DE RECONHECIMENTO E DE ACEITAÇÃO



 
        Sem se reconhecer e sem se aceitar, efetivamente, as contradições, os limites, as raízes da solidão, mesmo os abismos do ser do outro, é quase impossível uma relação verdadeira. Eu tenho tentado fazer minha parte desde sempre, homem que não pertence aos espaços do Recanto das Letras. A tua parte, nunca, jamais te dispuseste a fazer. Talvez, entre outras razões, por ser esta nossa sociedade uma sociedade autoritária e machista por excelência tu, fruto dela, nunca empreendeste dentro de ti a tarefa de ultrapassar e de superar pelo menos parte dessa herança social que ainda sacrifica boa parte dos direitos das mulheres, em múltiplos níveis. Por causa dessa herança em ti me deixas só, como sempre, na tarefa terrível  de repovoar-me sozinha, desde sempre, sabendo-me, reafirmando-me, mais uma vez, mais uma vez, o teu não-reconhecimento e a tua não-aceitação de mim, a segunda grande causa desta solidão infernal. Da outra causa, bem... da outra grande causa, irreversível, urge que eu me cale... urge que eu me cale sempre... completa, abissalmente.