A INQUIETUDE ESPIRITUAL E INTELECTUAL
As pessoas mais contemplativas e inquietas intelectualmente, sempre promovem espontaneamente, profundas incursões íntimas, tanto pela razão como pelo espírito, na busca de respostas para complexas indagações que povoam a mente humana, que provocam até ansiedades e angústias. Porém, nessa busca, todos devem abstrair-se momentaneamente das velhas convicções, às vezes já anacrônicas; dos seus preconceitos, de idéias pré-concebidas, de fanatismos, sectarismos, e sobretudo, das enfadonhas histórias bíblicas contadas e repetidas exaustivamente pelos astutos e maliciosos sofistas.
Iniciando uma incursão pelo espírito, vejamos como começou a grande maratona da Humanidade, usufruindo do privilégio de sermos os últimos, pois os últimos serão os primeiros a ficar sabendo, que somente em uma das ejeções cósmicas determinada pela Vontade e executada pela Palavra, o deslumbrante Anjo de Luz, o Príncipe Angélico Lúcifer, se insubordinou, tentou extrapolar os limites da sua configuração (Judas 1;6) e os limites da intensidade do seu brilho, conclamou sua legião angélica e quis se igualar a Deus. Ele foi contido juntamente com a sua legião na sua circunscrição e o brilho lhe foi retirado. Tornou-se numa brasa sem o brilho da Luz e se converteu no Príncipe das Trevas, o inimigo número um da Clara Divindade, ou o Anticristo. Mas, toda a massa da imensa corporalidade, constituída pelas essências sintetizadas, foi irreversivelmente contaminada e à Vontade restavam duas alternativas: manter o Príncipe insubordinado e suas legiões eternamente em sua circunscrição ou estabelecer um processo de recuperação, regeneração ou purificação, ainda que parcial, dessa imensa corporalidade contaminada, como num sistema de reciclagem. Felizmente, foi adotada a segunda alternativa, mas, estabelecia-se então, o início de uma longa e dolorosa batalha - Deus contra Deus - (nemo versus Deo nisi Deo ipse) ou (ninguém contra Deus, senão o próprio Deus) a longa trajetória evolutiva ou, a quarentena do Terceiro Princípio, onde a Vontade sabe, por antecipação, que restarão duas partes de escórias e somente uma parte será recuperada, regenerada ou purificada. Para a Vontade não existe o tempo e a Razão não pode mensurar a quarentena do Terceiro Princípio, assim como não sabe quanto tempo Adão ficará imerso no sono profundo, (muitos ainda estão dormindo) na sua imensa trajetória evolutiva, até que no seu intelecto, passem a emergir as evidências da sua espiritualidade, (a Promessa) como conseqüência da ação do poderoso e amoroso Agente Purificador, que, pelo Seu Espírito, permanecerá, então, mais três dias e três noites no seio da terra. Mas, a Razão pode saber, que a partir do “Nascimento” de Cristo, iniciou-se a seqüência posterior (depois daqueles dias), e que representa os últimos tempos, quando Moisés entregou “Jacó” para que “Josué” o convertesse em “Israel” e o introduzisse na “Terra Prometida”, pois, a Lei não entra onde só a Graça pode entrar, o que significa que o Homem deve fazer urgentemente sua parte, cuja orientação está impressa na sua mente e no seu coração, o que torna inescusável a inobservância destas leis, especialmente para os que, pela racionalidade, mais se aproximaram da Sabedoria Divina. Na trajetória evolutiva relacionada ao homem, ele se apresenta inicialmente, como uma besta-fera com todas as qualidades e os requintes de um animal absolutamente selvagem, que, assim como toda a imensa corporalidade contaminada, --o Terceiro Princípio inteiro -- passará pelo processo de limpeza, e, como detentor do conhecimento do bem e do mal que é, do qual, num dado momento se apoderou, revestindo-se então, do livre-arbítrio, terá que agir, optando pela sua regeneração e perseguindo-a com a mais persistente dedicação. Isto significa fugir do “rebanho” e procurar, até a exaustão, a Theosophia! Essa busca é pessoal, independente, intransferível e sem intermediários. Ressalvadas as diferenciações concernentes às suas potencialidades racionais e espirituais, todos os homens são iguais e reúnem as mesmas condições para o acesso à regeneração, mediante as suas respectivas possibilidades de adentrar as três formas de Unção que lhes poderão ser facultadas, compatíveis e em sintonia com as respectivas potencialidades, ou seja: 1- Percepção espiritual da Presença do Senhor; 2-Aquisição espiritual de Conhecimentos relativos à Sabedoria Divina; 3 – Poder (Sabedoria) para exteriorizar os Conhecimentos que lhe foram concedidos, (frutificar na videira do Senhor) cujas formas de Unção, são cumulativas na sua eventual progressão.
A inquietude intelectual se acha instalada em todos os homens, mais ou menos intensamente, conforme a progressão dos conhecimentos racionais e dos espirituais, dentro das potencialidades da Razão e das potencialidades do Espírito. Essa inquietude do intelecto, quando mais intensa, exaspera e angustia a pobre Razão, que por si mesma, não consegue obter respostas para as complexas indagações que o seu raciocínio e conjeturas constroem em sua mente, esta, palco do ininterrupto e intenso combate entre três poderosas forças: o Espírito Angelical, o espírito astral e o espírito infernal. Levada ao próprio desespero, pois esse é o terminal da via racional, a Razão se encoleriza e passa a blasfemar encorajada pelos espíritos astral e infernal, contra o Deus que ela não conhece, no Qual finge não acreditar, mas deseja ardentemente encontrar por si mesma. Ocorre que a opção pelo espírito astral já fora feita anteriormente pelos primeiros pais e, de partida, ainda no sono de Adão, todos os homens ratificam essa opção e são envolvidos pelos seus atributos, que podemos sintetizar no orgulho, na cobiça, na inveja e na cólera, com os seus respectivos desdobramentos. Esses atributos, individual ou conjuntamente, dificultam a qualificação da Razão para a percepção espiritual da Presença do Senhor, na primeira etapa, para o testemunho pela Fé Espiritual e, eventualmente, nas etapas posteriores, para o Conhecimento e para o Serviço na vindima do Senhor. Essa dificuldade, contraposta a uma inquietude intelectual mais aguda, leva a Razão ao desespero, na crista de angústias e aflições e, aqueles que não encontram a “porta”, em muitos casos, geralmente se autodenominam agnósticos ou ateus, mas nem sempre todos o são, verdadeiramente. Eles, de fato, estão desesperados e ansiosos para crer, mas não conseguem, em função dos atributos que caracterizam a racionalidade. Esse desespero da Razão pode ser notado, quando um pseudo-agnóstico, ou seja, o norte americano Sam Harris, faz estas afirmações:
“Só com o fim da fé se poderá erguer uma civilização global. Se há verdades espirituais ou éticas a serem descobertas, e tenho certeza de que há, elas vão transcender os acidentes culturais e as localizações geográficas. Falando honestamente, esse é o único fundamento sobre o qual podemos erguer uma civilização verdadeiramente global”.
Alguém acredita que se trata de um ateu? O que ocorre então, realmente, com ele? Por que ele se contradiz?
Isso ocorre, porque a razão não consegue, por seus próprios meios, penetrar na esfera dos conhecimentos essenciais, e os ensinamentos racionais, como os ministrados pelas denominações teológicas, não são suficientes para satisfazer os intelectos mais avantajados, que não se contentam com metáforas ou parábolas que não sejam cabalmente esclarecidas ou elucidadas. O maior problema, é que alguns, mais prudentes, seguem o seu caminho solitário, continuando sua busca, sem interferir, ou tentar influenciar outras pessoas sobre as suas especulações que nem ainda se traduzem em convicções. Outros, como o Sam Harris por exemplo, assumem, imprudentemente, a condição de semeadores das suas especulações, orientando indevidamente outras pessoas
Todavia, “os mornos” são ainda mais problemáticos do que “os frios” e “os quentes”, pois isto significa que estas duas últimas categorias não são dissimuladas e assumem ostensivamente as posições que adotam, bem como as responsabilidades a elas inerentes, o que não ocorre com “os mornos”, que sempre estão “em cima do muro” onde oscilam conforme as circunstâncias e as suas conveniências imediatas, sempre relacionadas ao materialismo racional. Na categoria dos “mornos”, estão, entre outros, os que “não entram e não deixam entrar os que estão entrando” (Mateus 23;13), como os sofistas acampados nas denominações teológicas, que são instituições mercantis, semelhantes às grandes redes de supermercados, as quais, maliciosa e indevidamente, se auto-intitulam de religiões. Uma delas vai mais além: ela própria se santifica e avoca a si, a faculdade de santificar!
Vamos descansar o espírito e cavalgar com a razão, para que ao final, ambos estabeleçam o melhor diálogo entre si, na busca pelo maior entendimento e pela compatibilização dos seus respectivos objetivos.
É necessário examinar as origens e a história das instituições nas quais o pseudo-ateu se baseou para estruturar os seus conceitos. Então, ele verá que o Edito de Milão de 313, instituído pelo imperador Constantino facultou a liberdade de culto aos cristãos, que de fato, apenas liberou a organização já existente e bastante influente, ou seja, a Igreja (Assembléia), organizada sob a tutela de uma hierarquia baseada nos “padres”, “bispos” e no “papa’. Posteriormente, estabelecendo a supremacia política e “religiosa”, mediante a elevação formal da Igreja de Roma a centro da cristandade, ocorreu em 325 o concílio de Nicéia convocado por Constantino, cuja Igreja, em outras reuniões subseqüentes e semelhantes, constituiu a ortodoxia, a opinião correta sobre a doutrina cristã, obviamente, virtude esta de propriedade exclusiva da referida Igreja, que a subtraiu do próprio Espírito Santo, que a partir daí foi devidamente “amordaçado”. O desenvolvimento desse processo culminou no nascimento oficial da Igreja de Roma, cuja preponderância recrudesceu as disputas entre as contraditórias interpretações das Escrituras e esse confronto de opiniões, gerou violências contra os que essa Igreja considerava como hereges, ou seja, ela já “nasceu oficialmente”, praticando a violência, em nome de Cristo, que paradoxalmente, pregara o amor incondicional ao próximo.
Sobre essas bases, por incrível que pareça, os sofistas mercenários, estabeleceram o comando pleno nessa instituição, nada mais que uma simples denominação teológica desvirtuada, e construíram o maior, mais durável e mais poderoso império da face da terra, que governou o planeta, livre e soberanamente, em conluio com os Príncipes da Terra, sem nenhuma oposição, por aproximadamente mil e duzentos anos, até que começaram a surgir as contestações, geradas no próprio ventre desse império, por alguns daqueles que conheciam muito bem os seus perversos mecanismos, embutidos nos recônditos das suas entranhas. As contestações tiveram sua origem, também na Filosofia clássica, nos fragmentos de revelações que fluíram através dos seus pensadores, cujas idéias sempre foram objeto de estudos pelas denominações teológicas sobrevindas. Quanto ao início dos conflitos gerados pelas contradições, talvez tenham se iniciado com o “padre” apologista Clemente de Alexandria (150-215), que procurando compatibilizar o cristianismo e a tradição filosófica, introduziu o termo grego gnosis (conhecimento) que caracterizaria a perfeição do cristianismo. Daí brotou o gnosticismo, que poderia ultrapassar os frágeis limites do grande embuste chamado fé racional. O conhecimento divino (conhecimento essencial) é incompatível com a mercancia, por isso a Igreja ou Assembléia, saiu logo no combate da indesejável pretensão de um conhecimento superior, situado acima da fé racional, esta, o seu produto preferido, que juntamente com outro produto da sua elaboração, o marianismo, são as suas ofertas permanentes, para exposição nas pontas das gôndolas. Os tais sofistas fingem não saber que o Espírito Santo operou através dos profetas primitivos, sem a necessidade de intermediários, sem especulações (os profetas ungidos fazem afirmações com base nas revelações e não especulações baseadas nos seus próprios raciocínios) e isto se fez sem hierarquias, sem rituais e sem a necessidade de quaisquer procedimentos exteriores, que não têm nenhuma importância. A única exteriorização concebível é a ceia com Cristo e esta se realiza, todas as vezes que um profeta verdadeiramente ungido (Hebreus 5;4) se reúne com seus irmãos, em qualquer data e em qualquer lugar, sem a necessidade de quaisquer formalidades, rituais ou solenidades, para repartir com eles os conhecimentos essenciais e a sabedoria divina, ou o pão da vida e a água viva, o conteúdo real da metáfora do pão e do vinho. Essas contestações ganharam maior amplitude e expressão intelectual, através de Erasmo de Rotterdam por volta de 1500 e culminaram na sua radicalização a partir de 1517, por intermédio de Martinho Lutero, provocando a grande cisão que deu origem à formação de muitas outras denominações teológicas, as quais, ao longo do tempo, também acabaram se desviando dos seus rumos iniciais e, praticamente, se igualaram àquela que contestaram, sem que nenhuma delas tivesse alcançado a mesma expressão social, econômica e política da primeira, como desejavam.
O poderoso império, onde se alojaram os sofistas mais primitivos, reagiu vigorosamente às contestações e, na mais longa reunião da história, o concílio de Trento (1545-1563), foram estabelecidas as bases da contra-reforma, cujos fundamentos foram os seguintes: 1- crença na existência do purgatório; 2- proibição do casamento dos “padres”; 3- devoção aos santos (que são eles mesmos e os indicados por eles) e às relíquias; 4- autoridade infalível do “papa”; 5- valor da tradição dos “santos padres” na interpretação da Bíblia: 6- cria a Congregação do “Santo Ofício”, que centraliza as atividades da “Santa Inquisição”, reprimindo violentamente protestantes e livres manifestantes do humanismo renascentista; 7- cria a “Sagrada“ Congregação do Índice, que elabora o Índex Librorum Prohibitorum (este não é “santo”), o índice de obras condenadas pela igreja católica.
Quanto aos seus contestadores, a estratégia dos sofistas sempre consistiu em absorvê-los com as suas idéias, sempre que isto fosse possível, evitando que sua doutrina e dogmas corressem o risco de desmoronar. Essa absorção significava silenciar o contestador ou trazê-lo e incorporá-lo à instituição, retocando, mesclando, glosando ou anulando suas idéias, conforme cada caso. Quando isso não fosse possível, o “Santo Ofício” e a “Santa Inquisição” cuidavam de uma “calorosa” solução para os seus contestadores, como fizeram com o “padre” João Huss (1369-1415) e o “padre” Giordano Bruno (1548-1600), os quais foram queimados vivos nas fogueiras da “Santa Inquisição”.
Agora, o espírito e a razão podem se acomodar frente a frente, para uma construtiva troca de idéias, iniciando uma caminhada, de mãos dadas, em busca de Theo, pelas veredas de Sophia. O objetivo: a Theosophia !