Penhasco

Foi naquela hora que tudo fez sentido, disso eu tenho certeza. Que todo aquele monte de raiva, inquietação, tudo foi embora, nem que por um segundo só. Na hora em que minha respiração era mais alta que meus pensamentos, que os passos correntes no chão não davam-me tempo para ponderação, dúvida nem nada que tirasse-me de lá. Daquele inferno, paraíso, purgatório; daquele espaço entre o sabor embriagante do prazer, da dor já sentir o corte da adaga que nem em sua pele encosta ainda. Eu não quero mais nada. Que venha-me aquele êxtase mais uma vez, por favor. Que eu ainda possa encontrar na secura de minhas entranhas toda aquela mortificação da agonia, da amargura e nelas, encontrar-me de vez. Que esse monte de voz perdida nos tons ainda sussurre-me no pé do ouvido todas as mentiras que preciso, mereço ouvir-- que tu venhas e puxe-me pela mão, não permitas que eu me afogue de vez. Só deixe-me parar pela água e lutar pelo suspiro de vida, bater meus braços contra a correnteza que quer nada além de exaurir-me o quanto antes. Eu quero nadar, perder o fôlego, dar de cara com fim. Quero chegar na praia e olhar as ondas de longe, acenas e de lá apenas sentir sua força, seu amor que avassala os corpos fracos que não pisaram nesse chão. Mal sei se ele existe, se encontrarei-o de vez, mas preciso. Preciso fechar os olhos e dar este passo, este tiro e ver o que acerto, se há algo que valha a pena a fagulha de minha arma, minha alma. De meu coração louco e cheio de medo com vontade, com necessidade de descobrir o que mais pode suportar consigo por aqui.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 14/11/2014
Código do texto: T5034488
Classificação de conteúdo: seguro