Devaneios impróprios
Boa garota, boa garota.
A cidade, boa também.
Um curso legal, uma vida mais ou menos e umas pessoas para brincar de amigo.
Uma mulher e seus dotes, o feminismo, o aborto e a igreja. As guerras no oriente médio e as dores de parto da mãe solteira em um corredor de um hospital público qualquer.
O coreto no meio da pracinha, uma garota feia sentada sozinha.
Feia, horrenda!
Uma garota que imita o ídolo sozinha em seu quarto, sendo ela mesma em frente ao espelho. Sendo sexy com seus seios pequenos e curvas fracas. Sendo puta secretamente. Dando para os amigos velhos do pai em pensamento.
Santa virgem. O mundo é hipocrisia e dor.
Ela deita e se acaricia, joga todos os trabalhos de álgebra debaixo da cama. Ela quer sentir o que não pode. Quer o brilho de Nova York, o pecado e a dor. Sim, porque a dor parece bela a quem nunca sofreu.
A dor vicia.
Um quarto, um homem estressado e uma mulher abandonada. Uma família sendo o que o capitalismo quer.
Santa virgem. Uma família nunca pode ser pura.
Uma alma perdida pelo espaço, eles se assustam ao descobrir a medida de um ano-luz, mas a vida ao seu lado está mais longe do que qualquer galáxia do Universo.
Isso não parece engraçado? As pessoas são desinteressantes umas às outras.
Eu estava pensando nisso dentro do ônibus quando vi aquele cara estranho fumando em frente à padaria. Não era sexy e não era feio.
Era só um cara estranho fumando em frente à padaria.
E eu resolvi amá-lo durante todo aquele milissegundo, porque ele não era bom nem mal. E, em meio a um pensamento confuso e doloroso. Ele apareceu segurando sua sacola de pães. E enquanto o observava, eu ouvi a vida sussurrar: "Tudo aqui é normal."
De repente, eu não me sentia tão suja.