Casulo

Estou recém acordada.

Até quando?

Não sei.

Não sei de mais nada.

O despertar é algo que não explicamos.

E muitas vezes, sem aviso, ele acontece.

O inconsciente precisa realmente de estudos.

Sei que estudam. Sei que chegam a algumas conclusões.

Algumas, não todas.

Mas aonde vou me segurar enquanto concluem?

Sabia que as paredes não só escutam, como também se inclinam para ouvir melhor?

As minhas estão assim. Já quase como arcos.

Daqui uns dias poderei dizer que minha casa é um iglu.

Ou uma abóbada.

Estarei dentro de uma redoma. Preferiria uma redondilha.

Seria mais poético.

Estou sempre tentando deixá-la à vontade. A parede, é claro.

Dou-lhe presentes. Telas singelas. A seus pés deposito vasos floridos.

Retiro digitais que não lhe pertencem.

E ela ouve! Mas não fala! Queria que ela falasse...

Quando fica ereta, deixando de inclinar-se, sei que está em fase de recolhimento.

Ofereço meu apoio. Não jogo luz em cima.

Ela sofre de estresse tijolar. E como sofre!

Nessa fase, brindo-a com uma Sinfonia de Beethoven.

Fica calma, fica zen. Mas daí, quem pira sou eu.

Acontece uma fissura na minha homeostasia.

Sinto-me num imenso palco, repleto de olhos desconhecidos

buscando através da música, o sentido do viver.

Ah! que a insanidade me revela.

Sou eco, sou ruído, sou qualquer jugular.

E palpito, escorro, diluo-me.

Despertar dói.

Com um olhar de esguelha, fito-a.

E de onde estou, sem me aproximar, sussurro-lhe um carinho.

E ela fecha-se como abóbada somente para me escutar.

Não é lindo?