DE POEMAS E DA POESIA

NA MANHÃ DE 27 DE JUNHO DE 2014

REPUBLICAÇÃO – TEXTO DE 2012

Se meus poemas são poesia, não o sei com certeza, que nem todo poema é poesia, assim como muita prosa é poesia, tal qual a prosa de Guimarães Rosa, que já a tem desde o próprio nome. Gostaria de ter sobre minha escrita “poética” a mesma lucidez que me ocorre – às vezes – sobre a escrita poética de outras pessoas.

Talvez eu seja apenas portadora de uma boa antena poética, que me garante a percepção de muita da poesia que flui das coisas e isto já é cota razoável de bem em um mundo de infinitas miserabilidades, criadas pela nossa Espécie.

Vejo a poesia como um bem de vocação comunitária, ao menos se avançarmos rastro atrás até a sua origem, vocação que se manteve, sob formas diversas, até ainda os primórdios da Idade Moderna – falo de Ocidente – e que foi, a partir daí, se afastando cada vez mais célere dessa vocação e se tornando um exercício mais e mais solitário, para leitura de leitores apenas em seus espaços particulares. A Internet parece-me estar a trazer de volta (veja-se o espaço do Recanto) em novos moldes, a partilha da poesia, recuperando a sua dimensão social. Se ainda não é um bem para todos – nunca o foi, em verdade, em tempo histórico nenhum, este sonho é uma Utopia - é pão necessário para muitos, tão necessário para a vida como o são os pães feitos de trigo;também é água, tão imprescindível quanto a água que permite a sobrevivência do corpo.

Se sou efetivamente poeta, não o sei; com certeza, nutro-me de poesia, da poesia que se encontra não só nos poemas, mas também em outras manifestações da arte. Sem a poesia, neste sentido mais amplo, eu seria um ser deveras miserável, digno de muitíssima lástima. Sem a bênção da poesia eu seria, apenas, uma completa e irremediável mendiga, mendiga de mim mesma a me pedir esmolas ao real, ao que chamamos real imediato, com o qual temos os compromissos necessários e obrigatórios, no centro do qual, sem a poesia e o sentimento poético do mundo, segundo a expressão de Drummond, eu – só posso dar meu testemunho pessoal – morreria por falta de oxigênio.

* Este texto me foi inspirado pelo poema OS CARROS NÃO RESPEITAM PEDESTRES, de MARCELO BRAGA.

Nota de 27 de junho de 2014. Admito, em público, que não sei o que eu possa fazer para dar, ainda, sobrevida à minha poesia. Seja como for, mesmo respirando tão pouco como venho respirando, preciso sobreviver. Urge que eu o consiga, mesmo sem minha poesia mais. Que o Deus me ouça, Amém.