O nada antes do nada

Eu observo os outros. Eu cuido as pessoas na rua. Mas não o tipo de cuidar malicioso, julgando a beleza alheia. Eu apenas observo todos. E enquanto observo, fico imaginando que tipo de problemas/medos/anseios elas têm. Seriam semelhantes aos meus? Eu, que vivo em uma constante crise existencial. Eu, que acordo todo dia me perguntando “De onde vim, por que vim, e para onde vou?”. O negócio é que a resposta para a última pergunta - e a primeira também, na verdade. - eu já tenho, como todo ateu: vim do nada e irei para o nada. Mas o que me inquieta é a segunda pergunta: por quê? Por que eu sou obrigado a acordar todos os dias feliz por isso, e fazer as tarefas do dia a dia com satisfação se, no fim das contas, tudo vai para o nada? Por que preciso passar por todo o processo ser-criança-virar-adolescente-e-então-adulto-e-então-velho e então ir para o nada. Por que não pulei de um nada para o outro direto?Por que preciso passar pela parte consciente da trajetória de um nada para o outro? Eu gostaria de ir direto ao nada. O não-nada (mas que não é o tudo) é tão bagunçado e extremamente desnecessário que, no fim das contas, só serve para querer acelerar a chegada ao outro lado. Digo, ao nada. Essas experiências pré-nada são extremamente desagradáveis. Ir crescendo, ter a obrigação de ganhar dinheiro, encontrar alguém para amar, ter, ter e ter, e ser julgado se não tem, ver tudo a sua volta se decompondo aos poucos (de repente, tu já é tio de uma adolescente, teus amigos, e tu mesmo, já não têm tanto tempo para encontros, teus gostos são obrigados a mudar para que, assim, tu se encaixe ao mundo, tu já tem quase 30.). Tu se decompõe. Tudo apenas um processo natural até o nada, mas extremamente solitário e angustiante. Triste e doloroso. Por que eu preciso sentir o nada chegando aos poucos? Não quero um pedacinho a cada dia. Eu quero o nada logo.

DenpaDeh
Enviado por DenpaDeh em 15/02/2014
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