja que a qualidade de vida em BH é das piores entre as cidades brasileiras. E a qualidade político-administrativa-policial é pior ainda. Perdemos em muito para a capital do Rio de Janeiro. E como lá não temos a quem recorrer para que a democracia seja mantida e a civilidade seja soberana e todos aqueles que dividem o espaço da região metropolitana de BH possam ser atendidos igualitariamente.

O certo seria todo mundo ficar satisfeito, ser respeitado. Para quem gosta de ordem: ordem; Para quem gosta de desordem: desordem. Somos todos iguais pela Constituição Federal e só quem não gosta de ordem é que é respeitado, pois não há quem tenha vontade de ajudar aqueles que querem qualidade de vida em troca de seu pagamento de imposto. Político só quer saber de pedir voto com a cara de mendigo e de receber seu salário nos dias de pagamento.

Onde há futebol é que nem onde há televisão: Não é lugar civilizado para se viver. Lugar de baderna e barulho de torcedor é no Estádio. E dentro dele somente.