A Hora.

Sei lá a razão de estar escrevendo isso aqui, agora, em mais uma noite sem conseguir dormir, é que acho que estou morrendo...

Já quis escrever tudo isso antes, mas não consigo transcrever absolutamente nada há dias e agora quis gritar de vez. Antes de partir, gostaria de escrever palavras, que nem eu sei a razão e o motivo, tamanha eis a minha confusão mental, e talvez eu nem esteja definitivamente morrendo. Metáfora.

Eu amei. Sim, eu amei. Mas antes, quero começar dizendo minhas favoritices. Hoje assisti mais um filme que gostei e marcou esta fase, não sei se chamo assim tudo isso, mas nem me atrevo a dizer que "só Deus sabe", afinal nem sei quem é Deus neste exato momento. Se chama "Submarine", mais uma obra e um favorito dentro de mim e de meu aprendizado, este talvez o ultimo. Não irei me estender em muitas palavras, só o suficiente para minha alma calar. Gosto de sorvete de Uva, aquele da praça perto de casa, nunca havia tomado um tão maravilhoso, na verdade nunca gostei de sorvete, igualmente a café, só que me entrego a caprichos. Me sinto extremamente confortável ao decorar meu quarto de maneira descontrolada, sem parar para pensar e gastar todo meu dinheiro que levei um ano e quatro meses para conseguir, meu Deus, porque ainda lembro desta data?

Gosto de coisas adoráveis, que me façam sentir e perceber minha fragilidade, não sei a razão, não sei sobre razão alguma, acredito que seja o fato de me cobrir de uma força que nunca existiu dentro de mim. Estou adiando de forma ridícula o fato de "eu amei", isso dói e isso me matou, esse "amei" me levou lá, e cheguei de lá até aqui, duramente fria e fora de mim.

Deixe-me dizer, o "amor, amar" é a dor mais em vão e injusta que existe, pois sofre por algo que nunca será seu permanente, só por algumas horas, um dia, minutos, e acaba-se sofrendo a vida toda por 90 segundos de amor, apenas, e se é verdade que a busca da felicidade é a essência, então é injusto. Desculpa, não se pode ser feliz sofrendo. Desculpa.

Não tenho raiva do amor, meus dedos estranharam insistentemente o fato de não acionar o Maiúsculo para esta palavra. Perdi a noção da justificativa de grandeza do amor. Acontece que se aceita quando não se vê o lado escuro da coisa, sim, amor tem um lado escuro, por gravidade humana. Desculpa, até as estrelas repousam sob um manto negro. Desculpa.

Isso doeu. Descrever essas palavras e essa aqui, "amor", doeu. Dói como um câncer, muito mais que uma simples facada, e ao mesmo tempo sinto um enorme enjoo e gosto de algo podre na boca. Fígado?, talvez a vida.

Essas ligações e elasticidade da vida não se encaixam em uma mesma órbita, ou você vive ou estica. Nunca pode haver meio termos, isso é coisa de outra terra, de outro espaço. Não se pode dividir um corpo em duas metades, não, Desculpa.

A beleza nunca me importou muito, sempre fui de sentir, não gosto muito de ver, talvez aí eu caio tanto. Sempre fui vendada por emoções, sempre toquei para definir, entrei para falar, sempre uma coisa de sentir, de dentro, não da carne, isso é selvagem. Uma vez me disseram como seria se todos pensassem igual à mim, daí imaginei uma mistura de pessoas felizes, sim, imaginei pessoas, não gente, que vive à procura de um próximo passo ou correndo pela vida, esbarrando e derrubando os mais fracos. Talvez a felicidade não esteja ligada entre meus pensamentos, aliás, nunca fui feliz e nunca quis ser, nem agora.

Deixe-me dizer, felicidade é como um copo de água com açúcar, se consome rápido, é líquido, digere com mais facilidade, sempre procura-se após a algum susto inconsolável, e no final sempre sobra uma borda no fundo do copo encostado na pia, aquela saudade. Ressaca de felicidade. Desculpa, felicidade é assim, não dura uma hora, nem vinte quatro, nem 365 dias, nem uma vida. Desculpa.

Sabe, é difícil acreditar quando se morre, é "s-e m-o-r-r-e" mesmo, da arte de deixar ir e morrer de morte morrida, é "m-o-r-t-e m-o-r-r-i-d-a". Parei de escrever, nem sei o que estou fazendo aqui, na verdade me dei um desafio estúpido, se não escrever em três meses não será um hiato supérfluo, mas o fim, fim de uma carreira que nunca se notou, apenas começou.

Sobre a morte, "Segure minha mão pois eu estou morrendo e não sei como falar", acho que adaptei Clarice aqui, não sei, também não importa, não faz sentido, o problema é a mão. Não tenho uma terceira perna, nem um sopro de vida, nem uma dor do dente da frente, nem a mão salvadora, aliás, Clarice iria se deliciar escrevendo sobre meu estado de alguma coisa, não espírito, não graça, de alguma reticência ou ponto final.

E se eu morresse de corpo agora? e se eu não levantasse mais, minha boca não falasse, minhas mãos não fizesse um gesto mais sequer? "Diego" nem se importaria, não digo meu "Diego" pois nunca foi meu, sofro de Frida Kahlo, é como se tivesse sido atropelada, "Diego" não volta, não vem, "Diego" não. Me dói e está doendo agora, como um corpo incendiado por câncer, meu câncer, queimando.

Era maligno, todos podiam ver, eu não, como resumi sou impercetível, sou do escuro, do "será", e "Diego"… não sei, "Diego" nunca foi meu, nem de Frida, nem da poesia, nunca teve lirismo, sempre foi podre, amava fazer doer, ou nem isso, certifico-me de que nunca amou nada, nem a si próprio. Quem ama em degrau, quem sabe amar desde a raiz, não machuca, não fere, não mata e não suicida. Desculpa.

Ponto final de um sempre final, anunciei minha desesperada vontade de voltar, mamãe e seus três abortos em meados de 93 e uma misericórdia prevista em mim sem nem jorrar da bolsa líquida. Mamãe queria e eu cedi, veja, recusei a vida por três vezes, não queria, nunca quis, não me lembro bem, mas acho que gritei esse momento quando saí, mal queria abrir os olhos, como agora, já doía sem ser.

Nunca por vida ou ida, quis magoar alguém, às vezes isso vem e acontece, como um furo de uma agulha, sempre sangra, embora pequeno seja. Sempre soube que doer, mata, sempre, senti aquele frio do rio quando está garoando e ventando ao mesmo tempo, "gente" me fazia garoar, sempre, e esse sempre cortava, furava como uma agulha velha, cada vez mais fundo.

Me sinto, não espera, não sinto, apenas vejo em frente ao espelho. O que vê? vejo meu corpo como um coração em estado terminal, falhando de um lado e alguma coisa batendo, acho que é o corpo, nicotina barata não mata tão rapidamente. Se ousar a pensar que eu quis me matar um dia, estará completamente enganado, "O Horrível é o que deve ir até o fim", é Clarice, se está nos acordes, eu não sei, não importa.

"Vida", consegue sentir o soco no estômago? ela é isso, um soco, às vezes forte, outras nem tanto, apenas soco. Vou morrer sem saber quem foi que inventou que a vida é acima de tudo e que a morte é o pior, acho que Deus ou melhor a bíblia poderá me explicar isso, desculpe minha falta de educação, não se pode questionar a Deus, ele sabe tudo.

Mamãe ficaria brava de ler isso, papai nem cito pois iria parar na segunda linha, não daria o luxo do meu desrespeito, "ingrata"- ele diria. Já são seis da manhã e outro dia chegou, fico pensando feito louca se chegarei até o anoitecer, não sei de repente ela me visita e aí acabou.

Aproveitando o desfecho me recordo de algumas escolhas, e se você que está lendo me conhece, comunique minha família na hora exata. Eis o meu final, não demores com enterros e toda essa bobagem, me exclua de toda essa coisa inútil, não quero ver ninguém em meu momento de despedida, só quero sentir o rio, o barulho do rio, sem tempestade ou garoa fria. É a minha felicidade, respeite, por favor. Após o ponto final, quero ser cremada, queime meu corpo, sem muita demora também, não quero prolongar nada, e sobre às cinzas, deixe com mamãe ou jogue-as no mar, sei lá, indefere.

Quanto aos meus amigos- eu disse amigos, eles sabem quem são, aqueles que amam em degrau, não machucam, por favor não chorem! Exclamo pois sei o tamanho da estupidez que digo diante de tanto amor que tivemos uns com os outros, mas pensem naquilo que buscaram a vida toda para si mesmos, acalmem com suas felicidades, pensem no seu maior e então iram enxergar o meu fim e será menos doloroso e será real, sim, eu já arquitetei tudo, sempre quis amenizar a dor, pois eu sei que ela mata. Amo vocês, guardem isto e não cobrarei que se lembrem de mim, apenas sejam leves e normais, não sejam uma busca de felicidade absurda, isso é viagem perdida, se for normal e suficiente está de acordo, e eis a felicidade de cada um de vocês. Amo vocês.

Acabei sem acabar, mas sei que voltarei em palavras antes de ir por inteiro, digo com o corpo, inteiro já não me pertence, como a mim mesma. Hora da quase morte- 06:28.

Aline Castro
Enviado por Aline Castro em 23/07/2014
Código do texto: T4892856
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