Calceteiros e capinadores de rua

Nos anos sessenta, era comum vê-los aos magotes na sua faina cotidiana, das segundas às sextas. Jamais juntos numa mesma rua, pois suas tarefas não se sincronizavam: o calçamento precisava estar pronto e bem assentado para o capim começar a fixar as raízes entre as suas gretas.

E cada rua tinha a ordem sua: calçamento, no seu mais solene momento, e a capinação, periódica, sempre que houvesse a ocasião.

Os calceteiros eram homens, com uns poucos rapazes aprendizes, e os

capinadores, não mais que meninos. Ganhavam u`a miséria e os atrasos eram de regra mas a Prefeitura é que lhes assegurava o sustento e a dignidade daquele vínculo com a sociedade. Mas de cócoras.

As equipes de trabalho tinham o seu mestre, que, além de se vestir com o garbo da função, dava os comandos e verificava sua execução, na intransigente ordem das coisas.

Com a expansão da área calçada, a partir do centro da cidade, os calceteiros viram os seus paralelepípedos de granito de fácil e decorativa colocação, transformarem- se em poliedros, de assimétrica conformação. Mas para a periferia, era do Prefeito, perfeita, a solução. Calçamento bonito era caro.

Em alguns trechos da cidade, geralmente nas ladeiras centrais mais abruptas, onde já havia um calçamento de pedras arredondadas, pés-de-moleque chamadas, optou-se pela superposição dos paralelepípedos, que muitas vezes elevava as superfícies e deixava passeios e casas rebaixados.

O ritual do calçamento era iniciado pelo nivelamento da rua por meio mecânico, a que se sobrepunha uma camada de areia, seguida do assentamento das pedras, a partir de uma linha central, feito uma coluna dorsal.

Tempos depois, assentadas as pedras e corridas enuxrradas sobre elas é que apareciam os capinadores, com seus ferrinhos a esgravatarem as gretas e as libertarem das gramíneas renitentes, nesta terra de Caminha, tão frequentes.

Mas aí, com um Governador espalhasfaltoso, dito Cardoso, veio o asfalto. E se foram os calceteiros e capinadores, sem pedra e sem grama, pro seu cotidiano drama.

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 24/09/2014
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