SEM PERDÃO

Se vivemos à mercê de nós mesmos, procurando explicações para o inexplicável, como podemos querer que os outros nos expliquem?

Se tantas vezes somos vítimas daquilo que fazemos e carrascos de nós mesmos, como podemos supor que outrem vá ter as respostas?

Se a eterna batalha de subjugar o próprio eu nunca terá fim, então não há como prever o tempo necessário para que o que está oculto seja revelado e que a verdade se manifeste encarnada na pessoa da justiça.

Se supormos que a justiça triunfará, então a verdade terá sido a juíza de todas as causas?

Se é mister que a verdade venha à tona, então será preciso resgatar as embarcações que jazem nas profundezas de um mar dantesco e revoltoso.

Se o nosso maior inimigo habita no âmago do nosso pensamento, se podemos ver a sua face quando olhamos no espelho; então por que vasculhar nas gavetas do passado procurando aquilo que queremos esconder?

Se a vida revelada em fatos e fotos é o que nos satisfaz, então como recusar "o vosso reino" e desejar apenas "o venha a nós"?

Se formos julgar a nós mesmos, sentaremos no banco do réu com a sentença já desferida e o julgamento, seja ele qual for, não será imparcial.

Se, por outro lado, somos isentos de culpa, então não necessitamos de ser perdoados e nem de perdoar; somos como deuses que podem, mas não atiram a primeira pedra.