Escuro

E eu continuo aqui, fingindo que nada disso me faz diferença alguma. Agindo como se houvesse algo além de ti em minha cabeça, como se não fosse escrava de teu rosto, teu gosto que persistem em afogar-me o dia todo. Tu és feito um oceano para mim; nada passa da tua enxurrada, nenhuma força existente em mim jamais poderá nadar contra tua maré. Gosto disso, desse caos. Da falta de fôlego ao tentar, inutilmente, fugir do eco do teu nome por aqui. Sinto-me viva, presente. Capaz de todos os passos e trajetos, gritos e tons de sussurro para encantar-lhe como puder. Como eu souber, o quanto eu ousar sair deste plano intocável, perfeito, sutil que é o que imagino para nós. É prisão e libertação ao mesmo tempo, posso te jurar: todos os vislumbres que posso marcar em tua pele existem aqui, sim. Assim como todas as dores, horrores e ardores de ferida que sinto ao deixar o vento de fora passar por aqui e levar embora todo esse perfume. Quando as buzinas, choros e latidos, sirenes da vivacidade indomável, suja de lá vem e nos arrasta pra fora, obriga a viver. É esse resquício de beleza, vestígio mínimo de poesia que consigo carregar por aqui que faz-me permanecer. Ficar e pedir, tentar como posso soltar o suspiro que leva consigo todo meu medo daqui. Que permite algo novo e real, tangível encontrar-me e tirar-me para dançar. Que dá-me coragem para deixar nem que só uma fração de todo meu amor escapar daqui e te puxar, trazer para cá e fazer-lhe enxergar-me de vez. Quando eu consigo lhe amar, é nessa hora-- nessa hora que todas as quedas e cortes valem a pena, apenas por vê-lo, tê-lo comigo nem que por um segundo que for.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 31/10/2014
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