Receptividade Iluminada

Para o Sábio, o poder de sua ordem necessariamente gera o receptivo em sua volta: dele, flui e reflui os miasmas de uma inteira absorção em si mesmo. Sua postura é em essência nitidamente semelhança a flor-de-lótus, a qual a profundeza do seu ser rebela-se em pétalas pontiagudas em direção à divindade de seu centro. Suas certezas, por não serem cristalizadas, estão sob a oculta sintonia de uma beleza atordoante. Ele é, em si-mesmo, o protótipo da Anunciação.

Está em sintonia direta e sem interferências com o ideal da unicidade, uma vez que seus vínculos interiores conectam-se às raízes remanescentes de eras longínquas. É de uma idade sem fronteiras, quando ainda os instintos básicos e animais urgiam em descontrole sob a camada silenciosa que a razão, ao longo de milênios de anos, foi, aos poucos, dominando, energicamente, sob a implacável lógica do “logos methodic”. No entanto, Aquele Iniciado trilha o caminho oposto – da Infância faz sua sede adstrita ao corpo fumegante dos resquícios animais, integrando-os, porém, com a vitalidade orgânica da vida racional. Seu brilho é um espectro de forças antagônicas, viscerais, tirânicas e que, no fundo, atravessam o seu Ser sem afetá-lo sobremaneira. É como se estivesse, enfim, ausente para si mesmo.

Daí o último estágio desse ser: sua iluminação ardente. O Sábio desvincula-se da realidade não de modo alienado, mas para retornar com a proposta meditativa dos que sabem, em secreto desperdício, que as coisas factíveis não são compreensíveis imediatamente, mas dependem, definitivamente, de uma inteira reflexão que se opera nos interstícios solares da comunhão. Sua miséria é, em suma, sua grande dádiva, e o poder sintético de sua postura existencial refaz-se na macrofísica do universo, em comunhão atávica e, ao mesmo tempo, dissociada. A luz intercambia diretamente com as nuances trevosas, compondo um quadro estético de união deflagradora – e, na iluminura do seu ser, sente-se jogado para fora do tempo, do espaço, na órbita celeste das motivações sem fundamento.

Fernando Marini
Enviado por Fernando Marini em 30/06/2014
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