Desafio

Por todos os matizes, formas e reflexos que consigo extrair dessa face já tão sem graça, algo ainda posso prometer: este não será o fim. Sim, está nublado agora e daqui já não vejo muita coisa. Mas tudo bem. Por agora, deixe a janela como está, fechada. A porta entreaberta, a voz aguentando-se em sua rouquidão. Esta prosa não é minha para pôr ponto final, entenda. Aqui sou só peça, espaço entre as letras sem significado, vírgula perdida distorcendo algum sentido. Sou mais nada além disso, assim como você; nós, o conjunto de átomos, de vontades contidas, de palavras engolidas, somos nada nesse redemoinho todo. Não podemos domá-lo, então vamos aceitar; aceitar o quão sem rumo é o vento que nos leva daqui para lá, que fez-nos conhecer aqueles que nos deram algum resquício de amor, que nos trouxe para esse chão desconhecido em que agora pisamos-- eu não quero estar em lugar algum. Quero os tropeços desde caminho, as dores e prazeres que acho por aqui, jogadas em meus pés, convidando-me para arriscar um passo a mais. Quero o teu rosto junto ao meu, quero o abraço dos amigos, o riso dos irmãos, o beijo dos amantes; o amor em todas suas menores vertentes, desalinhos, perdições. Meu sorriso, por mais torto que esteja, é o mais verdadeiro que consigo projetar. E nada, nada vale mais do que ele e o que o compõe. As lembranças, as minúsculas esperanças, fios de coragem, os desejos que esqueço de esconder: eu sou isso e nada mais. Então seja, apenas seja esse caos todo junto de mim. Segurem as mãos de quem estiver ao seu lado e vá, suspirando e ofegando para o próximo passo. Que nada jamais impeça teu coração de bater nesse uníssono, essa melodia que é não mais sentirmo-nos sós.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 01/09/2014
Código do texto: T4945968
Classificação de conteúdo: seguro