Lágrimas e Chuvas

QUINTA-FEIRA, FINAL DE TARDE, INÍCIO DE UMA TEMPESTADE.

Entro no ônibus com pressa, pois estou com uma mochila pesada nas costas, alguns livros nas mãos e nem sinal de um guarda-chuva por perto. Mal cumprimento o motorista e, desastrada como sempre, passo pela catraca e quase caio enquanto tento chegar ao único assento desocupado no veículo. Um homem ri, uma mulher pergunta se eu preciso de ajuda. Agradeço e continuo andando. Parece que o lugar vazio está cada vez mais longe; talvez seja resultado do meu cansaço.

Com os cabelos molhados, roupas encharcadas e tremendo de frio, finalmente chego ao meu destino. Coloco os livros no colo e olho para eles com a triste certeza de que perderei horas tentando secá-los. Tento colocá-los dentro da mochila, mas é em vão; tudo o que consigo é dar uma cotovelada no rapaz sentado ao lado. Olho na direção dele para pedir desculpas e entro em choque. Nossos olhares se cruzam e fixam um no outro. Sinto minha boca abrindo ligeiramente, minhas bochechas queimando, meus ossos virando gelatina de framboesa, meu estômago sendo atacado por um milhão de borboletas ariscas, meu coração explodindo de tanto bater. É ele.

As palavras somem, os músculos travam... a mente se enche de recordações: aquela fria manhã de julho, a tarde jogando tênis, aquele filme, a música que diz muito, o dia na sorveteria, mãos dadas, os beijos, a despedida. Quanto mais o tempo passa, mais lembranças surgem. Nossos olhares continuam conectados, até que uma freada brusca me tira do transe.

Olho para fora pela janela e vejo que já estou perto de casa. Levanto, coloco a mochila nas costas novamente, pego os livros e, após apertar o botão de parada, caminho até perto da porta. Antes de descer, olho por uma última vez para o cara que me fez enxergar o mundo de outra cor e depois, sem motivo algum, me deixou novamente num universo em sépia. Então eu desço, deixando que minhas lágrimas se misturem com a água da chuva.