Não é um não-querer uma recusa ao oferecido ou desejado, ansiado ou rejeitado. É aquela lucidez que se tem diante do vazio impreenchível da alma, a consciência aniquilada pela mesma consciência de sua inutilidade e um sonho que se não tem senão no amanhecer ilusório do ser. Chove lentamente todas as chuvas de minha existência que pairaram como nuvens pesadas de adiamentos... olho vertiginosamente o céu como um chão estático de uma cor que só deve haver no avesso de todos os céus escolhidos, de todos os céus impossivelmente albergados por um ser que perdeu a si mesmo em subterrâneos oníricos.
Inquieto-me constantemente. Queria me deitar sobre todas as naus à deriva pelos sem destino dos mares alheios, e ir-me apagando de mim com uma melodia a me embalar nesse apagamento, sentir o nada na medida em que me desconstruo, pois assim tem de ser, assim tudo se recolhe à suposta nascente numa gestação retroativa do ser.
Nada digo. Nada me sei a dizer. Um sussurro se ergue como um cochilo para um sono que nunca vem e o que não está a dormir leva incômodos aos que se dão ao sono do descontemplamento. Trovejam paradoxos; não vejo mais que um clarão para além das montanhas que alcançam meus olhos distraídos com a mesma verdade cotidiana de quem não se pode cegar nem ver amplamente.
Chove tediosamente em meu coração descarrilado, em meu coração que se sabe à deriva, pois que é puro não sabê-lo. A noite avança em todas as direções encolhendo o resto de paisagem que se amplia em mim.