Pensar não é ter pensamentos
Pensar não é ter pensamentos. Pensar é cuidar, alimentar, curar, amar, como sugere o sentido antigo de “pensar” em português, presente nos cancioneiros medievais (“pensar no amigo”) e ainda hoje no interior de Portugal: “pensar uma criança”, “pensar os animais”. Daí vem “pensar uma ferida” e “fazer um penso” no sentido de um curativo. No mesmo sentido, em francês, até ao século XVI, “penser” (pensar) e “panser” (cuidar, curar) eram um mesmo verbo.
Também nas línguas anglo-germânicas pensar é mais do que ter pensamentos. Pensar é agradecer, como mostra a raiz comum do inglês “think” e “thank” e do alemão “denken” e “danken”. Pensar, como viu Heidegger, é “dar graças” pelo Ser.
Curiosamente, estes verbos derivam por sua vez da raiz indo-europeia –dhyai, de onde vem o sânscrito dhyāna (absorção meditativa ou contemplativa, sem sujeito nem objecto), o chinês ch’an e o japonês zen.
Sim, pensar não é ter pensamentos. Pensar é cuidar, amar e sarar a ferida aberta da separação fictícia entre nós e os outros, nós e o mundo, nós e o real. Mal pensa quem pensa mal de alguém.